segunda-feira, 5 de maio de 2008

Artigo - Devastação das drogas, por Cláudio Brito

Há cinco anos, pouco se falava em crack por aqui. A droga bruta e escravizante que há mais tempo dominava a periferia de São Paulo e provocava uma guerra nos morros do Rio de Janeiro dava seus primeiros sinais gaúchos. Investigações de homicídios apontaram a ligação estreita do tráfico com as mortes violentas de jovens, fossem drogados ou soldados do crime organizado. E fomos apresentados então à devastação que paulistas e cariocas já conheciam.

Agora, repetindo as dezenas de casos idênticos desse tempo, um jovem é acorrentado pela família como última chance de salvá-lo do calvário da drogadição irreversível. Foi em Santa Maria e, para espanto de quem tem bom senso, dizia a notícia que os pais devem ser indiciados por crimes de cárcere privado e tortura. Não posso acreditar. E, se for assim, que o Ministério Público siga outro caminho. O Estado ausente, que nega internação e tratamento, não pode agora se arvorar a condenar quem agiu em claro estado de necessidade.

E, diga-se mais, em legítima defesa escancarada. A integridade do jovem estava em jogo e a dos que com ele moravam.

Os efeitos do crack são terríveis e levam o dependente à perda de capacidade de se autodeterminar. Pela droga, faz qualquer coisa. Furta, rouba, agride, mata.

É por amor e desespero que um casal chega ao que chegaram os pais do menino de Santa Maria. Se há crime a apurar-se, não foi na casa dessa família que algum foi cometido.

Os danos causados pelas drogas são irreversíveis. Físicos e morais. E atingem a todos do núcleo familiar. Os que têm a felicidade de se desintoxicarem não se libertam das seqüelas, especialmente as emocionais. Por isso, quando não se pratica uma boa orientação ou se lê indevidamente o depoimento de um ex-drogado, comete-se o engano de estimular novas adesões, pois adolescentes despreparados sentem-se autorizados à experimentação, uma vez que de algum jeito se consegue sair da tragédia.

Não é por aí. Todo e qualquer passo tem que ser bem medido e o estímulo ao afeto familiar sempre será o melhor remédio.

Quando, todavia, o vale doloroso percorrido já é longo, necessário o apoio multidisciplinar de um atendimento por profissionais de gabarito em estabelecimentos estruturados adequadamente. Nem todos conseguem uma vaga em uma comunidade terapêutica ou em setor especializado de algum hospital. Carência que se deve cobrar do Estado.

Não será condenando um casal que se corrigirá quadro tão horrendo.

Quem faria diferente, vendo um filho adolescente ser morto pela droga que escraviza?

O certo seria deixá-lo nas ruas, até que cometesse assaltos que sustentassem o vício? Ou se deveria esperar que o jovem matasse ou morresse?

Ao que se sabe, pai e mãe tentaram várias vezes uma internação, algum socorro.

O desespero levou-os a copiar o que outros tantos já fizeram: acorrentaram o filho para libertá-lo.

CLÁUDIO BRITO | Jornalista

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