quarta-feira, 14 de maio de 2008

Artigo - Há futuro para a juventude?

Dados da Meta 4 do movimento Todos Pela Educação mostram que apenas 37,9% dos jovens brasileiros de 19 anos concluem o ensino médio. Dessa parcela, já muito pequena, a maioria atinge, nesse momento, o teto de suas possibilidades de formação escolar e profissional. Sem emprego ou oportunidades de trabalho, muitos desses jovens caem numa espécie de ociosidade precoce. Tornam-se, não raro, presa fácil para o tráfico de drogas e o crime organizado.

Esse quadro pode parecer assustador, mas é a realidade com que nos deparamos atualmente. A educação oferecida à juventude brasileira não tem sido capaz de apresentar uma perspectiva real de futuro a seus cidadãos que ingressam na vida adulta. Esse é um problema prioritário, que temos, como sociedade, a responsabilidade de ajudar a resolver. É urgente devolver ao jovem o direito de sonhar; um direito que lhe tem sido roubado.

Os jovens vêm tentando nos dizer, das mais diversas maneiras - como em recentemente pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e pelo Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais (Instituto Pólis) -, que a educação ocupa o primeiro lugar entre as suas preocupações. Em seis países sul-americanos - Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai - o problema é igual e os jovens demandam uma educação pública de qualidade, que seja inclusiva e forneça qualificação profissional, propiciando a conquista de melhores oportunidades de trabalho.

Para que essa necessidade seja atendida é crucial, na visão dos próprios jovens, a continuidade da formação escolar, que não pode parar no ensino fundamental e deve ter seqüência com o acesso ao ensino médio, a cursos técnico-profissionais e, se possível, ao ensino superior. De acordo com o estudo, ''os jovens querem uma escola que caiba na vida''.

Os números da educação brasileira revelam que a angústia dos jovens tem razão de ser. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2006 revelam que a taxa de matrícula no ensino fundamental é de 95% entre crianças de 7 e 14 anos que estão cursando a etapa adequada de escolarização. No ensino médio a situação é bem diferente: apenas 48,2% dos jovens entre 15 e 17 anos estão matriculados. Isso significa que 51,8% estão fora da escola ou atrasados, ainda cursando o ensino fundamental. Assim, podemos concluir que parcela significativa dos jovens, embora esteja estudando, enfrenta o drama da defasagem escolar.

A precariedade educacional está na raiz de muitos outros problemas sociais enfrentados pelos jovens. O mais recente relatório do Unicef sobre a infância no Brasil (Situação Mundial da Infância), divulgado em janeiro, indica que é cada vez maior o número de crianças nascidas de mães muito jovens: o número de bebês de mães com menos de 15 anos aumentou quase um terço (29%) entre 1994 e 2005 no País. O próprio Unicef afirma que o nível educacional das jovens tem relação direta com a gravidez precoce.

Outros estudos, do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, revelam dados preocupantes sobre a relação entre violência e juventude no Brasil. Entre 1979 e 2003, as armas de fogo mataram 550 mil pessoas no Brasil e os jovens, entre 15 e 24 anos, foram as principais vítimas: do total, 37,5% (206 mil) estavam nessa faixa etária. Em 2004, o Brasil registrava uma taxa de homicídios de 51,7 para cada 100 mil jovens, sendo o terceiro país que mais matava sua juventude por homicídio, depois da Colômbia e da Venezuela. Esses números indicam o provável envolvimento dos jovens com o crime, confirmando a realidade observada nos bolsões de pobreza do País.

Para atacar de frente os problemas que afligem os jovens brasileiros é urgente que o País desenvolva uma política de juventude o mais abrangente possível. Essa é uma questão de múltiplas causas, que exige uma solução integral, reunindo várias áreas governamentais. São necessárias medidas que vão além da educação formal, mas que tenham nela seu pilar estratégico.

A sociedade deve garantir que a qualidade do ensino seja excelente, para que o aluno aprenda o que deveria aprender e esteja preparado para o pleno exercício da cidadania. Também é necessário prover ferramentas para a inserção do jovem no mundo do trabalho, superando falsos dilemas que ainda cercam o tema do ensino profissional. Para tanto é preciso, antes de tudo, garantir a valorização e a capacitação dos diretores e professores, a fim de que estes tenham mais e melhores condições de entender e se aproximar da realidade dos jovens.

Há um consenso crescente no País, que extrapola os meios educacionais, de que é fundamental ampliar a oferta de educação profissional em grande escala. Para isso se deve integrar o ensino médio regular ao ensino técnico. E isso pode ser feito em sintonia com a cadeia produtiva de cada Estado, estimulando a formação profissional em consonância com os principais setores econômicos empregadores nas diferentes regiões.

Ao final do ensino médio, o jovem brasileiro deve poder decidir entre seguir seus estudos num nível técnico, para ingressar no mundo de trabalho, ou no ensino superior, sempre tendo em mente que, na sociedade do conhecimento, é imprescindível investir em sua formação ao longo de toda a vida.

Enfim, para termos uma juventude verdadeiramente independente, de cidadãos autônomos e críticos, precisamos, todos juntos, garantir que os jovens tenham a possibilidade de construir seu futuro. Um futuro sustentável. Jamais se tornando presa fácil para o tráfico de drogas e o crime organizado.


Por Luís Norberto Pascoal é diretor da Fundação Educar DPaschoal, do Instituto Faça Parte e do Todos Pela Educação Mozart Neves Ramos é presidente-executivo do Todos Pela Educação


Estadão.

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