quinta-feira, 2 de maio de 2013

Tentativa de suicídio é crime para lei militar dos EUA


Nos Estados Unidos, militar da ativa que tenta suicídio, e não morre, vai para a cadeia. Depois, é expulso das Forças Armadas. É a consequência mais comum porque, na corte marcial do quase suicida, a Promotoria não tem dificuldades de provar que ele cometeu uma das infrações previstas na legislação militar para tentativas de suicídio. É um código de 1940 que o Tribunal de Recursos da Justiça Militar questionou, ainda que timidamente, na segunda-feira (29/4), de acordo com a ABC News e o Huffington Post.
A tarefa da Promotoria na corte marcial não chega a ser difícil. Tem de provar que o réu cometeu pelo menos uma de três infrações criminais previstas na legislação militar, para obter a condenação: o militar tentou o suicídio com intenção de se livrar do serviço militar; a tentativa de suicídio traz descrédito para as Forças Armadas; o ato foi prejudicial para a ordem e a disciplina no quartel.
São todas acusações difíceis de contestar. Por isso, a defesa nem se preocupou com elas, no caso que foi levado ao Tribunal de Recursos, a mais alta corte da Justiça Militar dos EUA. Nesse caso específico, que só foi divulgado na terça-feira (30/4), a defesa atacou por outro flanco. Fez uma pergunta que tem resposta óbvia em todos os outros meios, menos o militar: será possível que uma tentativa de suicídio seja considerada, em vez de uma matéria criminal, um problema de saúde mental?
A defesa apresentou ao tribunal comprovação médica de que o soldado Lazzaric Caldwell, 26, sofria de distúrbio de estresse pós-traumático e de distúrbio de personalidade, antes de tentar o suicídio na base militar dos EUA em Okinawa, Japão, em 2010. Caldwell cortou os pulsos, mas foi imediatamente encontrado por um oficial que estancou o sangue com meias e o levou para o hospital.
A defesa também argumentou que a confissão de culpa do soldado, proposta pela Promotoria e aceita pelo tribunal, ficou prejudicada pelo fato de o réu não haver sido submetido a um exame psiquiátrico, como parte do processo judicial que o condenou.
Por três votos a dois, o Tribunal de Justiça Militar concordou com a defesa e decidiu que o juiz militar não poderia ter aceito a confissão de culpa do réu. "Precisamos determinar se, de uma forma geral, uma tentativa de suicídio em boa-fé, por si só, pode trazer descrédito para as Forças Armadas ou se deve ser considerada, mais apropriadamente, uma matéria não criminal, que requer tratamento médico, não um processo judicial", escreveu o ministro James Baker, pela maioria.
O Tribunal de Recursos enviou o processo de volta a um tribunal inferior, o de Recursos Criminais da Marinha, para reconsideração. Esse tribunal poderá encerrar o caso, reavaliar a sentença ou ordenar uma nova audiência. Caldwell fora condenado a 180 dias de prisão e foi dispensado dos marines por má conduta.
A decisão foi recebida pelas organizações que trabalham com a prevenção de suicídios no meio militar. O número de suicídios cresceu muito nas últimas duas décadas por causa do crescente estresse de combates e de múltiplas mobilizações para as guerras em que os EUA estão envolvidos.
No voto vencedor do Tribunal de Recursos Militar, os ministros escreveram uma nota de rodapé, lembrando uma declaração do ex-secretário da Defesa Leon Panetta de que "a prevenção de suicídios nas Forças Armadas é primeiramente e antes de tudo uma responsabilidade das lideranças militares".
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 1º de maio de 2013

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