O juiz deve fundamentar detalhadamente sua decisão ao rejeitar os argumentos da defesa preliminar e aceitar a denúncia feita pelo Ministério Público. O entendimento é do Tribunal de Justiça de São Paulo, que anulou ação penal justamente porque o juiz não fundamentou a recusa dos argumentos da defesa prévia. Embora a norma que criou o contraditório antes da aceitação da denúncia esteja em vigor há mais de um ano, ainda há juízes que não entram em detalhes quando decidem instaurar o processo criminal.
Desde agosto do ano passado, as ações penais devem ser precedidas de um contraditório preliminar em que a defesa possa apresentar provas antes de o processo começar. Apresentada a denúncia do Ministério Público, o acusado tem a chance de argumentar e apresentar documentos e testemunhas a seu favor. O juiz pode então impedir a abertura do processo se entender não haver crime, ilicitude ou culpabilidade, ou quando o acusado, mesmo culpado, não puder ser punido. A regra, prevista nos artigos 396, 396-A e 397 do Código de Processo Penal — incluída pela Lei 11.719/08 —, desengessou a Justiça criminal, que antes era obrigada a abrir o processo mesmo diante da impossibilidade clara de punição.
A nova fase incluída no procedimento, porém, nem sempre recebe o mesmo tratamento dado à ação penal. Em maio, a 1ª Vara Criminal em Birigui, em São Paulo, justificou assim a rejeição dos argumentos da defesa de um acusado: “deve o defensor alegar toda matéria que venha a diminuir as pretensões opostas pelo órgão acusatório, visando, com isso, a absolvição sumária. Ao que noto, as defesas e documentos (…) não têm esse condão, razão pela qual entendo que não se trata de hipótese da aludida absolvição sumária”. Pronto. Estava dado início ao processo penal.
Para 14ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, a explicação não foi suficiente. Atendendo a um Habeas Corpus ajuizado pela defesa, os desembargadores decidiram anular o processo e determinaram que o juiz Marcelo de Freitas Brito analisasse novamente os argumentos e fundamentasse sua decisão.
A denúncia se referia a um dono de posto de gasolina acusado de expor à venda combustível adulterado. O crime está previsto no artigo 7º, inciso II, da Lei 8.137/90. O acórdão afirma que os desembargadores “concederam a ordem de Habeas Corpus (…) para anular a Ação Penal a partir da decisão que rejeitou a resposta defensiva, determinando que outra seja proferida, de forma fundamentada, bem como para determinar o não indiciamento do paciente pelo fato narrado naqueles autos”. O relator do recurso, julgado em agosto, foi o desembargador Hermann Herschander.
“Muitos juízes não estão analisando as alegações defensivas de forma fundamentada. Assim, em despachos padronizados, servíveis para quaisquer casos, dizem apenas que os argumentos do acusado não têm o condão de conduzir à absolvição sumária e determinam o prosseguimento do processo”, afirma o advogado Carlos Alberto Pires Mendes, do escritório Maronna, Stein e Mendes Sociedade de Advogados. Segundo ele, a decisão é pioneira, e terá efeito pedagógico para os juízes criminais, que passarão a analisar com maior critério os argumentos antes mesmo de permitirem que as ações comecem a tramitar.
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Habeas Corpus 990.09.123605-5
Revista Consultor Jurídico, 21 de setembro de 2009
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