quarta-feira, 21 de maio de 2008

RJ: monitoramento eletrônico de apenados divide opiniões

Divergências de pensamentos sobre a utilização de mecanismos eletrônicos para o monitoramento de presos, proposta no projeto de lei 1017/07 da deputada Cidinha Campos (PDT), marcaram a audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio nesta terça-feira (20/05). De acordo com o vice-presidente da comissão, deputado Marcelo Freixo (PSol), que presidiu o debate, a discussão foi muito boa para ouvir diferentes entidades envolvidas com o tema. "Tenho convicção de que a solução para diminuir o número de reincidentes é focar em investimentos sociais concretos abrangendo Educação, Saúde, Emprego e Habitação, entre outros. Mas o debate sempre enriquece nossa visão", afirmou. Autora do projeto em discussão, Cidinha Campos disse que o projeto está em fase inicial, que será emendado por ela mesma e por outros deputados. "Todos sairão daqui com outra visão para poder emendar o projeto, que precisa ser aprimorado sim, mas não arquivado", destacou a parlamentar.



Saber onde se encontra o preso em regime semi-aberto ou aberto, de acordo com Cidinha Campos, não significa ferir os Direitos Humanos. "Não vejo razão para considerar o monitoramento uma afronta aos presos, pois até quem nunca cometeu crime algum é vigiado o tempo todo. Nós vivemos presos. Hoje, ou você está dentro de casa, trancado, ou é morto na rua", indignou-se a deputada, lembrando que o seu papel é pensar no ser humano como um todo, e não apenas nos que cometeram delitos. O deputado Pedro Paulo (PSDB), que apresentou recentemente projeto sobre o mesmo tema, também participou da audiência e destacou a importância da proposta baseado em números. "Atualmente temos 30 mil presos, dos quais 4.700 cumprem os regimes aberto e semi-aberto. No ano passado, tivemos 17% de fugas entre os apenados em cumprimento desses regimes. Além de ser mais caro manter o preso no sistema do que monitorá-lo, acredito que pode colaborar para a ressocialização, uma vez que incentivaria o maior número de presos no regime semi-aberto", avaliou.



O secretário de Estado de Administração Penitenciária (Seap), Cesar Rubens Monteiro de Carvalho, disse ser a favor do monitoramento, mas teme que a iniciativa esbarre no Código Penal, que prevê a autodisciplina dos presos, sem vigilância. "Utilizar o acompanhamento eletrônico significaria liberar 4.500 presos que hoje cumprem os regimes em questão. Isso daria nove unidades com capacidade para 500 detentos, mas precisamos observar a legalidade da proposta e como se daria, por exemplo, esse rastreamento. É preciso ouvir um técnico da área porque na maioria das vezes essas pessoas moram em comunidades carentes, onde há uma casa sobre a outra. Não sei como se dá essa localização, se será precisa", advertiu. Para a coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Ações pela Cidadania, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Miriam Guindane, os projetos deveriam ser voltados para a ampliação de medidas de inclusão e de penas alternativas. "O monitoramento eletrônico fere o direito do cidadão de ir e vir e fere a autodisciplina, que lhe garante a Constituição", pontuou.



Se ao preso que, em condições normais, não poderia ter liberdade provisória fosse oferecido o direito de ser monitorado em troca da liberdade, a Defensoria Pública do estado acredita que seria um avanço no sistema penitenciário. Porém, de acordo com o coordenador do Núcleo do Sistema Penitenciário da Defensoria Pública, Eduardo Quintanilha, da forma como é proposto, o projeto é um retrocesso. "As oportunidades já são extremamente escassas para essas pessoas, e isso só agravaria ainda mais as condições de ressocialização", defendeu. Já o Ministério Público, representado pelo promotor da Vara de Execução Penal (VEP), Cristiano Lajoia, se mostrou favorável à iniciativa, ao contrário dos representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), da Defensoria Pública e dos conselhos regionais de Psicologia e Serviço Social. "Entendo que essa é uma medida eficaz e deve ser testada porque a execução da lei é ineficiente. Temos 200 presos cumprindo pena e 1.800 foragidos. Cerca de 75% a 80% das pessoas que, pela primeira vez, cumpriram visita periódica se evadiram e isso não pode ocorrer", destacou.



Norberto Ferreira Ribeiro, ex-detento, contou que entrou na cadeia com 18 anos e só saiu aos 32. Ele disse que a sua maior dificuldade foi não ter suporte do estado. "Nós não temos trabalho, educação e nem saúde. Saímos doentes, sem psicólogo e sem qualquer incentivo. Antes de pensar em tecnologia precisamos pensar no ser humano. Se hoje sou uma referência por retomar minha vida, cuidar de minha família e ter meu trabalho, foi por esforço meu, mas precisamos de estrutura, porque a gente sai da cadeia, mas ela continua na gente", desabafou Ribeiro.



Alerj.

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