segunda-feira, 26 de maio de 2014

Quanto mais igualdade, menos delitos violentos



O processo de degeneração das políticas públicas de “combate” ao crime violento no Brasil está mais do que evidente. Enxugamos gelo com toalha quente e giramos sempre em torno do mesmo ponto (mais policiais, mais viaturas, mais presídios etc.). Sempre mais do mesmo (sem nunca alterar a realidade). Já não bastam reformas, necessitamos de uma revolução. Somente uma maior igualdade entre todos pode mudar o panorama trágico do nosso país no campo da criminalidade convencional ou clássica.

A política criminal que mais se aproxima desse modelo liberal e racional aventado no século XVIII e que mais êxito vem alcançando no mundo todo é a realizada pelos países em processo de “escandinavização”, ou seja, de capitalismo evoluído, distributivo e tendencialmente civilizado. Esses países estão revelando uma pista extraordinariamente clara no sentido de que quanto mais igualdade, menos delitos violentos.  A ótica correta de enfocar o tema é a da igualdade, não a do seu oposto, da desigualdade. Porque nem sempre a desigualdade gera mais delitos. Sempre, no entanto, a igualdade produz menos crimes violentos. Os números de alguns países são impressionantes, especialmente no que diz respeito aos homicídios e roubos: (ver gráfico 1)

Quanto menos igualdade, mais crimes violentos. Essa regra vale, por exemplo, para os EUA e para o Brasil (guardadas as devidas proporções entre eles). Os primeiros possuem índice Gini de 0,45 (país bastante desigual). A média do indicador Gini dos 18 países acima selecionados é de 0,31. A falta de igualdade nos EUA explicaria sua maior taxa de homicídios (quase 5 vezes mais que a média dos demais países listados) assim como a incidência maior do delito de roubo (quase o dobro dos países elencados).

O Brasil é mais desigual ainda que os EUA: 85º no IDH, tem renda per capita de USD 11.340, Gini de 0,519 (0,51: país exageradamente desigual, o que significa uma altíssima concentração de renda), 27,1 assassinatos para 100 mil pessoas, 22 mortos no trânsito para cada 100 mil, quase 600 mil presos, 274 detentos para cada 100 mil habitantes; para além de uma percepção exacerbada de corrupção (72º), é o 16º país mais violento do planeta e conta com 16 das 50 cidades mais sanguinárias do universo. Nosso país, em síntese, não apenas nunca conseguiu domar o monstro do capitalismo selvagem (que aqui é fantasticamente centopéico e hecatônquiro) como apresenta uma das políticas criminais mais desastradas e erradas do planeta (posto que alimenta continuamente a espiral da violência, da tragédia). Eis os nossos números: (ver gráfico 2)

A redução da criminalidade violenta, como se vê, está diretamente ligada à igualdade do país (escolarização de todos, aumento da renda per capita etc.) e ao modelo de política criminal que ele desenvolve. O erro no Brasil começa que não temos políticas públicas socioeconómicas e educacionais eficazes nem sequer por aqui existe o império generalizado da lei repressiva (sempre preferimos o caminho errado da “severidade da pena” em lugar do rumo certo da “certeza do castigo”; sempre priorizamos a repressão à prevenção). Diante dessas gritantes deficiências, o poder público (com o apoio da própria população e da mídia) (a) incentiva o clima de guerra e de medo no país, (b) predispõe o cidadão para a sociedade hobbesiana (cessão de todos os direitos ao Estado), (c) edita leis penais alopradamente, (d) promove o encarceramento massivo sem critério, (e) mantém largo afrouxamento no controle dos órgãos repressivos, (f) dissemina a cultura das violações massivas dos direitos humanos e (g) desrespeita o devido processo legal e proporcional. Esse modelo fracassado de política criminal está saturado e, neste momento, apresentando nítidos e preocupantes sinais de degeneração, podendo gerar graves consequências de desagregação social.

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