terça-feira, 8 de setembro de 2015

Informativo STF - 796

Cabimento de HC em face de decisão de Ministro do STF e colaboração premiada - 1

O Plenário denegou a ordem em “habeas corpus” impetrado em face de decisão proferida por Ministro do STF, mediante a qual homologado termo de colaboração premiada. A defesa alegava que o paciente fora denunciado pela suposta prática dos crimes de organização criminosa, corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem de dinheiro e uso de documento falso com base nas declarações oriundas do referido acordo. Sustentava, ainda, que o beneficiário do acordo não seria pessoa digna de confiança, e que o paciente, em razão de não ser parte no termo de colaboração, não poderia manejar recurso da aludida decisão, motivo pelo qual o “writ” seria o instrumento processual cabível. Além disso, argumentava que decisões monocráticas deveriam passar, necessariamente, pelo crivo do Colegiado, em obediência à organicidade das decisões judiciais. Preliminarmente, ante o empate na votação, o Tribunal conheceu do “habeas corpus”. No ponto, aduziu que o “writ” teria fundamento no art. 102, I, d, da CF, segundo o qual cabe “habeas corpus” contra atos do próprio STF. O Ministro Gilmar Mendes destacou que obstar o uso do “writ” na hipótese significaria dificultar a garantia do art. 5º, XXXV, da CF, bem assim o próprio ideário de proteção do “habeas corpus”. O Ministro Marco Aurélio invocou, ainda, os artigos 5º, LXVIII, e 102, I, i, da CF. Frisou que eventual manuseio de agravo regimental não teria eficácia suspensiva, bem assim que não seria aplicável o art. 5º, I, da Lei 12.016/2009, alusiva a mandado de segurança. Lembrou que o “habeas corpus” não encontraria óbice sequer na coisa julgada, e que o Enunciado 606 da Súmula do STF (“Não cabe habeas corpus originário para o Tribunal Pleno de decisão de Turma, ou do Plenário, proferida em ‘habeas corpus’ ou no respectivo recurso”) não seria referente a ato de Ministro da Corte. O Ministro Celso de Mello sublinhou, ainda, o Enunciado 692 da Súmula do STF (“Não se conhece de ‘habeas corpus’ contra omissão de relator de extradição, se fundado em fato ou direito estrangeiro cuja prova não constava dos autos, nem foi ele provocado a respeito”). O Ministro Ricardo Lewandowski (Presidente) destacou que, uma vez cabível o recurso de agravo interno em face de decisão monocrática — portanto via de envergadura menor —, não se poderia falar em empecilho para o uso do remédio constitucional. Por sua vez, não conheciam do “habeas corpus” os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Entendiam incidir o Enunciado 606 da Súmula do STF. Além disso, o paciente não seria parte no acordo de colaboração premiada, cuja homologação seria o ato coator. Ademais, decisão de Ministro do STF desafiaria agravo regimental e, caso se tratasse de terceiro prejudicado, aplicar-se-ia o art. 499 do CPC.
HC 127483/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 26 e 27.8.2015. (HC-127483)

1ª Parte: 
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2ª Parte: 
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Cabimento de HC em face de decisão de Ministro do STF e colaboração premiada - 2

No mérito, o Plenário considerou que a colaboração premiada seria meio de obtenção de prova, destinado à aquisição de elementos dotados de capacidade probatória. Não constituiria meio de prova propriamente dito. Outrossim, o acordo de colaboração não se confundiria com os depoimentos prestados pelo agente colaborador. Estes seriam, efetivamente, meio de prova, que somente se mostraria hábil à formação do convencimento judicial se viesse a ser corroborado por outros meios idôneos de prova. Por essa razão, a Lei 12.850/2013 dispõe que nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento exclusivo nas declarações do agente colaborador. Assinalou que a colaboração premiada seria negócio jurídico processual, o qual, judicialmente homologado, confere ao colaborador o direito de: a) usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica; b) ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados; c) ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes; e d) participar das audiências sem contato visual com outros acusados. Além disso, deverá ser feito por escrito e conter: a) o relato da colaboração e seus possíveis resultados; b) as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia; c) a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor; e d) as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor. Por sua vez, esse acordo somente será válido se: a) a declaração de vontade do colaborador for resultante de um processo volitivo, querida com plena consciência da realidade, escolhida com liberdade e deliberada sem má-fé; e b) o seu objeto for lícito, possível, determinado ou determinável. Destacou que a “liberdade” de que se trata seria psíquica, e não de locomoção. Assim, não haveria óbice a que o colaborador estivesse custodiado, desde que presente a voluntariedade da colaboração. Ademais, no que se refere à eficácia do acordo, ela somente ocorreria se o ato fosse submetido à homologação judicial. Esta limitar-se-ia a se pronunciar sobre a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo. Não seria emitido qualquer juízo de valor a respeito das declarações eventualmente já prestadas pelo colaborador à autoridade policial ou ao Ministério Público, tampouco seria conferido o signo da idoneidade a depoimentos posteriores. Em outras palavras, homologar o acordo não implicaria dizer que o juiz admitira como verídicas ou idôneas as informações eventualmente já prestadas pelo colaborador e tendentes à identificação de coautores ou partícipes da organização criminosa e das infrações por ela praticadas ou à revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa. Por fim, a aplicação da sanção premial prevista no acordo dependeria do efetivo cumprimento, pelo colaborador, das obrigações por ele assumidas, com a produção de um ou mais dos resultados legais (Lei 12.850/2013, art. 4º, I a V). Caso contrário, o acordo estaria inadimplido, e não se aplicaria a sanção premial respectiva.
HC 127483/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 26 e 27.8.2015. (HC-127483)

Cabimento de HC em face de decisão de Ministro do STF e colaboração premiada - 3

O Colegiado assentou que eventual coautor ou partícipe dos crimes praticados pelo colaborador não poderia impugnar o acordo de colaboração. Afinal, se cuidaria de negócio jurídico processual personalíssimo. Ele não vincularia o delatado e não atingiria diretamente sua esfera jurídica. O acordo, por si só, não poderia atingir o delatado, mas sim as imputações constantes dos depoimentos do colaborador ou as medidas restritivas de direitos que viessem a ser adotadas com base nesses depoimentos e nas provas por eles indicadas ou apresentadas. Sublinhou, a respeito, que, nas demais legislações a tratar de colaboração premiada, o direito do imputado colaborador às sanções premiais independeria da existência de acordo judicialmente homologado. Nos termos da Lei 12.850/2013, após a homologação do acordo, os depoimentos do colaborador se sujeitariam ao regime jurídico instituído pela lei. Subsistiriam válidos os depoimentos anteriormente prestados pelo colaborador, que poderiam, oportunamente, ser confrontados e valorados pelas partes e pelo juízo. Outrossim, negar-se ao delatado o direito de impugnar o acordo de colaboração não implicaria desproteção aos seus interesses. Sucede que nenhuma sentença condenatória poderia ser proferida com fundamento apenas nas declarações do colaborador. Ademais, sempre seria assegurado ao delatado o direito ao contraditório. Ele poderia, inclusive, inquirir o colaborador em interrogatório ou em audiência especificamente designada para esse fim. Além disso, o Tribunal reputou que a personalidade do colaborador ou eventual descumprimento de anterior acordo de colaboração não invalidariam o acordo atual. Primeiramente, seria natural que o colaborador, em apuração de organização criminosa, apresentasse, em tese, personalidade desajustada ao convívio social, voltada à prática de crimes graves. Assim, se a colaboração processual estivesse subordinada à personalidade do agente, o instituto teria poucos efeitos. Na verdade, a personalidade constituiria vetor a ser considerado no estabelecimento das cláusulas do acordo de colaboração, notadamente a escolha da sanção premial, bem assim o momento da aplicação dessa sanção, pelo juiz. Além disso, eventual “confiança” do poder público no agente colaborador não seria elemento de validade do acordo. Esta não adviria da personalidade ou dos antecedentes da pessoa, mas da fidedignidade e utilidade das informações prestadas, o que seria aferido posteriormente. Assim, também seria irrelevante eventual descumprimento de acordo anterior pelo mesmo agente. Essa conduta não contaminaria a validade de acordos posteriores. O Plenário asseverou, ainda, que o acordo de colaboração poderia dispor sobre efeitos extrapenais de natureza patrimonial da condenação. Na espécie, ele cuidaria da liberação de imóveis do interesse do colaborador, supostamente produtos de crimes. Consignou que essas cláusulas não repercutiriam na esfera de interesses do paciente. Todavia, seria legítimo que o acordo dispusesse das medidas adequadas para que integrantes de organizações criminosas colaborassem para o desvendamento da estrutura organizacional. Como a colaboração exitosa teria o condão de afastar consequências penais da prática delituosa, também poderia mitigar efeitos de natureza extrapenal, a exemplo do confisco do produto do crime. A Corte registrou, ainda, que a sanção premial constituiria direito subjetivo do colaborador.
HC 127483/PR, rel. Min. Dias Toffoli, 26 e 27.8.2015. (HC-127483)

Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 1

O Plenário iniciou julgamento de medida cautelar em arguição de descumprimento de preceito fundamental em que se discute a configuração do chamado “estado de coisas inconstitucional” relativamente ao sistema penitenciário brasileiro. Nessa mesma ação também se debate a adoção de providências estruturais com objetivo de sanar as lesões a preceitos fundamentais sofridas pelos presos em decorrência de ações e omissões dos Poderes da União, dos Estados-Membros e do Distrito Federal. No caso, alega-se estar configurado o denominado, pela Corte Constitucional da Colômbia, de “estado de coisas inconstitucional”, diante da seguinte situação: violação generalizada e sistémica de direitos fundamentais; inércia ou incapacidade reiterada e persistente das autoridades públicas em modificar a conjuntura; transgressões a exigir a atuação não apenas de um órgão, mas sim de uma pluralidade de autoridades. O Ministro Marco Aurélio (relator) deferiu, parcialmente, a medida liminar para determinar que os juízes e tribunais: a) motivassem expressamente, em casos de decretação ou manutenção de prisão provisória, por que não teriam sido aplicadas medidas cautelares alternativas à privação de liberdade, estabelecidas no art. 319 do CPP; b) observassem os artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos a fim de que se realizasse em até 90 dias audiências de custódia, bem como viabilizasse o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária no prazo máximo de 24 horas, contados do momento da prisão; c) considerassem o quadro dramático do sistema penitenciário brasileiro no momento de concessão de cautelares penais, na aplicação da pena e durante o processo de execução penal; e d) estabelecessem, quando possível, penas alternativas à prisão, ante a circunstância de a reclusão ser sistematicamente cumprida em condições muito mais severas do que as admitidas pelo arcabouço normativo. O relator determinou, ainda, que a União liberasse o saldo acumulado do Fundo Penitenciário Nacional - FUNPEN e não realizasse novos contingenciamentos. Porém, indeferiu o pedido de abrandamento dos requisitos temporais e abatimento do tempo de prisão em razão de condições desumanas do sistema carcerário. Ressaltou que a disciplina legal a respeito dessa questão não poderia ser flexibilizada em abstrato. A contagem de tempo para a fruição desses direitos deveria ser feita caso a caso. Quanto ao pleito de compensação do tempo de custódia definitiva, frisou que faltaria previsão legal. Da mesma forma, por prejuízo, indeferiu o pedido relativo ao envolvimento do CNJ para o implemento dessas medidas.
ADPF 347 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 27.8.2015. (ADPF-347)


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Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 2

Preliminarmente, o relator assentou a adequação do instrumento. Reputou preenchidos os requisitos de violação de preceitos fundamentais, de impugnação de atos do poder público e de inexistência de outro meio eficaz de sanar a lesividade. Observou que os direitos apontados como ofendidos consubstanciariam preceitos fundamentais da dignidade da pessoa humana, da vedação de tortura e de tratamento desumano, da assistência judiciária e dos direitos sociais à saúde, educação, trabalho e segurança dos presos. Ponderou que haveria relação de causa e efeito entre atos comissivos e omissivos dos Poderes da União, dos Estados-Membros e do Distrito Federal e o quadro de transgressão de direitos relatado. Entendeu cabível a ação, uma vez que não existiria, no âmbito do controle abstrato de normas, instrumento diverso mediante o qual pudessem ser impugnados, de forma abrangente e linear, os atos relacionados às lesões a preceitos fundamentais articuladas. Notou que no sistema prisional brasileiro ocorreria violação generalizada de direitos fundamentais dos presos no tocante à dignidade, higidez física e integridade psíquica. As penas privativas de liberdade aplicadas nos presídios converter-se-iam em penas cruéis e desumanas. Nesse contexto, diversos dispositivos constitucionais (artigos 1º, III, 5º, III, XLVII, e, XLVIII, XLIX, LXXIV, e 6º), normas internacionais reconhecedoras dos direitos dos presos (o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos e Penas Cruéis, Desumanos e Degradantes e a Convenção Americana de Direitos Humanos) e normas infraconstitucionais como a LEP e a LC 79/1994, que criara o FUNPEN, teriam sido transgredidas. Em relação ao FUNPEN, os recursos estariam sendo contingenciados pela União, o que impediria a formulação de novas políticas públicas ou a melhoria das existentes e contribuiria para o agravamento do quadro. Destacou que a forte violação dos direitos fundamentais dos presos repercutiria além das respectivas situações subjetivas e produziria mais violência contra a própria sociedade. Os cárceres brasileiros, além de não servirem à ressocialização dos presos, fomentariam o aumento da criminalidade, pois transformariam pequenos delinquentes em “monstros do crime”. A prova da ineficiência do sistema como política de segurança pública estaria nas altas taxas de reincidência. E o reincidente passaria a cometer crimes ainda mais graves. Consignou que a situação seria assustadora: dentro dos presídios, violações sistemáticas de direitos humanos; fora deles, aumento da criminalidade e da insegurança social.
ADPF 347 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 27.8.2015. (ADPF-347)

Sistema carcerário: estado de coisas inconstitucional e violação a direito fundamental - 3

O Ministro Marco Aurélio registrou que a responsabilidade por essa situação não poderia ser atribuída a um único e exclusivo poder, mas aos três — Legislativo, Executivo e Judiciário —, e não só os da União, como também os dos Estados-Membros e do Distrito Federal. Ponderou que haveria problemas tanto de formulação e implementação de políticas públicas, quanto de interpretação e aplicação da lei penal. Além disso, faltaria coordenação institucional. A ausência de medidas legislativas, administrativas e orçamentárias eficazes representaria falha estrutural a gerar tanto a violação sistemática dos direitos, quanto a perpetuação e o agravamento da situação. O Poder Judiciário também seria responsável, já que aproximadamente 41% dos presos estariam sob custódia provisória e pesquisas demonstrariam que, quando julgados, a maioria alcançaria a absolvição ou a condenação a penas alternativas. Ademais, a manutenção de elevado número de presos para além do tempo de pena fixado evidenciaria a inadequada assistência judiciária. A violação de direitos fundamentais alcançaria a transgressão à dignidade da pessoa humana e ao próprio mínimo existencial e justificaria a atuação mais assertiva do STF. Assim, caberia à Corte o papel de retirar os demais poderes da inércia, catalisar os debates e novas políticas públicas, coordenar as ações e monitorar os resultados. A intervenção judicial seria reclamada ante a incapacidade demonstrada pelas instituições legislativas e administrativas. Todavia, não se autorizaria o STF a substituir-se ao Legislativo e ao Executivo na consecução de tarefas próprias. O Tribunal deveria superar bloqueios políticos e institucionais sem afastar esses poderes dos processos de formulação e implementação das soluções necessárias. Deveria agir em diálogo com os outros poderes e com a sociedade. Não lhe incumbira, no entanto, definir o conteúdo próprio dessas políticas, os detalhes dos meios a serem empregados. Em vez de desprezar as capacidades institucionais dos outros poderes, deveria coordená-las, a fim de afastar o estado de inércia e deficiência estatal permanente. Não se trataria de substituição aos demais poderes, e sim de oferecimento de incentivos, parâmetros e objetivos indispensáveis à atuação de cada qual, deixando-lhes o estabelecimento das minúcias para se alcançar o equilíbrio entre respostas efetivas às violações de direitos e as limitações institucionais reveladas. Em seguida, o julgamento foi suspenso.
ADPF 347 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 27.8.2015. (ADPF-347)


Arquivamento de inquérito policial e coisa julgada

O arquivamento de inquérito policial em razão do reconhecimento de excludente de ilicitude não faz coisa julgada material. Esse o entendimento da Segunda Turma, que, em conclusão de julgamento e por maioria, denegou a ordem em “habeas corpus” em que se pleiteava o reconhecimento da coisa julgada material e a extinção de ação penal. No caso, em razão da suposta prática do delito de homicídio tentado (CP, art. 121, § 2º, IV, c/c art. 14, II), foram instaurados dois inquéritos — um civil e um militar — em face do ora paciente e de corréus. O inquérito policial militar fora arquivado em 21.10.1993, a pedido do Ministério Público, que entendera que os agentes teriam agido em estrito cumprimento de dever legal. Já no inquérito policial civil, o paciente fora denunciado em 23.12.1998 e, instruída a ação penal, condenado à pena de 10 anos de reclusão. O Colegiado, inicialmente, destacou que, à época em que proferida a decisão determinando o arquivamento do inquérito policial militar, a Justiça Castrense seria competente para processar e julgar o paciente pelo delito em questão, já que somente com o advento da Lei 9.299/1996 teria sido deslocado o julgamento dos crimes dolosos contra a vida de civis para o tribunal do júri. Por outro lado, consoante o Enunciado 524 da Súmula do STF, decisão proferida por juiz competente, em que tivesse sido determinado o arquivamento de inquérito a pedido do Ministério Público, em virtude de o fato apurado estar coberto por causa excludente de ilicitude, não obstaria o desarquivamento quando surgissem novas provas, reiterado o que decidido no HC 95.211/ES (DJe de 22.8.2011). A decisão da Justiça Militar, na hipótese em comento, não afastara o fato típico ocorrido, mas sim sua ilicitude, em razão do estrito cumprimento do dever legal, que o Ministério Público entendera provado a partir dos elementos de prova de que dispunha até então. Nesse diapasão, o eventual surgimento de novos elementos de convicção teria o condão de impulsionar a reabertura do inquérito na justiça comum, a teor do art. 18 do CPP (“Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia”). Na espécie, a simples leitura das provas constantes dos autos apontaria uma nova versão para os fatos delituosos, em consequência do prosseguimento das investigações na justiça comum, não havendo impedimento legal para a propositura da nova ação penal contra o paciente naquela seara. Vencido o Ministro Teori Zavascki (relator), que entendia estar configurada a coisa julgada material. Leia o inteiro teor do voto condutor na seção “Transcrições” deste Informativo.
HC 125101/SP, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 25.8.2015. (HC-125101)

Crime de dirigir sem habilitação e lesão corporal culposa na direção de veículo

A Segunda Turma concedeu a ordem de “habeas corpus” para restabelecer a decisão de 1º grau que rejeitara a denúncia quanto ao crime de dirigir sem habilitação. No caso, o paciente teria sido denunciado pela suposta prática do delito em comento (CTB, art. 309), uma vez que, ao conduzir automóvel em via pública sem documento, colidira com outro automóvel, causando lesões em passageiros de seu veículo. O juízo entendera que o delito do art. 309 do CTB teria sido absorvido pela conduta de praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, tipificada no art. 303 do CTB, crime de ação pública condicionada à representação, que não fora formalizada no caso concreto, o que teria dado ensejo à extinção da punibilidade. Em seguida, a apelação interposta pelo Ministério Público fora provida para anular a sentença e determinar o prosseguimento do feito referente ao crime de dirigir sem habilitação, decisão que fora mantida pelo STJ. A Turma consignou que o crime de dirigir sem habilitação seria absorvido pelo delito de lesão corporal culposa em direta aplicação do princípio da consunção. Isso porque, de acordo com o CTB, já seria causa de aumento de pena para o crime de lesão corporal culposa na direção de veículo automotor o fato de o agente não possuir permissão para dirigir ou carteira de habilitação. Assim, em decorrência da vedação de “bis in idem”, não se poderia admitir que o mesmo fato fosse atribuído ao paciente como crime autônomo e, simultaneamente, como causa especial de aumento de pena. Além disso, o crime do art. 303 do CTB, imputado ao paciente, seria de ação pública condicionada à representação, que, como se inferiria da própria nomenclatura, só poderia ser perseguido mediante a representação do ofendido. Diante da ausência de representação, seria imperativo reconhecer a extinção da punibilidade do crime de dirigir sem habilitação.
HC 128921/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.8.2015. (HC-128921)


Informativo STF. Brasília, 24 a 28 de agosto de 2015 - Nº 796.

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