Milton Corrêa da Costa
A notícia, tempos atrás, de que São Paulo deu início à fiscalização para detectar, através do teste da saliva, o uso da maconha e de outras drogas por motoristas, mostra que não só o álcool mas também o uso de entorpecentes ao volante constitui causa de grandes tragédias no trânsito brasileiro. No ano de 2011, um laudo do Instituto Médico Legal de São Paulo, mostrou que o motorista de um caminhão que atropelou e matou cinco trabalhadores na rodovia Anhanguera havia usado cocaína. O exame de urina comprovou que o caminhoneiro usou a substância tóxica. Em depoimento, confessou também que havia ingerido oito comprimidos de “rebite” (comprimidos à base de anfetamina para minimizar o sono), além de ter tomado cachaça. Não dormia há 20 horas. O caminhoneiro afirmou aos policiais que o veículo havia perdido o freio e por isto ocorreu o acidente, mas o laudo da perícia mostrou que não houve falha mecânica. O motorista também apresentava sinais de entorpecimento e fala confusa. Caso seja condenado por homicídio doloso, poderá pegar até 30 anos de prisão, tendo direito porém a todas as benesses, recursos e brechas próprias da misericordiosa lei penal brasileira.
Se desejássemos saber hoje quantos motoristas, nos últimos 10 anos, envolvidos em graves acidentes no país, morreram ou mataram por estarem sob o efeito de substâncias entorpecentes ou de álcool, não saberíamos responder. Não há estatísticas confiáveis sobre tal tema. Esse fato demonstra, apesar dos inegáveis resultados positivos até aqui obtidos com a implantação da Lei Seca, o quanto ainda somos atrasados, em relação a países de primeiro mundo, em termos de segurança de trânsito e na fiscalização de motoristas drogados. Um estudo apresentado num congresso médico na França, em 2005, mostrou que cerca de 40% das pessoas, com menos de 30 anos, que morreram em acidentes rodoviários naquele país, entre 2001 e 2004, dirigiam sob o efeito de maconha. Entre os mortos ao volante, que haviam fumado a droga – cerca de 800 pessoas por ano – quase 3/4 o fizeram uma hora antes do acidente. Hoje na França os motoristas parados em operações de trânsito têm que mostrar a língua para os policiais.
No Rio de Janeiro, já foi prometido, há algum tempo, o uso de uma espécie de ‘bafômetro antidrogas’, em operações da Lei Seca. Um aparelho que iria detectar, através da saliva, o uso de outras drogas porventura usadas pelos motoristas, tais como maconha, cocaína, ecstasy ou excesso de calmante. O resultado, após colhida por uma paleta a saliva do condutor e levada a amostra ao novo aparelho, sairia em 5 minutos. Até agora não se sabe em verdade se haverá realmente tal tipo de fiscalização. São Paulo saiu na frente, ainda que o aparelho empregado, embora anunciado homologado pela ANVISA, necessite de regulamentação do Contran, não valendo o teste como prova final para punir motoristas.
Na França, a infração de conduzir um veículo sob o efeito de drogas é ainda menos tolerada em comparação ao álcool. O motorista pode ser condenado a dois anos de prisão, multa de 4,5 mil euros (mais de R$ 10 m il) e a suspensão da carteira de motorista por até três anos. Após o sucesso da Lei Seca, com apoio progressivo de motoristas – muitos mudaram de comportamento – falta agora ao trânsito brasileiro também inibir o uso de substâncias entorpecentes ao volante. Trânsito é meio de vida, e drogados e alcoolizados ao volante são uma perigosa ameaça à vida humana. Não há dúvida.
Milton Corrêa da Costa é tenente coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro
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