quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Tumbas chinesas revelam uso de maconha há 2.700 mil anos

Segundo pesquisadores, a droga foi encontrada com os restos mortais de um xamã caucasiano

PEQUIM - O primeiro carregamento de maconha conhecido da história foi utilizado com fins terapêuticos ou religiosos no oeste da China há 2.700 anos, segundo os cientistas que o encontraram entre os pertences de uma misteriosa múmia de um homem loiro e de olhos azuis.

No ano de 2003, os arqueólogos acharam um pequeno saco com 789 gramas da erva em uma das múmias caucasianas das 500 tumbas escavadas em pleno Deserto de Gobi e perto de Turpan (na região ocidental chinesa de Xinjiang). Inicialmente, pensaram que se tratava de coentro, mas as últimas análises botânicas não deixam dúvidas: era maconha.

Os 789 gramas de cannabis foram encontrados entre os restos de um homem que morreu aos 45 anos, de cabelo e olhos claros, de alto nível social e equipado com materiais que apóiam a teoria de que se tratava de um xamã da cultura Gushi.

"É uma questão de dedução científica e é mais que provável que o cannabis fosse utilizado com fins psicoativos ou médicos", declarou à Agência Efe Ethan Russo, responsável da análise e professor convidado da Academia Chinesa de Ciências Sociais (ACCS).

O botânico, também professor do departamento de farmácia da Universidade de Montana, nos Estados Unidos, acrescenta que as ervas podem ter sido usadas com fins religiosos.

Russo ressalta que as análises praticados em 11 gramas do carregamento evidenciam que a maconha pertencia "a uma variedade de droga que se cultivava" e, além disso, não consta que o cânhamo tenha sido utilizado nessa região como alimento nem para confeccionar tecidos.

As análises genéticas demonstraram a presença do psicoativo THC, o tetrahidrocanabinol, responsável pelo efeito narcótico, segundo revela a equipe em seu artigo, publicado este mês na revista britânica Journal of Experimental Botany, de Oxford.

Segundo Russo, que trabalhou com uma equipe de 18 cientistas, em sua maioria chineses, se trata de uma descoberta muito importante que não só "diz muito sobre como viviam nossos antepassados, mas também prolonga o período pelo qual podemos dizer que o cannabis era utilizado com fins psicoativos".

Até hoje, as datações mais antigas do uso de maconha com fins narcóticos são da Judéia, há 1.700 anos, onde era consumida como sedativo nos partos, e algumas sementes com uso indefinido foram achadas na região nepalesa de Mustang, há entre 2.200 e 2.500 anos, e em Pazyryk, na Sibéria, há entre 2.400 e 2.500 anos.

No entanto, a equipe de Russo não pôde desvelar como a maconha era consumida, já que não foram encontrados cachimbos ou outros utensílios de inalação junto à múmia, nem se o uso da maconha era freqüente nesta cultura.

"A quantidade neste túmulo era substancial, 789 gramas. Seu uso poderia estar restrito aos xamãs, ou talvez, só os mais importantes dessa classe fossem enterrados com as ervas. Foram encontrados cannabis em duas das 500 tumbas escavadas. E restam mais de 2 mil", disse.

O descobrimento revela também características da misteriosa cultura Gushi, que floresceu a partir do século XIX a.C. no oeste da China.

"Os Gushi amavam suas vidas, e achavam que depois da morte sua alma continuaria vivendo em outro mundo. Mas não podiam se comunicar com os mortos diretamente, necessitavam de um xamã para isso. Talvez o cannabis fosse utilizado para isso", disse à Efe Jiang Hong-Em, da ACCS.

Sabe-se que o dono do cannabis, o xamã caucasiano, morreu nas proximidades das montanhas de Tianshan, já que seu esqueleto não apresenta um estado de conservação tão perfeito quanto os outros que estão nos 2.500 túmulos, favorecido por um clima extremamente árido e o solo alcalino.

Quanto aos Gushi, eram nômades caucasianos que falavam uma língua indo-européia, por isso que se acredita que se tratava de um povo original do Mediterrâneo Oriental ou da Ásia Central (segundo as teorias), que viveram há 4 mil anos nas bacias do Tarim e de Turpan.

Os Gushi acreditavam em deuses sincréticos, criavam cavalos e outros animais, cultivavam a terra e eram temidos por sua habilidade com o arco.

As primeiras notícias escritas sobre essa cultura são chinesas, datam de cerca de dois mil anos atrás e os chamam de "a linhagem da lua", em alusão a seus ritos lunares de fertilidade, mas também de "cachorros bárbaros do Oeste", cavaleiros guerreiros que habitavam o deserto de Taklamakán.

Estadão.

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