Espanha, Itália e Portugal são os principais destinos; há casos em todas as regiões.
Apesar de alguns estudiosos afirmarem que o aliciamento de pessoas para a prática de trabalho escravo ou de exploração sexual tenha começado no Brasil ainda nos anos 1970 e 1980, foi no último mês de dezembro que Minas – apontado pela Polícia Federal como o quarto Estado em incidência do crime – começou a se estruturar para combater o tráfico humano. Desde que o Programa de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) entrou em funcionamento, no fim de 2012, 160 possíveis vítimas foram atendidas em 21 casos investigados, segundo o governo.
O Comitê Interinstitucional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (CIETP) também foi criado recentemente, reunindo 22 instituições no combate, entre ministérios públicos, polícias e secretarias.
Tratado como assunto novo por governos federal e estadual, o tráfico humano se transformou a partir dos anos 2000, ganhando atuação mais intensa de organizações criminosas articuladas tanto dentro como fora do país. Para a Seds, a sofisticação do crime foi o principal motivo para a implantação das ações, iniciadas a partir de um acordo firmado com o Ministério da Justiça em 2011.
“Esse é um tema historicamente velho, mas assustadoramente novo para os gestores públicos. Nós tínhamos tráficos de minorias, mas isso mudou. Hoje, o crime objetiva explorar as mulheres e o trabalho de crianças, ou a remoção de órgãos”, justifica a diretora do Núcleo de Resolução Pacífica de Conflitos da Seds, Ariane Gontijo.
Ela explica que estudos sobre o tráfico de pessoas ainda estão sendo produzidos, mas que já foi possível perceber que as vítimas saem de todas as regiões de Minas, com destino, principalmente, a países como Espanha, Itália e Portugal.
Para Leonardo Sakamoto, coordenador da Organização Não Governamental (ONG) Repórter Brasil, que discute temas como trabalho escravo e tráfico humano, as ações são importantes, mas chegam tarde. “Muitos governos não estavam preparados para atuar nas temáticas, mas deveriam. A exploração sexual e o uso de crianças crescem muito”, afirma. Segundo ele, Minas tem um papel simbólico no combate ao crime.
Enganação. O motivo para que pessoas acabem levadas para outros países e sejam obrigadas a viver em condições subumanas ou de escravidão é a vontade de ter uma vida melhor. Em geral, os aliciadores oferecem bons salários e um adiantamento para as passagens.
“Mas o custo dessas travessias é muito caro. E aí entra a servidão por dívida, e essa servidão já começa a caracterizar o trabalho escravo e o tráfico de pessoas”, explica o professor universitário e coordenador da Pastoral do Migrante, José Carlos Pereira.
Saiba mais sobre as ocorrências
Locais. O Vale do Jequitinhonha é apontado como uma das regiões com maior incidência de tráfico doméstico. Trabalhadores são levados para fazendas e usinas de cana-de-açúcar e para a construção civil.
Apurações. Divulgado pelo Ministério da Justiça em abril, o primeiro relatório do órgão sobre o crime aponta que, de 2005 a 2011, a Polícia Federal instaurou 514 inquéritos por tráfico de pessoas.
Confins. Para atender a brasileiros deportados, até dezembro, a Seds vai montar um Posto Avançado de Atendimento Humanizado ao Migrante no aeroporto de Confins, na região metropolitana.
Responsabilizar bandidos ainda é difícil no país
Apesar da nova estrutura montada para combater o tráfico de pessoas, penalizar os responsáveis pelo crime ainda é difícil. Entre os motivos para isso, estão a dificuldade de identificar os aliciadores e a falta de legislação específica para o crime. Hoje, os acusados são enquadrados em delitos como exploração de trabalho escravo, exploração sexual ou tráfico de drogas.
“Ainda é um desafio (a criminalização). Sempre que se trata de organização criminosa, são casos muito intricados”, afirma a coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Promotoria da Justiça e Defesa dos Direitos Humanos, Nívia Mônica da Silva.
A diretora do Núcleo de Resolução Pacífica de Conflitos da Secretaria de Estado de Defesa Social, Ariane Gontijo, afirma que o tráfico de pessoas é pouco conhecido. “A maioria das pessoas desconhece o problema em que está inserida, e, com isso, há grande dificuldade de se chegar aos criminosos”, diz.
O tempo. Cidades. PUBLICADO EM 20/05/13
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