segunda-feira, 16 de julho de 2018

Documentos encaminhados ao CNJ sobre situação de presos têm sido ignorados

Não foi só o abaixo-assinado dos presos de Goiás, entregue nas mãos da ministra Cármen Lúcia, que não teve resposta. Pedidos de presos para que a ministra reconsiderasse uma decisão sobre o decreto de indulto também foram ignorados pela presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, segundo pessoas próximas ao caso ouvidas pela ConJur.
No início de junho, o repórter Severino Motta, do site BuzzFeed News, revelou que um documento com 1,3 mil assinaturas de presos de Goiás desapareceu no conselho. O abaixo-assinado, encaminhado dias após uma rebelião, tratava da progressão de regime para detentos da região que recebiam nova condenação enquanto estavam presos.
CNJ afirma que documento foi entregue em "caráter pessoal e reservado" à ministra Cármen Lúcia.
Luiz Silveira/Agência CNJ
A ministra estava com visita agendada no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia em janeiro, mas desmarcou por questões de segurança. O documento dos presos foi elaborado por integrantes da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil de Goiás e entregue pela defensora pública-geral, Lúcia Moreira.
De acordo com a reportagem, meses depois da rebelião, advogados que atuam em unidades prisionais do estado procuraram saber se havia novas informações sobre o abaixo-assinado. Um dos advogados, o criminalistas André Luiz Figueira Cardoso, contou que fez várias ligações para o órgão e para o gabinete da ministra Cármen Lúcia no STF, mas não teve acesso ao abaixo-assinado.
Em nota, o CNJ informou à ConJur que o documento não sumiu, mas foi entregue em "caráter pessoal e reservado" à ministra Cármen Lúcia. O CNJ afirmou ainda que o abaixo-assinado foi arquivado e não pode ser divulgado porque contém denúncias feitas por pessoas privadas de liberdade.
Além disso, o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF) entendeu que se tratava de uma questão tipicamente jurisdicional, fora das atribuições constitucionais do Conselho Nacional de Justiça. 
Transparência
Outras reclamações têm recebido tratamento parecido, segundo advogados. De acordo com advogados e funcionários do CNJ, há pouca transparência no tratamento dos processos. Segundo eles, os documentos chegam a ser cadastrados e recebem códigos de barras para acompanhamento, mas não recebem o "tombamento", o registro de entraram no sistema e podem ser consultados.

Em fevereiro deste ano, a Defensoria Pública da União encaminhou à ministra Cármen alguns milhares de cartas de presos com relatos de maus tratos descrevendo as condições precárias em que estão presos.
Junto com as cartas, um ofício explicando que o Estado — e, por consequência, o Judiciário — é responsável pelas condições em que os presídios se encontram. Qualquer problema decorrente dessas condições, portanto, seria de responsabilidade do Poder Judiciário.
No ofício, a DPU sugere que o CNJ crie um sistema eletrônico de acompanhamento da execução penal. A ideia é que o sistema já registre a data de soltura do preso que for condenado e qualquer mudança no cumprimento da pena seja acrescentada depois. Hoje, o sistema é invertido: o preso é que tem de apresentar o alvará de soltura para que a Vara de Execução avalie cada situação.
Fontes ouvidas pela ConJur relataram a sensação de que só há transparência sob a porta de entrada do Processo Judicial Eletrônico (PJe). Assim, ofícios e abaixo-assinados encaminhados ao CNJ recebem um código de barras, mas não há qualquer informação sobre o tombamento, o que prejudica o acompanhamento do processo.
É o caso de um ofício que pede a aplicação automática do indulto e comutação de penas. O documento foi encaminhado junto de outras cartas em fevereiro deste ano, com o objetivo de diminuir a burocracia no deferimento, mas não foi respondido até o momento.
À época, a ConJur mostrou que, em alguns trechos das correspondências, os presos contam que sofrem com doenças e superlotação — um deles está numa cela com oito camas e 17 pessoas — e a alimentação precária.
Revista Consultor Jurídico, 9 de julho de 2018.

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