terça-feira, 31 de julho de 2018

Boletim de julho de 2018

Olá, membro do ICCS!

Já está disponível a 1ª edição do boletim do ICCS (julho de 2018).

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Saudações!
Equipe do International Center for Criminal Studies

STF realiza audiência pública sobre descriminalização do aborto nos dias 3 e 6 de agosto

Nos dias 3 e 6 de agosto, nos períodos da manhã e da tarde, o Supremo Tribunal Federal (STF) promove audiência pública sobre a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Mais de 40 representantes dos diversos setores envolvidos na questão, entre especialistas, instituições e organizações nacionais e internacionais, foram selecionados a fim de contribuírem com informações para a discussão do tema que é objeto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSol).
A audiência começa às 8h20, na sala de sessões da Primeira Turma do STF, e prossegue no período da tarde, a partir das 14h30. Falarão representantes de 13 entidades em cada turno, sendo que cada um deles terá 20 minutos para fazer sua explanação. Entre os expositores, participarão representantes do Ministério da Saúde, da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), da Academia Nacional de Medicina, da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), do Conselho Federal de Psicologia e da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Em março deste ano, a ministra Rosa Weber, relatora da ADPF, convocou a audiência por considerar que a discussão é um dos temas jurídicos “mais sensíveis e delicados”, pois envolve razões de ordem ética, moral, religiosa e de saúde pública e a tutela de direitos fundamentais individuais. Segundo ela, foram recebidos mais de 180 pedidos de habilitação de expositor na audiência, abrangendo pessoas físicas com potencial de autoridade e representatividade, organizações não governamentais, sociedade civil e institutos específicos. Há pedidos ligados a entidades da área de saúde, institutos de pesquisa, organizações civis e instituições de natureza religiosa e jurídica.
ADPF
Na ADPF 442, o partido questiona os artigos 124 e 126 do Código Penal, que criminalizam a prática do aborto. O PSol pede que se exclua do âmbito de incidência dos dois artigos a interrupção voluntária da gravidez nas primeiras 12 semanas de gestação, alegando a violação de diversos princípios fundamentais.
Para o autor da ação, os dispositivos questionados ferem princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, a cidadania, a não discriminação, a inviolabilidade da vida, a liberdade, a igualdade, a proibição de tortura ou o tratamento desumano e degradante, a saúde e o planejamento familiar das mulheres e os direitos sexuais e reprodutivos.
Transmissão ao vivo
A audiência pública sobre descriminalização do aborto será transmitida ao vivo pela TV Justiça e pela Rádio Justiça, além do canal do STF no YouTube.
EC/EH

Leia mais:

REVISTA SOCIOLOGIA JURÍDICA – ISSN: 1809-2721


Sumário dos números 24/25 – Janeiro/Dezembro 2017

1. Editorial 

2. Ensaio narrativo-reflexivo sobre as pedagogias do amor: breves comentários sobre amor e educação em direitos humanos em Maturana, Freire e Warat – Vanessa dos Santos Moura

3. Atuação da Defensoria Pública Intramuros – Jiulia Estela Heling 
  
4. A relação da cidadania com o pluralismo como fundamentos constitucionais para a implementação de políticas sociais no estado plural brasileiro – Fernanda Ollé Xavier

5. Imagens da Justiça e Arte Cemiterial: simbolismos jurídicos em “A Justiça” e “Beleza Clássica”, no Cemitério da Santa Casa de Misericórdia, em Porto Alegre/RS – Carmen A. C. Fernandes; Ana Clara C. Henning; Maria Cecília Lorea Leite

6. Transgressões educacionais: o existir como sinônimo de violência, punição e castigo na escola – Luciano Pereira dos Santos 

7. Estado de Exceção Permanente e a Exclusão dos Imigrantes nas Constituições de 1934 e 1937: uma Análise Empírica dos Discurso Proferidos no Senado Federal na Construção das Normas Migratórias destas Constituições – Hermes Corrêa Dode Jr 
  
8. Anais do 2º Workshop Extremo Sul de Pesquisa Empírica em Direito

segunda-feira, 30 de julho de 2018

Júlio Lancellotti: 'Há uma ação de extermínio dos moradores de rua'

Em entrevista em vídeo a CartaCapital, o padre da Pastoral do Povo da Rua denuncia ações violentas da GCM e a política higienista
Júlio Lancellotti
Ofendido e ameaçado, inclusive de morte, nas redes sociais, o padre afirma não ter medo

As ações contra a população de rua estão cada vez mais truculentas, afirma o padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo de Rua, que há mais de 30 anos trabalha com pessoas em situação de rua. Embora acredite que a política de higienização esteja presente em todas as gestões da prefeitura de São Paulo, ele afirma que a situação só piora. “Não há continuidade das ações, o que um começa o outro termina”, critica.
Em entrevista a CartaCapital ele denuncia as ações violentas da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e do ‘rapa’, que é a apreensão de pertences dos moradores feita por funcionários da subprefeituras de cada região. “Até remédio tem sido tirado das pessoas, nas chamadas limpezas da rua”, conta. “E a GCM os chama de lixo. ‘Ô lixo, o que você ainda está fazendo aqui?’A intolerância se tornou uma epidemia”.
Padre Júlio também critica a falta de políticas de acolhimento diversificado ao grupo marginalizado. “A população de rua é heterogênea, há idosos, mulheres com crianças, casais, os LGBT. Não se pode dar a mesma resposta para todos”.
Ofendido e ameaçado, inclusive de morte, nas redes sociais, o padre afirma não ter medo: a luta por direitos humanos é um caminho sem volta.
Confira abaixo:


Há 12 anos, o Brasil criou a Lei Maria da Penha. Falta investir na prevenção

Em 2001, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) condenou o Brasil por omissão, negligência e tolerância em relação a crimes contra os direitos humanos das mulheres. O Brasil se sentou no banco dos réus com o caso emblemático da biofarmacêutica Maria da Penha, vítima de duas tentativas de homicídio, ocorridas em 1983. Havia 18 anos que o caso tramitava na Justiça brasileira sem sentença definitiva, e o agressor seguia em liberdade, situação que só mudaria após os desdobramentos da condenação pela corte interamericana.
Era a primeira vez que um caso de violência doméstica chegava à OEA. Começava ali uma caminhada que alteraria a visão da sociedade brasileira e os paradigmas da Justiça em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres. Até então, autores desses tipos de crime sequer eram punidos, pois a violência doméstica era tratada como ofensa de menor potencial, compensada até com distribuição de cesta básica.
Entre as recomendações feitas pela OEA, o Brasil precisaria finalizar o processamento penal do responsável pela agressão contra Maria da Penha, indenizá-la simbólica e materialmente pelas violações sofridas e adotar políticas públicas voltadas à prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher.
“As agressões domésticas correspondiam a 70% dos casos levados aos juizados especiais criminais. E não eram punidos com prisão. Lá, o Judiciário buscava conciliar as vítimas com os agressores para resolver os conflitos. Não só se criava um conflito legislativo como se contribuía para naturalizar ainda mais a violência doméstica”, diz Leila Linhares Barsted, coordenadora executiva da ONG Cepia e uma das advogadas feministas que ajudaram na elaboração da Lei n. 11.340/2006, a Lei Maria da Penha.

Naturalização da violência

Naquela época, o país não contabilizava as mortes decorrentes do machismo. Não havia recorte estatístico desse crime, que só veio a ser qualificado como feminicídio em 2015. O próprio caso Maria da Penha só foi levado à corte internacional porque duas Organizações não Governamentais (CEJIL-Brasil e CLADEM-Brasil) utilizaram o livro “Sobrevivi, posso contar”, de 1994, escrito por Penha, como prova de como o Estado brasileiro ignorava a violência doméstica.
“O livro foi escrito quase como um desabafo, quando percebi que a Justiça não era justa. Lutei contra muita burocracia e muito machismo”, diz a cearense, que ficou paraplégica com a violência sofrida e batizou a Lei n. 11.340/2006.
O Brasil é signatário de todos os acordos internacionais que asseguram direta ou indiretamente os direitos humanos das mulheres. Entre eles, as Recomendações da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção Belém do Pará, de 1994), e a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW, 1979). Enquanto uma frente buscou revelar internacionalmente a omissão do Brasil em relação ao assassinato de mulheres, uma outra trabalhou pela criação, no país, de uma lei que protegesse a mulher e a família nesses casos.
Após análise das propostas de leis que tramitavam no Congresso, assim como das convenções e acordos ratificados pelo País, a frente – formada por advogadas, ONGs e demais envolvidos com a causa feminista – elaborou um esboço de proposta compatível com a legislação brasileira. Estava sendo gestada o que viria a ser a Lei n. 11.340. O texto ainda passou pelo crivo de processualistas cíveis e criminais antes de ser aprovado pelo Legislativo e, só então, encaminhado à sanção presidencial. Nascia, em 2006, a Lei Maria da Penha – 23 anos depois do caso que lhe deu origem.

Futuro sem violência

“Não sinto ter havido Justiça no meu caso, mas sei que contribuí para mudar a vida das pessoas. Sem isso, nada teria mudado. Antes da Lei n. 11.340, não havia a quem recorrer. Ela veio para garantir um futuro sem violência para as nossas filhas, nossas netas, e todas as mulheres brasileiras. Isso é o que importa”, afirmou Maria da Penha.
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Cármen Lúcia, costuma dizer que a Justiça que demora não é justa. Foram necessários 19 anos e 6 meses para que o autor das tentativas de assassinato contra a farmacêutica fosse preso. Marco Antônio Heredia Viveros foi preso em 2001. Dos 8 anos de pena, cumpriu 1 ano e 4 meses em regime fechado e o restante em regime semiaberto e aberto. 

Descaso na prevenção

Apesar de ter implementado parte das orientações da corte internacional, o Brasil corre o risco de voltar a receber nova advertência por conta do alto número de feminicídios no país. “Por trás desses crimes, evidencia-se a falta de políticas de prevenção, em especial, investimento na área de educação voltado para criar uma cultura de respeito aos direitos humanos”, afirma Leila Barsted, que é membro do Comitê de Peritas do Mecanismo de Monitoramento da Convenção de Belém do Pará da OEA.
Para Barsted, o País precisa urgentemente avançar. “Quando a mulher vai à delegacia, a violência já ocorreu. O Brasil está devendo uma política de prevenção. Nas escolas, na Justiça, no atendimento de saúde, em todos os setores da sociedade, precisamos trabalhar com a cultura de tolerância e respeito. Não há como mudar a cultura sem campanhas contínuas”, afirma. “Não podemos permitir que o Estado mais uma vez se omita”, completou.
A Lei Maria da Penha completa 12 anos de existência em agosto e o número de processos que tramitam no Judiciário relativos a esse tema chega a quase 1 milhão, sendo 10 mil casos de feminicídio. Para Maria da Penha, que hoje trabalha com a sensibilização da sociedade por meio de sua ONG Instituto Maria da Penha, é mais que urgente que o Brasil cumpra a Lei que leva seu nome no aspecto educacional.
“Para curar o machismo, é preciso mudar hábitos e comportamentos que diminuem e desqualificam a mulher. O machismo mata, e a omissão pode situar o Estado como cúmplice”, diz Penha. A Lei n. 11.340 prevê a promoção de campanhas educativas; ensinos de conteúdos sobre direitos humanos, igualdade de gênero e violência nas escolas; capacitação permanente das Polícias e demais profissionais que lidam com estes casos.

quinta-feira, 26 de julho de 2018

Sinta a emoção de uma Constelação Familiar em unidade socioeducativa

Sessões de constelação familiar ajudam os jovens a entender porque transgrediram a lei e a quebrar o círculo vicioso que os fazem reincidir no crime. FOTO:Gil Ferreira/Agência CNJ
“Para o que vamos fazer aqui é preciso entrega. Sintam a emoção e, se precisar chorar, chorem.”
É com essa recomendação que o psicanalista Mauro Gleisson de Castro iniciou a sessão de constelação familiar do jovem Luiz Boaventura, interno da Unidade Socioeducativa de Santa Maria, cidade localizada a 26 quilômetros de Brasília.
Luiz é o nome fictício de um jovem de 17 anos de idade que foi condenado por roubo e internado na unidade socioeducativa. O que esse adolescente e os demais 149 jovens internados no centro de ressocialização de Santa Maria têm em comum é a ausência de estrutura familiar sólida e histórico de conflito com a lei, com crimes como homicídio ou tentativa de homicídio, roubo, tráfico de drogas e lesão corporal.
A figura do pai, quando existe na vida desses rapazes, é a de um homem violento e agressivo com a mulher e com os filhos, num conflito que marca o comportamento, a conduta e as ações desses menores.

Círculo vicioso

A fim de auxiliar os jovens a entender as circunstâncias que os levaram a transgredir a lei e ajudá-los a quebrar o círculo vicioso que os fazem reincidir no crime, a Unidade de Internação de Santa Maria tem realizado desde o ano passado sessões de constelação familiar.
A técnica desenvolvida pelo psicoterapeuta alemão Bert Hellinger investiga as relações interpessoais de determinado sistema familiar, mostrando as conexões entre as gerações e os padrões familiares que geram conflitos.
Por sua capacidade em solucionar atritos, a constelação familiar tem sido usada pelo Poder Judiciário em vários ramos da Justiça como nos casos das Varas de Família, de violência doméstica e no tratamento de vícios entre detentos. A técnica é utilizada por juízes brasileiros de pelo menos 16 unidades da Federação.
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Na experiência que está sendo praticada em Santa Maria, o adolescente infrator a ser “constelado” escolhe outros cinco jovens internos para tomar parte na sessão.
Participam também servidores da unidade do socioeducativo e voluntários, alguns dos quais estudantes de psicologia e de psicanálise, numa sessão coordenada por consteladoras selecionadas pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) no projeto “Constelar e Conciliar”.
O que se vê ao longo da sessão com todas essas pessoas tomando parte é a gradativa reconstrução da família do jovem constelado.
Os outros cinco jovens tomam parte na sessão e passam a representar ou o pai ou o irmão do constelado, ou mesmo o próprio constelado, vivenciando papéis e tomando parte numa família virtual que não difere muito da família real de cada um deles.
É uma experiência psicodramática em que esses adolescentes entram na pele de um pai agressivo ou distante, de um irmão indiferente ou de um filho revoltado. E se veem representando um algoz ou uma vítima, em uma tomada de consciência sobre frustrações familiares que, em parte, os induziram à infração.
“Quando assisti à minha constelação, senti tristeza. Senti também alegria porque a constelação me ajudou a saber a verdade da minha história. Eu estava ali vendo como tudo acontecia e, para mim, isso mudou”, disse Fernando dos Anjos, 16 anos de idade, um dos colegas escolhido por Luiz para participar da representação da constelação familiar. Fernando passou por sessão de constelação familiar antes de Luiz. 
No modelo de constelação praticado na Unidade de Santa Maria, a atuação dos servidores não é por acaso. Miriam Bastos Tavares, que conduziu a sessão, explica que a participação dos funcionários sensibiliza-os sobre as trajetórias que levaram rapazes e moças a entrar em conflito com a lei.
Em uma das sessões realizadas anteriormente um servidor se identificou com a história de família do jovem que cumpria a pena. “Após as sessões, os funcionários passam a olhar para esses jovens com outros olhos”, comentou a consteladora.

À flor da pele

Ao longo da reconstrução do sistema familiar de Luiz, adolescentes privados de liberdade, servidores responsáveis pela vigilância da unidade e voluntários vão tomando parte no psicodrama em uma representação intuitiva e à flor da pele de brigas, abandonos, traumas e decepções.
O adolescente cuja família está sendo constelada não toma parte do processo. Sua postura é a de assistir à reconstrução da sua estrutura familiar, dando-se conta de que a experiência com o crime e a pena que cumpre são consequência de vários desajustes.
A sessão de constelação familiar de Luiz teve duração de mais de duas horas. Nesse tempo, entraram em cena a história e a representação da vida da mãe dele, do pai, dos irmãos, incluindo os avós e outros ancestrais. E o que o jovem também pode perceber é que o comportamento de abandono do pai e os desacertos da mãe tiveram origem em traumas vivenciados por eles, os pais,  na infância, em revelação de conflitos transgeracionais.
Nesse ponto, a consteladora conduz a sessão de forma que o adolescente constelado entenda que os problemas vivenciados por seus pais são problemas deles, dos pais. E que ele, o filho, não precisa assumir ou reproduzir esses conflitos.
“Você está liberado”, repetem, um a um, os familiares (representados pelos voluntários) de forma que o jovem entenda que tem uma vida própria e que não precisa repetir os traumas dos pais ou dos familiares. Na sessão tem choro, assombro, sentimentos de culpa, arrependimento e muitos pedidos de desculpas.

Comportamento

As sessões de constelação familiar na Unidade de Internação de Santa Maria, comentam o psicanalista Mauro Gleisson e a consteladora Miriam Bastos, buscam proporcionar aos jovens internados maior consciência sobre a sua origem e as consequências dos conflitos que viveram em família. Buscam, também, fazer que os jovens percebam que podem trilhar um caminho diferente.
O diretor da Unidade de Santa Maria, Antônio Raimundo, vê efeitos práticos na postura dos internados. “Depois da sessão a gente sente uma diferença grande no comportamento deles, no tratamento com os colegas, na escola, com os assistentes sociais, como todo mundo. Eles passam a ter outra visão, passam a valorizar a questão familiar, o convívio com outras pessoas. É muito bacana e gratificante. As sessões demoram bastante e se a gente deixar, eles querem que a constelação siga noite adentro.” 
Na Unidade de Internação de Santa Maria há o caso de um jovem que foi constelado, que deixou o centro socioeducativo, mas pede para voltar e participar das sessões de constelação.

Sem laudo toxicológico, inquérito e ação penal por tráfico são inviáveis, diz TJ-PR

Sem laudo toxicológico, investigações e ações penais sobre tráfico de drogas são inviáveis. Foi o que decidiu a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná ao trancar inquérito policial aberto por ordem do Ministério Público do estado.
Drogas apreendidas com investigados foram incineradas antes do laudo toxicológico, o que inviabilizou investigação e, consequentemente, a ação penal.
Reprodução
"É sabido que nos casos de tráfico de entorpecentes o laudo definitivo é imprescindível, uma vez que é a única forma de se atestar, sem dúvida, a natureza da substância apreendida", afirmou o relator, desembargador João Domingos Küster Puppi.
Segundo ele, o artigo 167 do Código de Processo Penal, que determina como a ausência de laudo pode ser suprida, não se aplica aos crimes de tráfico. Citando uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, na qual houve a absolvição dos acusados em uma ação penal justamente por ausência de laudo toxicológico, o relatório de João Puppi foi seguido pela maioria dos integrantes da câmara.
De acordo com os autos, quando o inquérito foi solicitado pelo MP, as drogas apreendidas já tinham sido descartadas sem laudo, porque o flagrante não falava em crime. Os investigados, flagrados com ecstasy e maconha assinaram um termo circunstanciado por posse de droga para consumo, nos termos do artigo 28 da Lei de Drogas.
Mesmo já tendo determinado o arquivamento dos autos por achar insignificante a quantidade de drogas apreendidas, e determinado a incineração dos entorpecentes apreendidos, o Juizado Especial Criminal atendeu ao pedido do órgão, declinou da competência, e enviou os autos à 13ª Vara Criminal de Curitiba, que acatou o pedido de investigação.
A defesa, patrocinada pelos advogados Marcos Menezes Prochet Filho e Thiago Mota Romero, do Prochet & Mota Advogados Associados, impetrou Habeas Corpus requerendo o trancamento do inquéritosob alegação de constrangimento ilegal. Para o advogado, não há provas de cometimento de crime, já que as drogas foram descartadas sem laudo toxicológico.
Clique aqui para ler a decisão.
HC 0027533- 83.2018.8.16.0000

Revista Consultor Jurídico, 25 de julho de 2018.

quarta-feira, 25 de julho de 2018

Quatro em cada cinco presos pela Justiça Federal não têm condenação

A cada cinco pessoas que estão presas por ordem da Justiça Federal, quatro estão encarceradas provisoriamente, ou seja, ainda não têm qualquer condenação e aguardam o primeiro julgamento pelos crimes dos quais são acusadas.
Segundo dados divulgados ontem (23) pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), das 2.646 pessoas privadas de liberdade pela Justiça Federal, 80,61% (2.133) nunca foram julgadas. Tais indivíduos estão presos por força de mandados de prisão temporários ou preventivos e não têm pena definida.
Se forem consideradas também as pessoas que já tiveram alguma condenação, em primeira ou segunda instâncias, mas que ainda aguardam o julgamento de recursos enquanto estão presas, o índice cresce para 91,83%.
Somente 8,16% (216) dos presos pela Justiça Federal cumprem pena definitiva, segundo o Banco Nacional de Monitoramento de Prisões 2.0 (BNMP 2.0), que é alimentado pelo CNJ com dados dos tribunais de todo o país.  
“O dado é assustador”, avaliou o advogado criminalista Luís Henrique Machado, cujo mestrado pela Universidade Humboldt, em Berlim, teve como foco o tema das prisões preventivas. “Ainda existe uma cultura do encarceramento, a resistência de se aplicarem medidas diversas, aplicando-se logo de cara a medida mais grave, que é a prisão”, disse.
O índice de presos provisórios na Justiça Federal é cerca do dobro do registrado nas Justiças estaduais, que é de 40,40%, segundo dados preliminares do BNMP 2.0. Das 562.320 pessoas cadastradas como privadas de liberdade pela Justiça dos estados, 226.933 estão encarceradas de modo provisório. Tais números tendem a aumentar, pois quatro estados – Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul – ainda não completaram o cadastro de presos no sistema do CNJ.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Marcelo Mendes, ressaltou que é difícil comparar os dados, uma vez que o número absoluto de presos pela Justiça Federal é pequeno ante a população carcerária como um todo. Apesar de reconhecer o índice elevado de presos provisórios, Mendes disse que isso está relacionado às peculiaridades dos crimes federais, principalmente o tráfico internacional de drogas.
“São pessoas que chegam sem nenhum vínculo com o Brasil. É difícil você aplicar medida cautelar alternativa à prisão, porque elas não têm sequer onde ficar. Na grande maioria dos casos acabam respondendo ao processo presas”, disse Mendes. Ele destacou que quase metade dos presos provisórios pela Justiça Federal está em São Paulo, onde muitas vezes são flagrados com drogas no Aeroporto Internacional de Guarulhos. 
Para o advogado Luís Henrique Machado, que atua em casos envolvendo políticos em Brasília, o alto índice de prisões provisórias na esfera federal pode estar relacionado também aos crimes de colarinho branco, que são de competência de juízes federais e enfrentam “grande intolerância” no conjunto da sociedade, o que pode resultar em uma maior resistência na aplicação de medidas alternativas e em um número maior de prisões desnecessárias ou abusivas. "A gente também não pode deixar de falar na Lava Jato e em outras operações do tipo", disse Machado. 
O presidente da Ajufe discordou da afirmação de que juízes federais têm mais resistência à aplicação de medidas alternativas à prisão. "Pelo contrário, a maioria dos réus na Justiça Federal responde aos processos em liberdade. Fica difícil avaliar sem esse dado, que não consta no levantamento do CNJ", afirmou Mendes. 
Além do tráfico internacional de drogas e da corrupção e lavagem de dinheiro que afetam a União, é da competência da Justiça Federal julgar crimes como falsificação de moeda, disputas envolvendo direitos indígenas e graves violações de direitos humanos, entre outros. 

Governo lança política para empregar detentos e egressos de presídios

O governo lançou nesta terça-feira (24) a Política Nacional de Trabalho no Âmbito do Sistema Prisional, cujo objetivo é dar oportunidades de trabalho para presos e ex-detentos. O decreto que institui a política foi assinado pela presidente da República interina, Carmem Lúcia. Os ministros da Segurança Pública, Raul Jungmann, e dos Direitos Humanos, Gustavo Rocha, levaram o texto do decreto para apreciação e assinatura da presidente interina.
“Essa política tem uma função fundamental. Em primeiro lugar, de assegurar a ressocialização e a reeducação dos presos e, evidentemente, impactando sobre os egressos, mas tem também a função de combater a criminalidade de base prisional, as grandes facções”, disse Jungmann, em entrevista coletiva após a assinatura do decreto.
O decreto assinado hoje atinge as contratações feitas pela União para realização de serviços. A empresa vencedora de licitação deverá ter uma parcela de empregados vindos do sistema prisional. “Nos editais de licitação, haverá a previsão da contratação desses presos. E, preenchidos os critérios do edital, será obrigatório que tais empresas absorvam essa mão de obra”, informou o ministro dos Direitos Humanos.
A medida vale para contratação de serviços, inclusive os de engenharia, com valor anual acima de R$ 330 mil. Presos provisórios, presos em regime fechado, semiaberto e aberto estão incluídos na política. Além disso, os egressos – aqueles que já cumpriram pena e foram postos em liberdade – também podem ser contratados dentro da cota. “A ideia é simples, mas o efeito que a gente espera é fundamental na ressocialização dessas pessoas”, acrescentou Rocha.
Não serão todos os detentos que terão o direito de participar da iniciativa. Devem ser autorizados pelo juiz de execução penal; ter cumprido, no mínimo, um sexto da pena; e comprovar aptidão, disciplina e responsabilidade.
Deverão ser reservados aos presos ou egressos 3% das vagas quando o contrato demandar 200 funcionários ou menos; 4% das vagas, no caso de 200 a 500 funcionários; 5% das vagas, no caso de 501 a 1.000 funcionários; e 6% quando o contrato exigir a contratação de mais de 1.000 funcionários.
Os serviços previstos no decreto não incluem o emprego de presos ou egressos no canteiro de obras, apenas em serviços adjacentes à obra, como limpeza ou vigilância. Os ministros não descartam, porém, a inclusão desse tipo de atividade na política futuramente.
Para Jungmann, a política é um primeiro passo também para enfraquecer a ação das facções criminosas dentro dos presídios. Oferecendo emprego, o governo quer dar uma alternativa para os presos e egressos do sistema penitenciário possam se reinserir no mercado de trabalho e ajudar financeiramente suas famílias.
“Um dos fatores que levam à cooptação [das facções aos presos] é a assistência a famílias. [É] evidente que tem outros fatores, mas as facções dão sustentação à família [do preso]. E temos o egresso, que está estigmatizado. [É] evidente que essa política, por mais generosa e inovadora que seja, tem que ter muitas outras mais. Mas ela é um primeiro passo para que se rompa a dependência das facções dentro e fora do sistema”, afirmou o ministro da Segurança.

terça-feira, 24 de julho de 2018

Machado de Assis, Criminalista, nova obra de Nilo Batista



Ficha Técnica

Autor(es): Nilo Batista
ISBN: 9788571066151
Idioma: Português
Edição: 1ª edição 2018
Encadernação: Brochura
Número de Páginas: 254
Mensagem de disponibidade: Disponível
Formato: 16 X 23 X 1

Sinopse

 Neste livro, Nilo Batista apresenta Machado de Assis como um criminalista. Mas o percurso do autor foi muito além de examinar somente esse tema. Ele dedicou-se a minúcias, pesquisando todos os livros que Machado tinha em sua biblioteca, para ver aqueles em que poderia ter estudado, conferindo todas as obras. Nilo apoiou-se, ainda, em conjecturas, sempre fazendo observações muito importantes e demonstrando erudição. Esta obra é uma façanha! Temos aqui uma literatura em um texto que flui com leveza, competência e estilo. Vale a leitura!

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Rafael FagundesRELEASESUMARIO
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Justiça Federal conclui cadastramento de presos no BNMP 2.0

O Cadastro Nacional de Presos oferece mapeamento inédito da população carcerária brasileira, a partir de informações do Poder Judiciário. FOTO: Gláucio Dettmar
O Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP 2.0) já possui dados de todos os 2.628 presos sob responsabilidade da Justiça Federal. Os tribunais regionais federais (TRFs) das cinco regiões concluíram na semana passada o processo de alimentação do banco de dados. A ferramenta desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) faz um mapeamento inédito da população carcerária brasileira, a partir de informações do Poder Judiciário. Baseado nas ações criminais a que presos provisórios respondem e nos processos de execução penal dos presos definitivos, o BNMP fornecerá um quadro dinâmico da realidade prisional do país.
Os presos da Justiça Federal representam uma minoria da população carcerária brasileira. São 2.438 homens e 190 mulheres, presos por crimes julgados pela Justiça Federal, enquanto os cidadãos encarcerados por crimes da alçada da Justiça Estadual somam 551 mil, de acordo com estatísticas do BNMP (atualizadas no último dia 20/7). Nem por isso a tarefa de incluir no sistema os presos da Justiça Federal  foi mais fácil do que os da Justiça Estadual.
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Os primeiros respondem por crimes federais, como tráfico internacional de drogas, falsificação de moeda, lavagem de dinheiro, crimes contra órgãos da administração pública federal (previdenciários), entre outros. Alguns dos maiores narcotraficantes do país, por exemplo, foram condenados pela Justiça Federal. Registrar cada uma das condenações e seus respectivos processos de execução penal foi um desafio para a equipe do juiz titular da 2ª Vara Federal de Natal, Walter Nunes.
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Tarefa

“Um traficante pode ter 10, 11 processos de execução penal contra si. Não é fácil cadastrar. Tínhamos apenas três servidores para concluir a tarefa, mas fizemos um mutirão com o reforço de servidores de outras varas e entregamos dentro do prazo”, afirmou Nunes, que também é juiz corregedor do Presídio Federal de Mossoró/RN. Todos os presos da unidade prisional foram cadastrados na plataforma, além de todos os mandados de prisão emitidos por juízes federais da 5ª região, que abrange os estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.
Além de Mossoró, Porto Velho/RO, Campo Grande/MS e Catanduvas/PR oferecem 832 vagas para presos federais e de alta periculosidade transferidos a pedido de governos estaduais. No fim do ano passado, a lotação dessas unidades era de 492 presos. A maioria de presos condenados pela Justiça Federal cumpre pena nas prisões administradas pelos estados.

Mandados de prisão

Na Justiça Federal desses estados, foram registrados 147 mandados de prisão por cumprir – 145 deles estão sendo procurados pela polícia e dois constam como fugitivos do sistema prisional. No Brasil, também de acordo com os dados do BNMP, há 1.211 mandados de prisão em aberto, dos quais 1.207 procurados e quatro foragidos.

Benefícios

O número exato de cidadãos presos no país é um dos dados a serem fornecidos de forma inédita pelo BNMP, plataforma digital que está em fase final de implantação. Atualmente, as estatísticas sobre população carcerária são informadas por órgãos do Poder Executivo, com base em informações prestadas pelas direções de presídios e pela administração prisional nos estados. Dados pessoais do preso, como filiação a facção criminosa, por exemplo, ajudarão as autoridades a elaborar políticas públicas de gestão penitenciária e de enfrentamento dos problemas de segurança.

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Brasil terá 1,47 milhão de presos até 2025, segundo levantamento

O ministro extraordinário da Segurança Pública, Raul Jungmann, apresentou nesta sexta-feira, 20, o diagnóstico sobre o Sistema Prisional Brasileiro. O levantamento mostra que até 2016 – dados mais recentes – a população carcerária era de 726,7 mil, o que coloca o Brasil em terceiro lugar entre os países com maior massa prisional do mundo. De acordo com o estudo, a expectativa é de que a população carcerária brasileira seja de 841,8 mil ao final de 2018 e que chegue a 2025 com 1,47 milhão de presos.

O ministro afirmou que a Justiça criminal adota o encarceramento como solução no País com o respaldo e apoio da opinião pública. “Exposta, vulnerável e com medo da violência, a saída (para a opinião pública) é prender. Quando não, infelizmente, matar. Esta não é a saída que tem que ter. O prende, prende e prende leva a isso (aumento da população carcerária)”, disse, ao ser questionado pelo Broadcast Político.
O País enfrenta ainda um déficit de 358.663 vagas. A taxa de aprisionamento é de 352,6 presos a cada100 mil habitantes. O número, de acordo com o governo, é alto se comparado a outros países. Há ainda 586 mil mandados de prisão em aberto.
De acordo com Jungmann, o crescimento da massa carcerária não é sustentável nem em termos orçamentários, físicos, administrativos ou de controle. “O principal problema que temos hoje em termos de segurança pública é o sistema prisional. Se não enfrentarmos este problema, o Brasil caminha para se tornar prisioneiro, refém do seu sistema prisional e penitenciário. Esta frase é muito dura de se dizer, mas essa é a verdade.”
O ministro afirmou que entrará em funcionamento na próxima semana a Coordenação Nacional de Inteligência e Operações contra Facções Criminosas. Segundo ele, o núcleo contará com membros do Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Ministério da Fazenda, do Banco Central, Agência Brasileira de Inteligência, das Forças Armadas e da Polícia Federal.
“Estamos colocando ainda à disposição recursos da ordem de R$17 milhões para a instalação de bloqueadores de sinal em todas as unidades prisionais que os governos estaduais queiram.” De acordo com ele, a medida tem por objetivo impedir a troca de informações entre as facções de dentro e de fora do presídio.
“Também estará à disposição dos Estados R$ 15 milhões para tornozeleiras eletrônicas. Quando se coloca o réu primário que cometeu crime de baixo impacto na prisão ele, para sobreviver, tem de ingressar na criminalidade. Vamos, então, apoiar e financiar os Estados que requeiram o mecanismo de acompanhamento.”
Segundo o ministro, o presidente Michel Temer deverá assinar na próxima semana um decreto sobre política federal para egressos. “Serão disponibilizados R$ 50 milhões. A taxa de reincidência varia de 40% a 70%. Se não tivermos uma política de egressos, se quando ele sair não tiver alternativas, permanecerá nas mãos do crime organizado.”
Uma outra medida citada pelo ministro é uma legislação enviada ao Congresso Nacional para que chefes de facções cumpram suas penas dentro de presídios de segurança máxima nacionais. “Hoje, esses chefes de facções passam o período de um ano. A ideia é que passem a cumprir a integridade de sua pena lá dentro.”
“Queremos ainda extinguir as visitas íntimas, que funcionam de elo de informação. Também queremos legislar os parlatórios, para que as conversas sejam devidamente registradas e este acesso seja feito somente por ordem judicial para nunca prejudicar a defesa do preso. Se não cortarmos fluxo de informação dos chefes e suas gangues, estaremos enxugando gelo.”
Jungmann afirma que é grande a desproporção entre o volume de presos que cumprem sentença em regime fechado e em semiaberto. Na avaliação do ministro, seria necessário ampliar o número de presos no semiaberto para reduzir o total sentenciado no regime fechado. “Como não tem unidades em quantidade suficiente para o semiaberto, o juiz manda (o condenado) para o fechado. Outro problema é que 40% dos presos encontram-se em prisão preventiva”, disse.
O diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Tácio Muzzi Carvalho e Carneiro, afirmou que, no curto prazo, a expectativa do governo é de ampliar a aplicação de medidas para evitar o encarceramento – como o monitoramento eletrônico, por exemplo. “Vamos adotar e estamos tentando ver convênios que já existem com os Estados. Um segundo ponto, que não está apenas em nossa esfera, é incentivar o debate com o Judiciário, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública sobre o tema”, disse Muzzi.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

CNJ visita TJ-RS e avalia projeto precursor do depoimento especial no Brasil

A utilização da sala especial de depoimento é uma forma mais humana para ouvir crianças vítimas de crimes, em especial as vítimas de violência sexual, durante julgamento. FOTO:G.Dettmar/AG.CNJ
Duas almofadas amarelas de emojis sorridentes em duas poltronas escuras destoam do ambiente formal e chamam a atenção de quem conhece a pequena sala de depoimentos especiais do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). “As crianças chegam e já se abraçam com as almofadas. Servem como um escudo e fazem com que as crianças se sintam mais seguras. Queremos deixa-las seguras”, explicou a psicóloga Betina Tabyaski. É nessa sala, diante de uma câmera e com um microfone discretos, porém bem aparentes, que elas vão contar para uma psicóloga ou assistente social sobre o evento mais traumático de suas vidas até o momento. Em sua maioria, são crianças vítimas de violência sexual. 
Por mês, aproximadamente 25 crianças e adolescentes são ouvidos pela Juíza de Direito Tatiana Gischkow Golbert, titular da 6ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, geralmente nas segundas-feiras. A magistrada não é apenas especializada em crimes com vítimas infantis como também atua exclusivamente nesses casos em Porto Alegre, com o suporte técnico de assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras. Além da sala especial na qual as crianças são filmadas, há ainda outra sala, cheia de brinquedos e acessórios infantis, que funciona como uma recepção e para onde as crianças são levadas com o seu responsável, antes da audiência, para evitar que se encontrem com o réu nos corredores do tribunal.
“A estrutura de Porto Alegre é bastante boa. Eles têm equipe técnica adequada e salas especiais. Eles têm uma juíza que atua com exclusividade nesses casos e que trabalha em parceria com a promotoria, o que é excelente. Mas isso tudo é na capital. Não temos como avaliar ainda o interior”, comenta a diretora do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Maria Tereza Sadek, que está mapeando as técnicas e espaços utilizados para depoimentos especiais pelos tribunais de todo o País, como determina a Lei n. 13.431/2017.
No total, a diretora do CNJ acompanhou, em Porto Alegre, os depoimentos de seis processos diferentes que envolvem cinco crianças e uma adolescente. “Porto Alegre está avançada pois foi o local precursor da metodologia. No entanto, o depoimento especial ainda é uma novidade no País. Falta formação dos magistrados e capacitação de equipes técnicas para apoiá-lo”, comentou Sadek. Na opinião da pesquisadora, a lei só irá funcionar de maneira efetiva quando houver integração entre o Poder Judiciário, o conselho tutelar, a polícia e as promotorias de Justiça.

Pioneirismo

Há quinze anos, com uma câmera amadora e um microfone comprado em uma pequena loja comercial nas proximidades do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, dois juízes da vara da Infância e juventude de Porto Alegre encontraram uma forma mais humana para ouvir o depoimento das crianças vítimas de crimes, em especial as vítimas de violência sexual.
“Era uma enorme dificuldade ouvir os depoimentos das crianças. Me sentia péssimo ao fazer a criança contar tudo de novo e não me sentia confortável sequer para fazer as perguntas de uma forma mais compreensível para as crianças. A gota final veio do depoimento de uma criança de seis anos, vítima de estupro, que mexeu muito comigo”, contou o então Juiz de Direito do 2º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, José Antônio Daltoé Cezar. Hoje ele é desembargador da Vara de Família do TJ-RS.  "Na época, começavam a ser usadas as câmeras de segurança. Vi uma dessas na casa do meu cunhado, e pensei: 'Será que a gente consegue colocar som nessa imagem?' Daí surgiu a ideia", lembra o Desembargador Daltoé.
No Rio Grande do Sul, 84,4% das vítimas de crimes sexuais são crianças e adolescentes. O dado se refere a 341 processos julgados ente janeiro e outubro de 2017 pela 7ª Câmara Criminal do TJ-RS. Das 341 vítimas, 288 tinham entre um e 14 anos. Até os 10 anos, eram 161. Sobre o total, 90% eram do sexo feminino. A pesquisa foi realizada pelo gabinete do Desembargador Daltoé.
Para conhecer a pesquisa na íntegra, clique aqui.
O desembargador diz que o resultado positivo em termos de qualidade dos depoimentos coletados por vídeo foi imediato. “Com o ambiente mais acolhedor e a presença do psicólogo, as vítimas se sentiam mais à vontade e falavam mais. Não que isso tenha feito aumentar o número de condenações, mas conseguimos dar um atendimento mais humano para essas crianças”, destacou. Nascia assim o projeto “Depoimento sem Dano”.
Atualmente, 72 comarcas do Poder Judiciário do Rio Grande do Sul utilizam o depoimento especial, sendo que em 47 as salas já estão implantadas e com equipes capacitadas e 18 estão em fase de capacitação das equipes.
O Poder Judiciário do Rio Grande do Sul mantém campanha contra o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes. O site dedicado ao tema traz material informativo, vídeos de conscientização, contatos úteis e link para denúncia. Acesse aqui.
Para mais detalhes sobre como funciona o depoimento especial das crianças, clique aqui.

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