De 2004 a 2013 a Polícia Civil de SP investigou somente 1 em cada 10 roubos (Folha 23/6/14: A1, C1 e C3). Mais precisamente, de todos os roubos registrados (há 11 meses consecutivos esse delito está subindo no Estado de SP), apenas 9,3% deles se transformaram em inquérito policial (2,3 milhões de ocorrências, 215 mil inquéritos instaurados e 2,1 milhões não investigados, negligenciados). No item roubo de veículos o problema é mais grave: 764 mil ocorrências, 38 mil inquéritos abertos (5,7%) e 726 mil não investigados. Somente nesses crimes, acima de 2,8 milhões de casos (no período) foram negligenciados (não investigados). Não temos números dos outros Estados, mas seguramente não serão muito distintos. A polícia civil foi sucateada nas últimas décadas (o efetivo dela em SP caiu de 31.809 para 29.517 em dez anos – redução de 10%). É evidente a falta de estrutura, de policiais, de materiais, de polícia técnica – perícias -, de investimentos econômicos (na políciacivil), de capacidade operacional, em suma, de gestão pública. Isso gera seletividade investigativa (somente alguns casos são apurados), baixo rendimento da eficiência administrativa, impunidade, incentivo à criminalidade, sensação de insegurança, aumento do lucro ilícito etc.
Explicação da Secretaria de Segurança Pública de SP: “são poucos os inquéritos instaurados porque não há presença de elementos mínimos de informações ou de provas que possibilitem a investigação”. De quem é a responsabilidade legal para obter esses “elementos mínimos de informações e de provas”? Da polícia. Conclusão: a polícia não está funcionando bem (instaurando inquéritos) porque a polícia não está cumprindo seu dever legal (de investigar). A polícia, em síntese, faz parte do problema, não da solução, dando vida à frase “se você não é parte da solução, então é parte do problema”, de Eldridge Cleaver (intelectual radical norte-americano). A verdade: a polícia civil não tem recursos suficientes para apresentar eficiência administrativa. Recursos escassos, investigações seletivas. Somente lhe resta a retórica (a enganação do povo) e nada mais!
Qual seria a solução? De acordo com os Secretários de Segurança Pública do Sudeste (SP, RJ, ES e MG), a solução consistiria em novas leis penais, com aumento de penas. Isso já foi feito, de 1940 (data do atual Código Penal) até 2014, 155 vezes (72% dessas mudanças trouxeram aumento de pena ou endurecimento do sistema penal – veja nosso livro Populismo penal legislativo, no prelo). Nunca a criminalidade baixou (a médio prazo) com essas reformas penais. Nunca! A polícia deveria ser proibida de falar em aumento de pena (e, dessa forma, enganar a população), se ela mesma não consegue investigar nem sequer 10% dos crimes. A política da severidade das penas na lei deve ser substituída pela da certeza do castigo (Beccaria já dizia isso em 1764: a pena não precisa ser severa, sim, justa, rápida, pronta e infalível). Não existe a certeza do castigo no Brasil (nem contra os pobres, muito menos contra os ricos). Enquanto isso não for feito a polícia não tem moral para pedir aumento de penas. O que fizeram os países que possuem baixo índice de roubos (Suécia, Holanda, Bélgica, Coreia do Sul etc.)? Duas coisas: certeza do castigo e políticas socioeconômicas e educativas (que promovem maior igualdade entre as pessoas). As duas medidas corretas nós não praticamos no Brasil. Logo, não se pode esperar eficiência administrativa de uma política totalmente equivocada.
A luz no fim do túnel nesse tema vem dos países em processo de “escandinavização”, que contam com um capitalismo evoluído, distributivo e tendencialmente civilizado. Eles estão indicando que é a igualdade material (das condições de vida) que faz a vida no planeta ter qualidade.
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