sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Eleições 2014: veja 5 temas que ficaram de fora do debate (Contribuição minha sobre o Sistema Carcerário)

Algumas pautas ganham pouco destaque nas vésperas da eleição, seja por desinteresse dos candidatos,

 da imprensa ou dos próprios eleitores

William Bonner mediou o debate de Aécio e Dilma e, como no debate do primeiro turno, cometeu alguns deslizes
Foto: Ale Silva / Futura Press
Educação, saúde e segurança compõem a santíssima trindade das campanhas eleitorais desde sempre. Em todo ano em que há um pleito, essas pautas encabeçam o discurso dos candidatos, com algumas novidades ocasionais - neste ano, por exemplo, discute-se muito a continuidade do Bolsa Família e o controle da inflação.
Assim, outras agendas importantes e historicamente deixadas de lado pelo poder público acabam ganhando pouco destaque nas vésperas da eleição, seja por desinteresse dos candidatos, da imprensa ou dos próprios eleitores. Saiba mais sobre alguns desses temas que poderiam ser mais debatidos no período eleitoral.
Demarcações indígenas
Com o avanço do agronegócio em áreas tradicionalmente ocupadas por povos indígenas e, ao mesmo tempo, grupos de índios invadindo propriedades para reivindicar a demarcação de novas terras, a tensão entre esses dois lados tem aumentado intensamente nos últimos anos.

A candidata da reeleição durante campanha 
Foto: Ichiro Guerra / Divulgação
A situação põe em conflito, também, outros dois grupos: as organizações sociais e instituições de defesa dos povos indígenas e a chamada “bancada ruralista”, composta por congressistas que legislam em favor do agronegócio.
O mecanismo que o Estado brasileiro tem hoje para mediar os impasses é o Decreto nº 1775/96, que estabelece a demarcação de terras indígenas como responsabilidade do Poder Executivo. De acordo com a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Brasil tem hoje 585 terras indígenas demarcadas e 129 em fase de estudos.
O que aumenta a polêmica é que tramita na Câmara dos Deputados a PEC 215/00, que atribui ao Congresso a palavra final sobre as demarcações. A ideia é temida pelos índios, pois o processo sofreria uma forte influência da bancada ruralista.
Dívida pública
Você certamente já ouviu falar em superávit primário, mas sabe o que isso significa? Ele nada mais é do que o saldo da arrecadação do dinheiro pelo governo brasileiro excluindo o montante destinado a pagar os juros da dívida pública. Ou seja, uma boa parcela do que é recolhido com os impostos se esvai com esse compromisso.

Para se ter uma ideia do quanto a dívida impacta no poder de investimento do governo brasileiro, basta olhar o Projeto de Lei Orçamentária Anual 2014, que previa um gasto de 42,04% com esses encargos (34,4% para amortização da dívida e 8% para o pagamento de juros), de acordo com o Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi).
Na opinião do cientista politico Bruno Lima Rocha, professor da ESPM, Unisinos e Unifin, as dívidas estaduais foram abordadas nas campanhas dos candidatos a governador, mas, nas eleições presidenciais, o tema ficou de fora do discurso dos principais candidatos. "As dívidas dos estados foram pautadas nos palanques estaduais, mas os favoritos à presidência, de fato, não abordaram o tema. Neste contexto, já que uma dívida acaba executando a outra, a da União é uma bandeira quase que exclusiva da esquerda - tanto a eleitoral como a libertária”, opina.
Rocha cita o sindicalista gaúcho João Pedro Casarotto, ex-presidente da Associação dos Fiscais de Tributos Estaduais (Afisvec), que defende a auditoria tanto da dívida entre a União e os estados e municípios quanto o montante da dívida interna do país. “Seu argumento, o qual compartilho, diz que não tem sentido internacionalizar uma dívida entre dois níveis de governo do mesmo Estado”, lembra.
Sistema carcerário
Quando se fala em presídio no Brasil, a imagem que surge imediatamente em nossa cabeça é a de celas superlotadas e em péssimas condições. “As prisões estão em condições desumanas, praticamente masmorras medievais. Lá prevalece a tortura, abusos, violência e superlotação”, conta Neemias Moretti Prudente, professor de Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Paraná (EMAP), que ainda destaca as péssimas condições sanitárias e de alimentação e a falta de assistência médica e locais de lazer, trabalho e estudo.

Aécio Neves fala à imprensa durante campanha
Foto: Divulgação
Prudente acredita que a razão desse assunto ter ficado de fora das principais campanhas à presidência é porque ele encontra pouco eco nas urnas. “Preso não vota, e qualquer ajuda do Estado a eles não é bem vista pela população em geral”, afirma.
De acordo com um levantamento do Instituto Avante Brasil, a partir de dados do Ministério da Justiça, a população carcerária brasileira aumentou assustadores 78% entre 2002 e 2012. Atualmente, o Brasil é o terceiro país que mais prende no mundo, ficando atrás, apenas, de Estados Unidos e China.
Para o professor Neemias Moretti Prudente, a solução não é ampliar e aumentar o número de presídios, como muitos candidatos propõem, mas sim investir na ressocialização dos presos e em penas alternativas para condenados a crimes de menor periculosidade. “No Brasil, hoje, o índice de reincidência gira em torno de 70 a 80%. Ou seja, a cada 10 presos que saem do sistema, oito voltam para ele.”
Saneamento básico
Abastecimento com água potável e coleta e tratamento de esgoto são necessidades básicas para uma moradia digna, certo? Mas você sabia que 17,3% dos brasileiros não são abastecidos com água tratada, 51,7% não têm seu esgoto coletado e 61,3% dos esgotos do país não são tratados? Esses dados, divulgados pelo Sistema Nacional de Saneamento Ambiental 2012 (os dados referentes a 2013 ainda não foram divulgados) podem parecer assustadores, mas refletem a realidade de muitos brasileiros.

Saneamento básico é o termo usado para se referir ao conjunto de medidas de infraestrutura geridas pelo governo para atender a essas demandas. De acordo com um levantamento feito pelo Instituto Trata Brasil e Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, divulgado em março, o Brasil ocupa um vergonhoso 112º lugar em um ranking que avalia as condições de saneamento básico de 200 países.
Direitos trabalhistas
Esse é um assunto que costuma contrapor os sindicatos, que defendem melhores condições de trabalho aos seus associados, e empresários, que observam nessas reivindicações maiores custos de produção e, consequentemente, menores lucros. Para essa questão avançar, portanto, é necessário chegar a um caminho do meio, que não prejudique nenhuma das pontas.

O que acontece é que a balança acaba pesando para um dos lados, ao menos durante a campanha política. “Muitos candidatos não tocam no assunto por terem ‘rabo preso’. Direitos trabalhistas até atraem votos, mas contrariam interesses de determinadas bases de financiamento de campanhas”, julga o jornalista e doutor em Ciência Política Leonardo Sakamoto. “Fico surpreso que raramente esse tema seja abordado em um debate. E quando é, fala-se apenas se a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) deve ser mexida ou não. Não se discute nada além disso”, conclui.

Penas mais duras não diminuem uso de drogas, diz governo britânico


Credito: Reuters
Relatório defende abordagem focada no tratamento; governo, no entanto, descarta descriminalização.
Um relatório do governo da Grã-Bretanha indica que não existe "nenhuma relação óbvia" entre leis mais duras e níveis de consumo de drogas.
A pesquisa comparou a legislação do Reino Unido com 13 países, como Portugal, Uruguai e alguns Estados americanos.
O documento afirma que, em Portugal, onde a posse de pequenas quantidades de drogas não resulta em sanções penais, a descriminalização combinada com outras políticas conseguiu reduzir o uso de todas as drogas e de casos de doenças relacionadas a elas, como a infecção pelo HIV.
O secretário do Interior britânico, o liberal democrata Norman Baker, disse que os resultados devem alertar para o fim da "retórica sem sentido" sobre drogas e mudar o foco para o tratamento.
O documento chamou atenção porque há 40 anos o governo britânico defende que apenas punições mais duras podem diminuir o problema do consumo de drogas.

'Histórico'

Depois de examinar uma série de abordagens, da tolerância zero à descriminalização, a pesquisa concluiu que o uso de drogas é influenciado por fatores "mais complexos e cheios de nuances do que somente legislação e sua aplicação."
No entanto, o relatório constatou que houve uma melhora considerável na saúde dos usuários de drogas em Portugal desde que o país passou a lidar com a posse de drogas como uma questão de saúde e não de polícia, em 2001.
As experiências do Uruguai e de Estados americanos como Washington e Colorado foram mencionados, mas segundo o documento ainda é cedo para precisar seus efeitos.
O Ministério do Interior disse que estes resultados não podem ser atribuídos a descriminalização por si só e que o governo do Reino Unido não tem "absolutamente nenhuma intenção de descriminalizar as drogas."
Baker disse que o tratamento do uso de drogas como uma questão de saúde seria muito mais eficaz na minimização de danos.
"Vamos olhar para o que funciona, em vez de presumir que prender as pessoas seja a resposta."
"As pessoas são tratadas como um número, recebem uma multa, recebem uma advertência, são colocadas na prisão e nada disso muda o seu vício em drogas", acrescentou.
"Se estamos interessados em mudar o comportamento das pessoas, então temos de olhar para isso do ponto de vista da saúde", concluiu Baker.
O correspondente de assuntos internos da BBC Danny Shaw afirmou, no entanto, que a visão de Baker estava em desacordo com a posição oficial do Ministério do Interior, que diz que a estratégia de drogas atual está funcionando.

Descriminalização

Danny Kushlick, o fundador do grupo Transform, que tem feito campanha para a regulamentação legal de drogas no Reino Unido por quase 20 anos, disse que o relatório foi um passo importante.
"Pela primeira vez em mais de 40 anos o Ministério do Interior admitiu que a aplicação das leis de drogas duras não significa necessariamente reduzir os níveis de consumo de drogas. Descriminalizar a posse de drogas não aumenta os níveis de uso", afirmou.
No início deste ano o vice-primeiro-ministro britânico Nick Clegg prometeu abolir as penas de prisão para a posse de drogas para uso pessoal.
Clegg desafiou o primeiro-ministro David Cameron a olhar para questões como a descriminalização, apesar de Cameron ter rejeitado anteriormente pedidos de uma comissão que analisasse a questão.

Drogas legais

Credito: BBC
Documento analisou políticas de 13 países
Um outro relatório do Ministério do Interior pedirá a proibição geral de todas as drogas psicoativas, em uma tentativa de combater algumas drogas legais sintéticas - as chamadas "legal highs".
Atualmente, quando um composto legal passa a ser considerado ilegal, os fabricantes evitam a lei ajustando o composto químico e criando uma nova substância.
Essas drogas sintéticas usam substâncias que produzem efeitos semelhantes ao de drogas proibidas.
O governo vai considerar a legislação adotada na Irlanda há quatro anos, que proíbe a venda de todas as substâncias psicoativas, mas isenta algumas como o álcool e o tabaco.
"A partir de hoje vamos começar a olhar para a possibilidade de uma proibição geral de novas substâncias psicoativas em todo o território do Reino Unido, reprimindo os fornecedores em vez de os usuários", disse Baker.
"Esta abordagem teve um forte impacto sobre a disponibilidade de drogas legais sintéticas quando introduzida na Irlanda, mas temos de saber se ele iria funcionar aqui também."

Brasil

A discussão sobre descriminalização das drogas também causa polêmica no Brasil.
Em 2006, entrou em vigor uma nova lei que tinha como objetivo punir os grandes traficantes e acabar com a pena de prisão para usuários. Pela legislação atual, quem é flagrado com drogas para uso pessoal pode ser advertido, ter de prestar serviços comunitários ou cumprir medida sócio-educativa.
A lei, no entanto, não determina a quantidade que caracteriza uso pessoal - quem decide isso é o juiz. Críticos apontam que, com isso, abriu-se um precedente para que usuários fossem condenados por tráfico, o que acabou aumentando a superlotação nas prisões brasileiras.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Operadoras reclamam de pedidos de delegados para quebra de sigilo telefônico

As operadoras de telecomunicações brasileiras estão preocupadas com os superpoderes que os delegados de polícia ganharam com a Lei 12.830/2013 e com a nova lei que trata de organizações criminosas. As empresas afirmam que, com base nesses dispositivos, os delegados de Polícia Civil as têm intimado em busca de informações que, em tese, só poderiam ser concedidas por meio de ordem judicial.
O artigo 2º da Lei 12.830/2013, do dia 30 de junho de 2013, diz que as atividades de polícia judiciária e “apuração de infrações criminais” são “essenciais e exclusivas de Estado”. O parágrafo 2º desse dispositivo diz que “durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos”.
Até aí, nenhuma novidade. Só que um mês depois da Lei 12.830 veio a Lei 12.850. Foi esse dispositivo que redefiniu a organização criminosa no ordenamento jurídico brasileiro. A reclamação das empresas de telecom está nos artigos 15 e 17 da lei da organização criminosa.
O artigo 15 autoriza o delegado de polícia e o Ministério Público, “independentemente de autorização judicial”, a ter acesso aos dados cadastrais de investigados. Já o artigo 17 obriga as operadoras a manter os registros de identificação dos números de telefone que fizeram e receberam ligações pelo prazo de cinco anos.
Com base nessa combinação de leis, delegados de Polícia Civil do Brasil inteiro estão intimando operadoras em busca de informações como “bilhetagens das últimas chamadas efetuadas e recebidas, com as respectivas ERBs [Estações Rádio-Base]”, de celulares roubados para que se localizem os suspeitos pelo roubo, conforme diz intimação recebida pela Tim em Londrina (PR).
Outras intimações são menos específicas. Uma recebida também pela Tim, mas em Recife, pede “os dados cadastrais das pessoas titulares que tenham algum número cadastrado com esta operadora sob o Imei” — Imei é um código instalado pelas operadoras em celulares para rastreá-los em caso de perdas ou roubos.
Em João Pessoa, a Polícia Civil pergunta à Tim quem é o usuário que responde por um determinado IP e pede que a operadora informe o número do celular dessa pessoa, o CPF, endereço e o histórico de ligações dos últimos seis meses. Nenhuma das duas intimações explica por que são necessárias essas informações.
Inconstitucionalidade
Por causa dessas intimações é que a Associação Nacional das Operadoras Celulares (Acel) pediu para que o Supremo suspenda a eficácia da lei. A entidade é autora de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade em que questiona a Lei 12.830. Essa ADI tramita junto com outra Ação Direta de Inconstitucionalidade, proposta pela Procuradoria-Geral da República. Ambas são de relatoria do ministro Luiz Fux. 

A Acel é representada nos autos pelos advogados Rodrigo Mudrovitsch,Leandro Dias Porto Batista e Lucas Faber de Almeida Rosa, do Mudrovitsch Advogados. De acordo com a petição enviada ao Supremo, “a norma impugnada vem sendo largamente utilizada para a requisição de informações, documentos e dados que, quando muito, podem ser violados apenas mediante decisão judicial, gerando inaceitável situação de insegurança jurídica”.
Segundo a entidade, como as operadoras se recusam a cumprir as intimações “por impossibilidade constitucional”, elas ficam submetidas a “litígios judiciais e à possibilidade de indiciamento de seus representantes por crime de desobediência”. A ameaça de responder por desobediência está, de fato, em uma intimação.
Atividade privativa
Na inicial da ADI proposta pela PGR, o órgão afirma que a lei permite a interpretação de que a investigação criminal é função exclusiva da polícia, o que é inconstitucional.

De acordo com a PGR, a lei viola o artigo 129 da Constituição Federal, que descreve as funções do Ministério Público. Isso porque, segundo a inicial da ADI, a doutrina entende que o inciso VI do artigo dá ao MP o poder concorrente ao da polícia de conduzir investigações criminais.
A PGR também alega que, embora o inquérito policial seja exclusivo da polícia, existem outros meios de investigação, como os conduzidos por agências reguladoras do mercado financeiro, ou pela Receita Federal.
Clique aqui para ler a petição da Acel na ADI 5.059.
Clique aqui para ler as intimações recebidas por operadoras de delegados de Polícia Civil.

Revista Consultor Jurídico, 29 de outubro de 2014.

Flagrante armado não serve como prova de crime, decide corte europeia

A Corte Europeia de Direitos Humanos decidiu que são inválidas as provas obtidas por policiais disfarçados que incitam um suspeito a cometer crime. Para os tribunais europeus, a prática conhecida como flagrante armado viola o direito de o acusado de ter uma investigação justa e um processo igualitário. A decisão da corte ainda não é definitiva e pode ser modificada.
O julgamento aconteceu numa reclamação enviada ao tribunal europeu por um cidadão alemão. Andreas Furcht foi condenado na Alemanha por tráfico de drogas a partir de provas conseguidas por policiais disfarçados.
De acordo com o processo, Furcht não era sequer investigado pela Polícia. Ele era amigo de um suspeito de tráfico de cocaína. O plano inicial dos policiais era usar Furcht para chegar até seu amigo. Para isso, fingiram ser traficantes e pediram a Furcht que os colocassem em contato com o amigo.
Inicialmente, Furcht explicou que não tinha interesse em se envolver na negociação, mas que apresentaria o amigo e aceitaria uma comissão por isso. Pouco tempo depois, mudou de ideia e decidiu não intermediar mais o contato. Acabou sendo persuadido pelos policiais, que o convenceram a fazer parte da transação.
Furcht foi condenado a cinco anos de prisão por tráfico de drogas. Na sentença condenatória, o juiz considerou que, por ele ter sido persuadido por policiais a cometer o crime, a pena deveria ser mais branda. Ainda assim, ele era culpado e deveria ficar preso.
Para a Corte Europeia de Direitos Humanos, Furcht tem de ser tratado como vítima. Seu direito a uma investigação imparcial e um processo justo foi violado com o flagrante armado. Os juízes europeus consideraram que todas as provas obtidas a partir desse flagrante deveriam ser descartadas. A corte determinou que a Alemanha pague 8 mil euros (cerca de R$ 25 mil) de indenização por violar os direitos de Furcht.
Clique aqui para ler a decisão em inglês.
Revista Consultor Jurídico, 29 de outubro de 2014.

Natureza jurídica da sentença que acerta a transação penal é homologatória

O Plenário do Supremo Tribunal Federal aprovou uma Proposta de Súmula Vinculante com o objetivo de conferir agilidade processual e evitar o acúmulo de processos sobre questões idênticas e já pacificadas no tribunal. A proposta aprovada, de natureza criminal, trata da continuidade da persecução penal em caso de descumprimento de cláusulas de transação penal aplicadas pelos demais órgãos do Poder Judiciário e pela administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.
A partir da publicação, o verbete deverá ser convertido na Súmula Vinculante 35, com a seguinte redação: “A homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial”.
Como se sabe, nos Juizados Especiais Criminais, não tendo tido êxito a composição civil dos danos, ou, ainda que o tenha, tratando-se de ação penal pública incondicionada, será aberta ao Ministério Público oportunidade para a transação penal (artigo 76), que é uma proposta de aplicação de pena alternativa à prisão[1].
Se a pena de multa for a única aplicável, poderá haver sua redução à metade (artigo 76, parágrafo 1º). A transação penal está condicionada ao preenchimento de determinados requisitos objetivos previstos nos incisos I e II do parágrafo 2º do artigo 76, ressalvando-se, quanto ao primeiro inciso, o quinquídio referido no artigo 64, inciso I do Código Penal; não impede a proposta, outrossim, se a condenação anterior foi substituída por pena restritiva de direitos, multa ou se foi concedido o sursis.
Tendo em vista o princípio da presunção de inocência, o ônus de provar as causas impeditivas é do Ministério Público. Aliás, no Processo Penal o ônus é sempre da acusação, o que torna não recepcionado o artigo 156 do Código de Processo Penal (porque fere o devido processo legal e a presunção de inocência). Segundo a lição de Alexandre Bizzotto e Andreia de Brito Rodrigues, “na persecução penal, todo ônus probatório é da acusação.“[2]
Atente-se para o fato de que a transação penal só deve ser proposta se não for o caso de arquivamento (faltaria justa causa para a proposta); é o que indica expressamente o caput do artigo 76. Aliás, pensamos inclusive que sequer a composição civil dos danos deve ser levada a efeito se o caso, em tese, não for passível, a posteriori, de ser alvo de uma peça acusatória; se o Termo Circunstanciado, por exemplo, narrar um fato atípico ou já atingido pela prescrição o caso é de arquivamento, não devendo sequer ser marcada a audiência preliminar, pois seria submeter o autor do fato a um constrangimento não autorizado por lei. Se, in casu, a vítima desejar a reparação civil que promova no Juízo cível a respectiva ação civil ex delicto.
Neste aspecto, discordamos de Cezar Bittencourt que entende ser dispensável o exame da justa causa para a composição civil dos danos, sob o argumento de que “os danos, com ou sem responsabilidade penal, com ou sem responsabilidade objetiva, podem ser compostos, seja na esfera privada, seja, hoje, na esfera criminal” (ob. cit., p. 54). Para nós, caso o Termo Circunstanciado não tenha possibilidade potencial de respaldar uma peça acusatória futura, o pedido de arquivamento impõe-se, pois a máquina judiciária (penal) na pode ser, neste caso, movimentada, ainda mais para se resolver uma questão cível. Se é verdade que hoje os danos podem ser reparados na esfera criminal, não é menos certo que esta hipótese só deve ocorrer se houver crime a perseguir. Caso contrário, o fato deve ser levado ao Juiz Cível.
A natureza jurídica da sentença que acerta a transação penal é homologatória, não sendo sentença condenatória nem absolutória[3]. Tal conclusão chega-se facilmente com a leitura dos parágrafos do artigo 76, especialmente os parágrafos 4º e 6º, que afirmam não importar reincidência, antecedentes criminais e efeitos civis a aplicação da pena acordada na transação penal.
A propósito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal começou a discutir, na sessão do dia 29 de maio de 2014 se é possível impor à transação penal, prevista na Lei 9.099/1995 (Lei dos Juizados Especiais), os efeitos próprios de sentença penal condenatória. A discussão ocorre no Recurso Extraordinário (RE) 795.567, com repercussão geral, em que se questiona acórdão da Turma Recursal Única do Paraná que, ao julgar apelação criminal, manteve a perda de bem apreendido (uma motocicleta) que teria sido utilizado para o cometimento da contravenção penal objeto da transação.
Em voto pelo provimento do RE, o relator, ministro Teori Zavascki, argumentou que a imposição de perda de bens sem que haja condenação penal ou a possibilidade de contraditório pelos acusados representa ofensa ao devido processo legal. Destacou, ainda, que as medidas acessórias previstas no artigo 91 do Código Penal, entre as quais a perda de bens em favor da União, exigem a formação de juízo prévio a respeito da culpa do acusado, sob pena de ofensa ao devido processo legal.
A imposição da medida confiscatória sem processo revela-se antagônica não apenas à acepção formal da garantia do artigo 5º, inciso LIV, da Constituição, como também de seu significado material destinado a vedar as iniciativas estatais que incorram, seja pelo excesso, seja pela insuficiência, em resultado arbitrário”. O ministro lembrou que a Lei 9.099/1995, ao introduzir no sistema penal brasileiro o instituto da transação, permite que a persecução penal em crimes de menor potencial ofensivo possa se dar mediante pena restritiva de direitos ou multa, desde que o suspeito da prática de delito concorde, sem qualquer resistência, com proposta efetuada pelo Ministério Público.
No entendimento do ministro, de um lado, a lei relativizou o princípio da obrigatoriedade da instauração da persecução penal em crimes de ação penal pública de menor ofensividade e, por outro, autorizou o investigado a dispor das garantias processuais penais previstas no ordenamento jurídico. Logo, segundo ele as consequências geradas pela transação penal deverão ser unicamente as estipuladas no instrumento do acordo e que os demais efeitos penais e civis decorrentes da condenação penal não serão constituídos. Ressaltou que o único efeito acessório será o registro do acordo apenas com o fim de impedir que a pessoa possa obter o mesmo benefício no prazo de cinco anos. “A sanção imposta com o acolhimento da transação não decorre de qualquer juízo estatal a respeito da culpabilidade do investigado, já que é estabelecida antes mesmo do oferecimento de denúncia, da produção de qualquer prova ou da prolação de veredito. Trata-se de ato judicial homologatório expedido de modo sumário, em obséquio ao interesse público na célere resolução de conflitos sociais de diminuta lesividade para os bens jurídicos tutelados pelo estatuto penal”, afirmou.
De acordo com o ministro, como a homologação prescinde da instauração de processo, não é permitido ao juiz, nem em caso de descumprimento dos termos de acordo, substituir a pena restritiva de direitos, consensualmente fixada, por pena privativa de liberdade aplicada compulsoriamente. Observou também que as consequências jurídicas extra penais previstas no artigo 91 do Código Penal só podem ocorrer como efeito acessório de condenação penal. O julgamento foi interrompido por pedido de vista do Ministro Luiz Fux. Os ministros Luís Roberto Barroso e Rosa Weber acompanharam o relator pelo provimento do recurso.
Por outro lado, a transação penal não representa um direito público subjetivo do autor do fato, mas um ato transacional[4]: o Ministério Público transige quando deixa de oferecer denúncia e o autor do fato quando cede à perspectiva de uma absolvição. Assim, afigura-se-nos equivocada a proposta de transação penal realizada de ofício pelo Juiz que, ao contrário, deve remeter o Termo Circunstanciado ao Procurador-Geral de Justiça se houver recusa injustificada do Ministério Público em fazer a proposta, utilizando-se  do artigo 28 do Código de Processo Penal, preservando-se, assim, os postulados do sistema acusatório.
Não concordamos com o entendimento segundo o qual a transação é o exercício de uma ação penal. Ora, ação penal sem relação jurídico-processual instaurada?[5] Sem citação? Ação penal sem imputação formal de um crime? Também não poderíamos dizer que se trata de uma ação penal não condenatória (como a revisão criminal ou o habeas corpus), pois esbarraríamos na seguinte questão: como se aplicar uma pena se a ação penal não tinha natureza condenatória? Outra questão: se efetivamente a transação penal é exercício da ação penal, teríamos que admitir o oferecimento de queixa subsidiária caso o Ministério Público não fizesse a proposta.
Exatamente por isso, entendemos que a transação penal é uma mitigação ao princípio da obrigatoriedade da ação penal, tendo em vista que permite ao Ministério Público, ainda que dispondo de indícios da autoria e prova de uma infração penal, abrir mão da peça acusatória, transacionando com o autor do fato.
Descumprido o acordo entendemos pela impossibilidade de oferecimento de denúncia, pois a sentença homologatória faz coisa julgada material, restando ao Ministério Público a alternativa de executar a sentença homologatória, seja nos termos da Lei de Execução Penal (arts. 147 e 164), seja em conformidade com o Código de Processo Civil, já que se está diante de um título executivo judicial (art. 584, III, CPC).
A respeito da transação no processo, veja o que ensina Maria Helena Diniz:
“A natureza declaratória da transação, dando certeza a um direito precedentemente litigioso ou duvidoso, decorre de sua equiparação aos efeitos da coisa julgada (art. 1.030, CC). Se a decisão de homologação é válida e se a transação judicial é vinculante e irrevogável, só pode haver distrato da transação antes da homologação. (Vide: Pontes de Miranda, Tratado, cit. t. 25, p. 139). A sentença homologatória de transação válida é ato jurídico processual transparente; logo, não pode ficar à mercê de quaisquer ataques infundados por ter força de decisão irrevogável. Não há como desconstituir transação que não esteja eivada de vício de nulidade ou anulabilidade.”[6]
Cezar Roberto Bittencourt, criticando duramente esta decisão, afirma que “títulos judiciais somente podem ser desconstituídos observadas as ações e os procedimentos próprios. A coisa julgada tem uma função político-institucional: assegurar a imutabilidade das decisões judiciais definitivas e garantir a não-eternização das contendas levadas ao Judiciário. (...) Afinal, desde quando um título judicial pode desconstituir-se pelo descumprimento da obrigação que incumbe a uma das partes? Não há nenhuma previsão legal excepcional autorizando esse efeito especial. (...) na verdade, títulos judiciais têm exatamente a função de permitir sua execução forçada, quando não forem cumpridos voluntariamente. E, conclui: “quando houver descumprimento de transação penal dever-se-á proceder à execução forçada, exatamente como se executam as obrigações de fazer.” (ob. cit., pp. 17, 19 e 25).
Esta matéria resta agora definitivamente assentada com a edição da referida Súmula Vinculante. Uma pena...

[1] O art. 17 da Lei nº. 11.340/2006, que criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mullher, veda “a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.” E, como já foi referido, o art. 41 desta mesma lei proíbe a aplicação de todos os dispositivos da Lei nº. 9.099/95 quando se tratar de violência doméstica ou familiar, o que nos parece, à luz da isonomia constitucional e do princípio da proporcionalidade, uma clara inconstitucionalidade. Neste sentido conferir a nossa obra sobre a Lei Maria da Penha, em co-autoria com Isaac Sabbá Guimarães, Salvador: Editora JusPodivm, 2008.
[2] Nova Lei de Drogas, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 139.
[3] Habeas Corpus nº. 79.572 – 2ª. Turma, j. 29/02/2000, Rel. Min. Marco Aurélio. Assim também pensa Cezar Roberto Bitencourt, ob. cit., p. 12.
[4] O que não significa que seja um negócio jurídico, evidentemente.
[5] Como afirma José Frederico Marques, “só se pode falar em ação quando, com o pedido, se instaura uma relação processual. Outras atividades postulatórias e são muitas – que qualquer dos sujeitos processuais exerça, refogem do conceito de ação (...) Se, com o pedido, instaurar-se uma nova instância, esse pedido será manifestação do exercício do direito de agir.” (Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 298).
[6] “Eficácia Jurídica da Transação Judicial Homologada e a ‘Exceptio Litis Per Transactionem Finitae”, Revista da Associação Paulista do Ministério Público, Dez/Jan – 2000.
 é procurador-geral de Justiça adjunto para Assuntos Jurídicos na Bahia.
Revista Consultor Jurídico, 29 de outubro de 2014.

MORIR SIN HABER NACIDO, SUICIDIO PROFESIONAL O ABORTAR EL FUTURO SOÑADO

No ha pasado mucho tiempo desde que dejé de acudir a la universidad para estudiar criminología, 4 meses y algunos días desde el momento más americano de la carrera: la graduación. Ese día en el que tiras el birrete al aire, en mi caso fue la beca (la banda esa de color), celebrando que la etapa de estudiante “se acabó”, ¡por fin eres criminólogo/a!
Desfase.
Cuatro años de gestación para nacer al mundo como criminólogo/a. Cuatro años en el útero de la facultad, evolucionando, para, finalmente nacer como profesional.
Y morir.
Porque, colegas, seamos realistas, no hay trabajo. Porque estamos en crisis, y no hay delincuencia ni tampoco crímenes. No hay trabajo, lo escuchas en todas partes. No se necesitan especialistas en el crimen. Ni tampoco se necesitan profesionales humanos que trabajen por la felicidad del ser humano. Pá qué, está tó fatal. Y ya se sabe tó, que no podemos inventar ná.
Desmotivación.
Yo, es que… no encuentro trabajo. Porque no tengo nada que hacer. Me he pasado cuatro años enclaustrado/a en la biblioteca porque me apasiona la criminología pero no luchar. Eso sí, mi cuenta de twitter, mis estados de facebook o los comentarios de pie del instagram están repletos de “no pain, no gain”, “lucha por lo que quieres”, “*inserte frases de Paulo Coelho*”.

Escucho criminología en la tele o en la radio y me quedo ojiplático/a a ver qué dicen, pero yo no voy a opinar, no sea… que se me ocurra la mala idea de escribir una carta al periódico y que la publiquen. Total, yo ya cumplo como criminólogo/a, en linkedIn ya aparezco como tal. Con mi birrete, la toga con photoshop y esas cosas.
 

-          ¿A qué te dedicas?
-          Me dedico a “X” cosa, pero en sí, soy criminólogo/a.
Se me llena la boca de orgullo y satisfacción. Es que he trabajado duramente para que se reconozca mi puesto de trabajo en este sector que nada tiene que ver con el crimen. Pero oye, que decir que soy criminólogo/a queda como guay, ¿que no?
-          O sea, que no trabajas de criminólogo/a…
-          Bueno, no. Pero, es que…
Es que… he muerto antes de nacer.
De nacer y consolidarme como lo que siempre he querido ser: CRIMINÓLOGO/A.
He dejado de luchar antes de que me corten el cordón, a pesar de tener ya la cabecita fuera. Me ha parecido más fácil quedarme aquí que mirar al horizonte y caminar hacia él ya que por el momento sólo me ciega la luz.
¡Nuevos/as criminólogos/as del mundo! ¿Os vais a dejar morir después de tanto tiempo invertido? ¡¿Enserio?! Echadle un par, cread proyectos, asociaros, innovad, conoced más gente interesada en esta inquietante ciencia, ¡dejad que se os contagie la pasión, pecadores!
De vez en cuando tenemos que parar para fijar la meta e ir a por todas. Pero no abandonéis el camino, cambiad de rumbo cuando sea necesario. Me encantaría poder acudir a vuestros seminarios, leer en el periódico que alguien hace algo…
Ahora que se ha terminado ya la temporada de fotos de pies, pensadlo, necesitamos criminólogos/as comprometidos/as.

Si por el contrario queréis moriros sin haber nacido, suicidaros profesionalmente o abortar vuestro futuro soñado, podéis seguir los “10 pasos para no trabajar de criminólogo” propuestos por David Buil.
 

No sé qué tal me irá a mí, pero si no sale, no será por no haberlo intentado.

 Criminología y Justicia. Posted: 30 Oct 2014.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

APAV_notícias #43 | Outubro 2014

  

Para ajudar, partilhe: Não ao Tráfico!

A APAV apresentou uma nova campanha de sensibilização sobre a temática do tráfico de seres humanos: Para ajudar partilhe: www.naoaotrafico.pt.
Promover a sensibilização sobre o tráfico humano, com ênfase na exploração laboral, de forma a tornar possível o reconhecimento de situações relacionadas com este crime e evitar situações de risco, é o objectivo principal deste projecto.
Esta campanha é desenvolvida no âmbito do Projecto Briseida, promovido pela APAV e co-financiado pela Comissão Europeia. A campanha conta com a parceria mecenática da agência criativa Legendary People + Ideas e com o apoio de diversos meios e instituições.
www.naoaotrafico.pt

Conferência "Medidas de Proteção nos Estados-Membros da UE"

No dia 28 de Novembro realiza-se a Conferência "Medidas de Proteção nos Estados-Membros da UE: Para onde caminhamos?", no Hotel Olissipo Oriente, Lisboa.
As medidas de proteção podem providenciar a segurança das vítimas (de violência nas relações de intimidade, de stalking ou de violência doméstica), mas pouco sabemos sobre o seu funcionamento e a sua aplicação prática. (...)
Ler mais

20 Outubro: Dia Mundial de Combate ao Bullying

Assinalou-se no dia 20 de Outubro o Dia Mundial de Combate ao Bullying. O bullying é uma realidadepreocupante, para a qual importa sensibilizar. A APAV alia-se ao combate deste tipo de violência, alertando para o seu impacto nas vítimas, seus familiares e amigos.
Através da sua rede nacional de Gabinetes de Apoio à Vítima, a APAV presta apoio gratuito e confidencial a vítimas deste tipo de violência, seus familiares e amigos. É também fundamental a acção que a APAV tem vindo a desenvolver na sensibilização e prevenção junto dos alunos nas escolas.

APAV Açores promoveu III Jornadas contra a Violência

A APAV Açores promoveu as III Jornadas contra a Violência, no Centro de Estudos Natália Correia, em Ponta Delgada.
O evento abordou temas como “O Direto das Vítimas à Informação”, “Apoio a Familiares e Amigos de Vítimas de Homicídio”, “Crianças e Jovens Vítimas de Cyberbullying” e “Tráfico de Seres Humanos”, contando com um painel de vários especialistas.
Ler mais
 

Em Destaque

Este mês temos em destaque a nova campanha Não ao Tráfico de Seres Humanos.

Parceiro em destaque



Spot em destaque



Publicação em destaque



Com o apoio:

A vítima de crime tem direito a:



Aviso legal


Mesa de Estudos e Debates: Revista Vexatória: o debate persiste – Inscrições abertas

Mesa 04/11/14

OAB publica Carta do Sistema Carcerário durante conferência da advocacia

"O sistema carcerário brasileiro não respeita a Constituição Federal." É assim que começa o documento elaborado pela Ordem dos Advogados do Brasil durante a XXII Conferência Nacional dos Advogados, entre os dias 20 e 23 de outubro de 2014. No texto, a coordenação de acompanhamento do sistema carcerário da OAB faz um diagnóstico das penitenciárias brasileiras, fruto de pesquisas e inspeções feitas pela Ordem com outras instituições.
"As violações aos presos, na maioria das vezes, iniciam-se no momento da prisão, com a exibição de suas imagens como 'prêmios' oferecidos à sociedade através da imprensa por autoridades despreparadas e descomprometidas com os valores democráticos, e com ela permanecem, transformando a Lei de Execução Penal em mera 'carta de intenções'", diz um trecho da Carta do Sistema Carcerário.
O documento diz que em vez de focar em alterações legislativas inócuas, o sistema carcerário precisa ser mais bem estruturado. A carta incentiva os advogados a se manterem atentos a iniciativas "travestidas do rótulo de solução", como a redução da maioridade penal, que só servem para ampliar as violações e potencializar o caos já existente.
Adilson Geraldo Rocha, presidente da comissão, avalia que a conferência foi o momento propício de debater o tema com a advocacia. “Em todos os estados, existem unidades que são exemplos, mas não totalizam sequer 5%. Assim, mais de 90% dos presídios permanecem em condições pífias, amontoando pessoas em locais insalubres. A carta foi um alerta”, completa o presidente da Comissão. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB.
Leia o documento:
Carta da Coordenação Nacional de Acompanhamento do Sistema Carcerário do CFOAB. XXII Conferência Nacional dos Advogados, Rio de Janeiro, 2014.
Sistema carcerário brasileiro: evidente afronta à constituição democrática e aos direitos fundamentais.
O Sistema Carcerário brasileiro não respeita a Constituição Federal e, portanto, os que com ele têm contato – servidores, familiares e, especialmente, os presos – padecem da falta de efetividade dos Direitos Fundamentais. 
Ainda em vertiginosa expansão, já somos a quarta maior população carcerária do mundo, com 563.526 presos, atrás somente de Estados Unidos, China e Rússia.
Não faltam notícias de presos mortos ou violentados nos cárceres, sob a responsabilidade do Estado.
As condições das unidades prisionais e os maus tratos sofridos pelos presos caracterizam evidente afronta à Constituição Federal, que veda expressamente a tortura, os tratamentos desumanos e degradantes e as penas cruéis.
Em ambiente democrático, como pretende ser o nosso, os presos devem ter assegurados seus direitos individuais e fundamentais, dentre os quais o direito de permanecer calado, de ter assistência da família e de advogado no momento da prisão; o respeito à inviolabilidade do domicilio e da imagem; a locação em ambiente adequado quando preso em flagrante ou em cumprimento de pena privativa de liberdade e, especialmente, o respeito à dignidade da pessoa humana, princípio fundante da nossa República.
As violações aos presos, na maioria das vezes, iniciam-se no momento da prisão, com a exibição de suas imagens como "prêmios" oferecidos à sociedade através da imprensa por autoridades despreparadas e descomprometidas com os valores democráticos, e com ela permanecem, transformando a Lei de Execução Penal em mera "carta de intenções".
Levantamento recente do Conselho Nacional de Justiça apontou que 41% dos presos no Brasil são provisórios, um evidente desrespeito à máxima de que, aos envolvidos em investigação policial ou judicial, a liberdade é a regra.
Importa destacar ainda que, além de não se utilizar de medidas cautelares menos invasivas, grande parte dos juízes sequer fundamenta os decretos de prisão, geralmente calcados na aviltante subjetividade da "garantia da ordem pública".
Não obstante tudo isso, diante de tamanho desrespeito, é imperioso que nos mantenhamos atentos a iniciativas que, travestidas do rótulo de "solução" (como a redução da maioridade penal e algumas das disposições do projeto de novo código penal, ambos tramitando no Senado da República), servem apenas para ampliar as violações e potencializar o caos já vivenciado no sistema carcerário.
Ao invés de focar em alterações legislativas inócuas e de obstaculizar a utilização de importantes instrumentos desencarceradores, tal como o Habeas Corpus, é preciso estruturar melhor e ampliar as vias de acesso ao Poder Judiciário.
Diante desse caos, pelo qual somos todos responsáveis, urge seguirmos a lição de Rui Barbosa: “perante o direito dos povos civilizados, perante as normas fundamentais do nosso regime, ninguém, por mais bárbaros que sejam os seus atos, decai do abrigo da legalidade”.
Revista Consultor Jurídico, 28 de outubro de 2014.

Pesquisar este blog