O crime de porte ilegal de arma de fogo não é descaracterizado no caso de o laudo pericial que atestou a eficácia da arma ser considerado nulo. Isso porque o reconhecimento da prática deste delito, previsto no artigo 14 do Estatuto do Desarmamento, por ser de mera conduta, não está condicionado à perícia sobre a potencialidade lesiva da arma apreendida.
Com este entendimento, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou Apelação de um homem condenado por porte ilegal de arma na Comarca de Santiago. A defesa alegou que o laudo pericial não tem valor, pois não foi feito por especialistas neste tipo de perícia.
Tal como o juízo de origem, os desembargadores entenderam que a confecção de autos-de-exame de eficácia de arma de fogo — além de outros — não demanda conhecimentos técnicos específicos, dada à singeleza da apuração.
O relator do recurso, desembargador Newton Brasil de Leão, ao confirmar a condenação, disse que o tipo penal não exige que o denunciado pretenda praticar algum crime com a arma, bastando que incorra numa das condutas tipificadas no dispositivo.
‘‘Nesses crimes, o legislador tipifica um agir que, por si só, representa alta potencialidade danosa à sociedade, e o reprova, não exigindo qualquer resultado para sua configuração’’, escreveu no acórdão, lavrado na sessão do último dia 5 de junho.
Denúncia do MP
O fato que originou a denúncia apresentada pelo Ministério Público estadual ocorreu no final da tarde de 13 de setembro de 2012. O denunciado estava pilotando sua motocicleta quando foi abordado por um policial militar, que o flagrou portando uma espingarda calibre 32. Ele foi incurso nas sanções do artigo 14 da Lei 10.826/03 – portar e transportar arma de fogo sem autorização legal.
Ouvido em juízo, o acusado confessou a posse da arma, que estava sem munição, argumentando que a encontrou no pátio da creche em que trabalha. Disse que iria levá-la para o interior de Santiago.
No curso do processo, a defesa do acusado requereu a invalidade da prova pericial que comprovou a potencialidade lesiva da arma de fogo, pois os responsáveis pela perícia não tinham formação superior na área. Logo, não haveria prova material para embasar uma condenação criminal.
Sentença condenatória
A juíza Cecília Laranja da Fonseca Bonotto, da Vara Criminal da Comarca de Santiago, derrubou a preliminar de nulidade arguida pela defesa, já que o exame de eficácia e funcionamento da arma foi feito por dois peritos nomeados e qualificados. Para ela, este tipo de exame, por outro lado, não requer alto apuro técnico, mas apenas a simples prática no manuseio com armas.
‘‘Além disso, mesmo que fosse considerada a ocorrência da nulidade levantada pelo Dr. Defensor Público, tal fato não teria o condão de impedir a condenação do acusado pelo crime de porte ilegal de arma de fogo, se presentes outros meios de prova a atestar a materialidade do crime, conforme a orientação do Superior Tribunal de Justiça’’, complementou na sentença.
Na análise de mérito, a julgadora entendeu que ficaram evidenciadas a materialidade e a autoria do delito. Destacou, também, que o fato da arma estar sem munição não afasta a tipicidade da conduta.
Com a fundamentação, o réu acabou condenado, nos moldes da denúncia-crime apresentada pelo MP, a dois anos de reclusão, no regime semi-aberto. Na dosimetria, a pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços comunitários e ao pagamento de multa.
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Revista Consultor Jurídico, 25 de junho de 2014.
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