domingo, 18 de maio de 2008

Artigo - O respeito às garantias e liberdades individuais e o combate ao terrorismo




É a partir do evento terrorista lembrado como “11 de Setembro” que o mundo ocidental volta a sentir a presença do terrorismo internacional em solo americano, apesar de todo o investimento milionário em serviços de inteligência, de combate ao terrorismo, com agências especializadas, inclusive com escritórios nas principais cidades do mundo.

Dois aviões comerciais foram seqüestrados e lançados sobre as Torres Gêmeas do World Trade Center em Nova Iorque. Um terceiro avião foi lançado sobre a sede do Pentágono dos Estados Unidos e um quarto caiu na Pensilvânia.

O evento terrorista que deixou cerca de 3 mil mortos, segundo algumas estatísticas, teve como suspeito o kuweitiano Khalid Shaikh Mohamed, 37 anos e um dos principais assessores de Osama bin Laden. Há uma recompensa de US$ 25 milhões por informações que levem à sua prisão.

Fala-se em 2.992 pessoas com morte presumida entre seqüestradores, passageiros das aeronaves e vítimas presentes no WTC.

O uso da violência e da intimidação, especialmente para fins políticos, é o principal meio de atuação das organizações terroristas.

As organizações mais atuantes possuem muitos pontos em comum:

- conseguem operar dentro e fora dos Estados Unidos;

- diversificação de braços financeiros e logísticos internacionais;

- desarticulação muito difícil apenas com sanções econômicas;

- recursos tecnológicos acessados de forma constante e ampla, inclusive com mensagens cifradas e outras criptografadas.

- objetivos de espalhar o terror e pânico, para enfraquecer os governos e o apoio popular.

A regra de ouro é a utilização, à exaustão, de serviços de inteligência e de comunicação entre as diversas agências especializadas, com a busca pela coleta e análise eficiente de dados em tempo real.

O governo norte-americano definiu quatro princípios básicos para a cooperação antiterrorista internacional:

1) não fazer concessões aos terroristas e não aceitar acordos;

2) submeter os terroristas à justiça por seus crimes;

3) isolar e exercer pressões contra os Estados que patrocinam o terrorismo e obrigá-los a mudar sua conduta;

4) reforçar a capacidade antiterrorista de alguns países que colaboram com os Estados Unidos e requeiram assistência.

De acordo com o Terrorism Act 2000, terrorismo é a ação ou omissão, mediante ameaça, com propósitos políticos, religiosos ou ideológicos, podendo incluir séria violência contra uma pessoa, sérios danos a uma propriedade, ou criar um sério risco à saúde ou segurança do público ou uma parte do público.

O terrorismo é definido, no relatório “Patterns of Global Terrorism -2000” do Departamento de Estado dos USA, como a violência premeditada e politicamente motivada perpetrada contra alvos não combatentes através de grupos subnacionais ou de agentes clandestinos, normalmente utilizados para influenciar uma audiência. Ainda, segundo o relatório, terrorismo internacional significa terrorismo que envolve cidadãos ou o território de mais de um país e grupo terrorista é aquele que pratique o terrorismo internacional (tradução livre).

O Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre a Supressão de Atentados Terroristas com Bombas, incorporada ao ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto n.º 4.394/2002, que define como artefato explosivo ou mortífero, em síntese, aquele que tenha a capacidade de causar morte, lesões corporais graves, pela emissão de produtos químicos tóxicos, toxinas biológicas ou material radioativo.

Um dos princípios constitucionais que regem as relações internacionais é o “repúdio ao terrorismo”, previsto no artigo 4.º, inciso VIII, da CF-88, que impõe o dever da União associar-se à luta contra ele. Prevê o artigo 5.º, inciso XLIII, da CF-88 que a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia o terrorismo, entre outros, respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem. Constitui, ainda, crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático (art. 5.º, inciso XLIV, C.F.-88).

Entre outros diplomas legais temos a Lei 6.815, de 18/8/1980 (estabelece que o terrorismo não pode ser considerado crime político), a Lei 7.170, de 14/12/1983 (define os crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social; o Título II “Dos Crimes e das Penas” estabelece a pena para “atos de terrorismo”); a Lei 8.072, de 25/7/1990 (classifica o terrorismo como crime hediondo); e a Lei 9.613, de 03/3/1998 (considera crime de lavagem de dinheiro qualquer atividade que vise ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes direta ou indiretamente de crime de terrorismo, aquele contra o sistema financeiro nacional e o praticado por organização criminosa, entre outros).

O artigo 2.º da Lei n.º 8.072/90 estabelece que o crime de terrorismo é insuscetível de anistia, graça e indulto; fiança e liberdade provisória e será cumprido integralmente em regime fechado.

Nenhum dos diplomas legais traz a definição exata do ato de terrorismo, solução que será dada pelo Poder Judiciário de acordo com a casuística.

Para o STF, o terrorismo é a expressão de uma macrodelinqüência capaz de afetar a segurança, a integridade e a paz dos cidadãos e das sociedades organizadas e fenômeno criminoso da mais alta gravidade. Ademais, a comunidade internacional não pode permanecer indiferente a esse fenômeno, pois o ato terrorista atenta contra as bases em que se apóia o Estado democrático de direito e representa ameaça inaceitável às instituições políticas e às liberdades públicas.

A Convenção das Nações Unidas para a Supressão do Financiamento do Terrorismo cria a obrigação nova de não prover fundos a entidades terroristas e coíbe a ocultação da origem ilícita de fundos obtidos com a prática do crime, mas também a adoção de medidas destinadas a ocultar a origem de fundos obtidos sem a prática do crime, a serem utilizados em atividades terroristas.

O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, divulgou, no mês de agosto de 2005, um pacote antiterror, que agiliza a deportação, possibilita que estrangeiros ligados ao terrorismo sejam expulsos pelo Ministro do Interior e proíbe as organizações muçulmanas Hizb ut Tahrir e Al-Muhajiroun. Pertencer ou arrecadar bens para essas organizações será crime, além de vedado o asilo político e ampliado o período de detenção de suspeitos antes da apresentação de acusações.

Em 26 de outubro de 2001, logo após o famigerado atentado terrorista de “11 de Setembro”, o governo americano implementou medidas para combater o terrorismo com a edição do USA Patriot Act, também referido como USAPA e Lei Pública n.º 107-56, que tem causado grande polêmica quanto à: a) definição do crime de terrorismo doméstico; b) detenção compulsória de terroristas suspeitos e os tribunais militares; e c) a pós-notificação dos mandados de busca e apreensão, todos por possível violação das primeira, quarta, quinta e sexta emendas da Constituição Americana.

Adveio, então, Patriot Act II nomeado de Domestic Security Enhancement Act of 2003, com previsão de registro de DNA de estrangeiros suspeitos ou de cidadãos norte-americanos suspeitos de terrorismo.

Segundo Magalhães (2007), o Patriot Act II prevê que um cidadão norte-americano pode ser expulso dos Estados Unidos, se tiver a intenção de se desfazer da sua nacionalidade, o que ocorre, por exemplo, quando um cidadão norte americano se torna membro de organização terrorista, podendo assim decidir um magistrado. O ato patriota prevê também o abandono dos procedimentos judiciais em atividades de segurança nacional, permitindo detenções secretas.

É muito importante que as nações se auxiliem, mutuamente, na investigação criminal e nas ações penais que tratem de financiamento e apoio a atos terroristas, inclusive na cooperação para o fornecimento de provas, mas, no conflito entre direitos de individuais e a segurança nacional, não pode haver generalizada mitigação do direito individual, sob pena de ruírem os pilares do Estado democrático de Direito e nos tornarmos o espelho de nossos próprios detratores. Não se pode olvidar, pois, que os controles legais repressivos devem respeitar o núcleo essencial dos direitos fundamentais e usados com parcimônia para não haver um retrocesso do processo democrático.

Nota:

(1) Extradição n. 855-2, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno do STJ, publ. no DJ de 01-07-05.

Referências bibliográficas

CASSESE, Antonio. Terrorism, Politics and Law: The Achille Lauro Affair. Princeton University Press: Princeton, New Jersey, 1990.

GOMES, Rodrigo Carneiro. O crime organizado na visão da Convenção de Palermo. Belo Horizonte: Del Rey, 2008.

GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Crimes Hediondos tóxicos, terrorismo, tortura. São Paulo: Saraiva, 2001.

MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. A crise da Democracia Representativa: o paradoxo do fim da modernidade.09/04/2007. Disponível em: Acesso em: 04 jan. 2008.

MAINENTI, Mariana; ADGHIRNI, Samy. O pesadelo continua. Jornal Correio Braziliense. 6 ago. 2005, caderno Mundo, p. 22.

PONTES, Marcos Rosas Degaut. Terrorismo. Brasília, 1999.

Rodrigo Carneiro Gomes é delegado de Polícia Federal em Brasília, professor da Academia Nacional de Polícia. Mestrando em Direito e Políticas Públicas. Autor do livro “O crime organizado na visão da Convenção de Palermo”, Ed. Del Rey, 2008, 272 f.


O Estado do Paraná, Direito e Justiça.

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