Passava das 2h da última sexta-feira quando um grupo de quatro rapazes com ares de 20 e poucos anos deixava o bar Le Roi, no entorno da rua Tabapuã, no Itaim Bibi (zona oeste), com sinais de torpor depois de beber, cada um, oito copos de chope e cerveja, entre uma e outra caipirinha.
Quatro jovens, quatro carros. Um deles sobe a contramão atrapalhando o tráfego, fura o sinal vermelho e entra na Brigadeiro Faria Lima, mesmo à noite, uma das avenidas mais movimentadas de São Paulo.
"Um terço dos motoristas tem álcool no sangue nos finais de semana", diz Ronaldo Laranjeira, médico psiquiatra, professor e coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Pesquisa conduzida por ele e pelo também médico da Unifesp Sérgio Duailibi às sextas e sábados com cerca de 5.600 motoristas em cidades como São Paulo, Belo Horizonte, Vitória, Santos e Diadema revela que 30,3% deles tinham algum nível de álcool no sangue constatado no teste do bafômetro, sendo que 19,3% tinham níveis iguais ou superiores a 0,06 decigrama de álcool por litro de sangue permitido por lei.
Duas conclusões que chamaram a atenção dos médicos-pesquisadores foram:
1) os motoristas bêbados geralmente não estavam visivelmente intoxicados;
2) a prevalência de motoristas que estavam dirigindo com algum nível de álcool nas cidades analisadas é seis vezes maior que em pesquisas internacionais semelhantes.
"Um copo de cerveja já altera os reflexos", diz Laranjeira.
Outro estudo, da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, que ouviu mais de mil estudantes universitários do Rio de Janeiro e de São Paulo, chegou a resultado parecido: 36% deles voltam para casa dirigindo, mesmo depois de consumir bebidas alcóolicas.
"O álcool é responsável por cerca de 60% dos acidentes de trânsito e aparece em 70% dos laudos das mortes violentas", diz o médico Milton Steinman, da Sociedade Brasileira de Atendimento Integrado ao Traumatizado e do pronto-socorro do Hospital das Clínicas.
Estudantes
Steinman cita ainda a recente pesquisa do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas, da Unifesp, feita com estudantes dos ensinos médio e fundamental de dez capitais brasileiras: bebidas alcoólicas são consumidas por 65% dos entrevistados, estando bem à frente do tabaco.
"Qualquer quantidade de álcool já é suficiente para causar prejuízos nos reflexos, as pessoas não deveriam dirigir", afirma a toxicologista Vilma Leyton, professora da Faculdade de Medicina da USP e membro da Abramet (Associação Brasileira de Medicina do Tráfego).
Levantamento feito por Leyton no Instituto Médico Legal de São Paulo em 2005 mostra que 44% dos 3.042 mortos em acidentes de trânsito no Estado ingeriram álcool antes e tinham entre 1,7 ou 2,4 decigramas de álcool por litro de sangue. "Isso é muito mais que uma cerveja", diz Leyton.
Além do Itaim Bibi, a Folha foi a bares e lojas de conveniência em postos de combustíveis em outras seis regiões da cidade na noite de quinta-feira. As pesquisas não exageram. Muitos motoristas chegavam, bebiam e invariavelmente deixavam os estabelecimentos dirigindo o carro.
Estadão.
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