Milton Corrêa da Costa
Lamentável sob todos os aspectos -um retrocesso no direito ao trabalho da imprensa livre- o episódio que envolveu policiais militares e a jornalista Vera Araújo, de O Globo, na tarde do último domingo, 15/06, na Quinta da Boa Vista, nas proximidades do Estádio do Maracanã, no Rio, quando a referida profissional de imprensa, no exercício de sua missão constitucional, tentava filmar e registrar uma ação policial contra um cidadão argentino, em princípio acusado de urinar em via pública. Tal fato demonstra, sem dúvida, a imensa dificuldade de agentes do estado de lidar ainda com o trabalho da imprensa livre e entender a missão jornalística, indispensável alicerce de um estado democrático de direito, sobretudo no registro de notícias envolvendo o trabalho e a não menos nobre missão policial.
É preciso entender que a ação policial, em via pública ou fora dela, só se pode entender, num estado democrático da direito, pelos princípios basilares e inseparáveis, dos limites da lei e da transparência do poder de polícia. Só se pode compreender o trabalho de uma polícia democrática e sobretudo cidadã pelo respeito aos direitos civis de todos os cidadãos, independentemente de raça, cor, credo, sexo, sexualidade, condição cultural ou social, aí incluído o respeito ao trabalho jornalístico, cuja carta magna brasileira garante o livre e responsável exercício da missão aos seus profissionais. Recentemente, o caso do desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo, na Favela da Rocinha, só foi possível esclarecer pelo trabalho de registro e ampla divulgação da imprensa. Ou seja, o trabalho da imprensa não se contrapõe à missão policial, pelo contrário, a completa lhe dando meios de lhe fornecer transparência, um princípio fundamental da administração pública.
Há, portanto, limites na ação policial num regime democrático e a imprensa tem o direito e o dever do registro do fato, na busca da ação persecutória da verdade. Um profissional de polícia nada tem a temer em sua conduta quando intervém nos limites da lei. Quando ha arbitrariedade, excesso do monopólio no uso da força e truculência na ação policial estamos diante de abuso de poder.
Há que se ter sempre em mente que o limite do poder de polícia é a lei. e a história nos tem mostrado que sem polícia, justiça e imprensa livre não há democracia. Alguns profissionais de polícia, que ainda se colocam acima do bem do mal, "donos do mundo", em razão do uso da farda, da arma e da carteira funcional, devem, portanto, refletir e curvar-se a tal ensinamento básico, pressuposto fundamental ao estado de direito. O direito de informar a verdade dos fatos, com toda a transparência, é inatacável. Aprenda-se.
Milton Corrêa da Costa é tenente coronel da reserva da PM do Rio de Janeiro.
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