Segundo dados da OIT, 20,9 milhões são vítimas da escravidão moderna, seja sexual ou laboral; segundo especialistas, impunidade é principal barreira para erradicação
A impunidade é um dos principais entraves para combater o tráfico de pessoas e a escravidão moderna, segundo apontaram especialistas durante simpósio realizado no Tribunal Regional Federal da 3ª Região em São Paulo. Segundo relatório da OIT (Organização Internacional do Trabalho) divulgado no ano passado, há em todo o mundo 20,9 milhões de vítimas de trabalhos forçados, das quais 11,4 milhões são mulheres e meninas.
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A organização aponta também que 18,7 milhões dessas vítimas são exploradas (laboral ou sexualmente) por agentes privados, enquanto 2,2 milhões pelo próprio Estado em campos de trabalhos forçados, usados como medidas punitivas em países como a China. Desse total, cerca de 9,1 milhões se deslocaram, seja dentro do seu país ou para o exterior.
O tráfico de pessoas, a terceira atividade criminosa mais rentável do mundo, com lucro anual estimado em US$ 31,6 bilhões, desafia governos e entidades da sociedade civil a desenvolver ferramentas de combate cada vez mais elaboradas.
Segundo a adida política do Consulado dos EUA em São Paulo, Kathryn Hoffman, a punição legal dos criminosos é parte indispensável do combate ao tráfico de pessoas e à escravidão contemporânea. Essas ações, entretanto, devem estar centradas na proteção das vítimas, criando soluções de longo prazo, como a repatriação ou reintegração social dos prejudicados.
"É preciso que os agentes federais e policiais ganhem a confiança das vítimas e garantam que elas não sejam presas ou punidas. Devem levar também em conta o estado emocional das vítimas durante todo o processo policial e judicial", afirmou. Hoffman explicou durante o evento o paradigma dos "3Ps" utilizado pelo Departamento de Estado dos EUA no combate à escravidão moderna: prevenindo a ocorrência dos crimes, protegendo as vítimas e processando os traficantes de pessoas.
Hoffman deu destaque para a necessidade de fazer parcerias entre governos e entre governos e Organizações Não Governamentais (ONGs) para aprimorar os mecanismos de monitoramento e fiscalização, evitando que esses crimes aconteçam. O ponto fundamental, segundo ela, é entender estrategicamente como e onde o tráfico de pessoas ocorre para planejar ações específicas para eliminá-lo. Por exemplo, um país que não possui uma legislação específica que regulamente o trabalho doméstico tem mais chances de ser palco desse tipo de crime.
Os números no Brasil relativos à escravidão moderna são imprecisos. Há cerca de 40 casos que resultaram em condenações criminais no meio rural, em um universo de 3 mil fazendas fiscalizadas. Apesar de mais de 40 mil trabalhadores terem sido libertados desde 1995, não há notícias de que algum responsável por coagir ou restringir a liberdade desses trabalhadores tenha cumprido pena na prisão.
O desembargador Fausto de Sanctis reclamou, durante o evento, da falta de efetividade das leis brasileiras de combate à escravidão. Para ele, as leis brasileiras são fruto de pressão internacional. "Responsabilização à altura no Brasil é muito difícil. A gente sabe que no Brasil a legislação é branda", comentou Sanctis antes de completar dizendo que "o problema no Brasil é a impunidade e a falta de proteção às vítimas".
A proteção das vítimas, segundo Luiz Machado, coordenador do projeto de Combate ao Trabalho Escravo da OIT no Brasil, é fundamental para que seja possível rastrear os caminhos percorridos pelos traficantes de escravos e que o trabalho preventivo seja realizado com maior eficácia. Trabalhadores estrangeiros presentes no Brasil, por exemplo, acabam não denunciando seus empregadores para as autoridades competentes por medo da deportação. "A gente acaba não sabendo o que está por baixo da água, conhecemos somente a ponta do iceberg."
Nova lei em São Paulo
Também durante o simpósio, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, regulamentou a lei estadual que pune empresas que exploram o trabalho escravo e suas formas análogas de forma direta ou indireta. A lei 14.946 prevê a cassação da licença estadual das empresas condenadas por um colegiado de juízes, mesmo que haja possibilidade de recurso.
"Nós vamos aplicar a punição máxima a essas empresas, retirando delas a autorização para exercer qualquer atividade econômica. Nós não queremos em São Paulo empresas que explorem as pessoas e promovam o trabalho degradante. Isso é uma concorrência desleal com o empresário sério", disse Alckmin.
- iG São Paulo |
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