sexta-feira, 8 de maio de 2009

Jovens como agentes do seu próprio futuro

A violência urbana, as ideologias políticas, a gravidez precoce, a discriminação social e as preferências dos pais por alguns de seus filhos são os maiores fatores de exclusão que um grupo de jovens venezuelanos identificou no Relatório de Exclusão Juvenil, publicado pelo Centro Gumilla, um instituto de pesquisa social da Venezuela.

Neste relatório - dedicado a determinar como os jovens venezuelanos enxergam a si mesmos -, apesar de denunciar a falta de oportunidades para o seu desenvolvimento pessoal, eles também se definiram como agentes de mudança. "O povo, a própria gente que está sendo excluída, deve agir e propor um plano para acabar com a exclusão. Todos juntos, e com o apoio das diversas instâncias de governo", lê-se em um dos testemunhos dos 127 jovens entre 16 e 29 anos que participaram da pesquisa, realizada nas regiões Anzoátegui, Lara Bolívar, Carabobo e Zulia, através de entrevistas a especialistas na área de juventude e grupos focais.

Nos grupos de discussão, os jovens identificaram claramente várias formas de exclusão. Tudo começa na família, quando eles percebem que os pais favorecem algum dos filhos, como quando decidem pagar a educação somente de um deles, por falta de recursos. As mulheres, além disso, se queixaram das responsabilidades domésticas que lhes são impingidas desde muito jovens.

O "golpe" seguinte de exclusão denunciado nesse estudo chega ao tentar ingressar na educação superior, pois o acesso às universidades é muito limitado, especificamente por razões econômicas ou por disponibilidade de vagas. A próxima forma de exclusão é a profissional: quase todos os participantes se queixaram da falta de uma primeira oportunidade para trabalhar, sem a qual é impossível adquirir a experiência que os empregadores exigem.

A exclusão de gênero afeta diretamente as jovens grávidas, que são mais radicalmente rejeitadas no âmbito laboral e educativo.

Por último, mas não menos importante, os jovens falaram da exclusão política. O relatório afirma que os que estão a favor do governo excluem os partidários da oposição - e vice-versa. "As posições políticas são causa de exclusão no emprego. Também se faz referência a como os espaços de participação - como os conselhos comunitários - podem ser politizados, interferindo nos planos ou projetos a favor de uma comunidade", diz o relatório.

Essa situação contribui para aumentar os índices de violência juvenil, que já são preocupantes na região. Segundo a Rede de Informação Tecnológica Latino-americana (Ritla), a probabilidade de que um jovem latino-americano entre 15 e 24 anos morra vítima de homicídio é 30 vezes maior do que a de um jovem europeu na mesma idade.

Dentre os 83 países analisados pela Ritla, os que têm os cinco maiores índices de homicídio juvenil são latino-americanos: El Salvador, com uma taxa de 92,3 homicídios por cada 100.000 habitantes; Colômbia (73,4), Venezuela (64,2), Guatemala (55,4) e Brasil (51,6).

A despeito desse panorama, os jovens sentem que têm a capacidade e responsabilidade de solucionar os problemas. Para empoderá-los, o relatório conclui que se lhes deve dar ferramentas básicas, como informações sobre as leis que os amparam - especialmente sobre a Lei Nacional de Juventude.

Além disso, o texto recomenda pressionar o Instituto Nacional de Juventude para que assuma a sua competência e ajude os jovens a encontrar um primeiro emprego. Também pede que se implementem mecanismos de acesso à educação superior, à educação sexual, à assistência às jovens grávidas e à participação, que deve ser desligada das ideologias políticas.

Um dos primeiros efeitos desse relatório foi a convocatória aos pesquisadores que conduziram o estudo a participarem das discussões com o objetivo de reformar a Lei Nacional de Juventude, e que, segundo os autores, é um retrocesso em matéria de participação dos jovens, independentemente de sua orientação política. José Gregorio Guerra, um dos autores do relatório, conversou com o Comunidade Segura sobre o assunto.

Qual foi o impacto do estudo?

O informe circulou em organizações da sociedade civil, programas de jovens líderes, no circuito das escolas Fé e Alegria, em programas de rádio, mas temos tido uma maior receptividade internacional através da internet. Além disso, fomos convidados pela Assembléia Nacional para participar da discussão sobre a reforma da Lei Nacional de Juventude.

E qual é a sua postura frente à proposta de reforma dessa lei?

É um retrocesso, porque propõe que o Estado somente reconheça como organizações juvenis os Conselhos Populares de Juventude, e isso impede que os recursos e as oportunidades cheguem a outros grupos não-políticos. Ou seja, é uma forma de exclusão política que vai de encontro à liberdade de associação.

A exclusão é precisamente o eixo central do estudo. Nesse aspecto, quais as opiniões dos jovens que participaram?

Apesar da exclusão, que veem como uma barreira para alcançarem seu desenvolvimento, os jovens veem a si mesmos como agentes de mudança. Disseram coisas como: "existem dificuldades que temos que enfrentar - e depende de nós conseguirmos". Encontrar esse grau de consciência entre eles nos surpreendeu.

Que distância existe entre as conclusões do estudo e os preconceitos sobre os jovens por parte da sociedade venezuelana?

Foi interessante descobrir que jovens de classe baixa e média baixa no resto do país têm concepções muito similares aos jovens de classe média em Caracas.

Como os jovens venezuelanos enxergam a si mesmos?

Há muitas variações; há jovens, por exemplo, que, frente ao contexto político atual, dizem que prefeririam não envolver-se no conflito, mas isso não significa que não queiram participar das decisões políticas, mas sim que querem ter suas próprias iniciativas. Por isso, insisto que eles se veem como agentes de mudança, e creio que essa é uma mudança que está ocorrendo agora, ante a omissão e exclusão de que estão sendo objeto.

Em outras palavras, não ficam parados, mas buscam outros espaços, novas formas de participação. Muitos jovens querem desenvolver-se como indivíduos separados do conflito político, tendo como prioridades a educação e o emprego, independentemente de ideologias políticas.

Os âmbitos de exclusão que o relatório revela são o desemprego, a falta de educação, a gravidez precoce indesejada, a violência, a discriminação social e a exclusão política. Que resposta global se quer da sociedade venezuelana para mudar o enfoque para a juventude?

Primeiro, é necessário estabelecer um reconhecimento dos jovens, dos problemas, depois, procedimentos de mediação e conciliação. Reconhecer o outro é básico: como ator que forma parte da realidade, compartilhando-a ou não. Somado à mediação e conciliação, completamos aí três elementos fundamentais para remediar a exclusão.

É fundamental assessorar os jovens na realização de um projeto de vida, para que tenham a capacidade de imaginar o futuro, planejar, fazer a vida que quiserem. Sem projeto de vida, não tem como enfrentar o problema da exclusão; basicamente, o jovem exclui a si mesmo.

Isso é particularmente importante para as jovens, pois a gravidez indesejada gera uma dramática situação para essas jovens e para seus filhos. Não há políticas atuais que busquem reinseri-las depois da gravidez.

A violência é outro ponto crítico. Como está afetando os jovens, e de que maneira é um fator de exclusão?

Os jovens entre 15 e 28 anos são os que estão sendo assassinados. Ocorre que terminam sendo vítimas e perpetradores de homicídios, principalmente por ação de gangues. Também temos problemas com o tráfico de drogas, mas o problema principal são as gangues e os homicídios entre jovens.

Segundo o relatório da Lacso, a Venezuela tem a taxa mais alta de homicídio juvenil da América Latina. Por exemplo, em uma escola em Petare - um bairro periférico de Caracas -, 46% dos estudantes já brigaram alguma vez. Isso é um exemplo do que se está vivendo no lugar, onde o entorno é tão hostil.

Por que não se fez parte do estudo em Caracas?

Porque trabalhamos com professores das Escolas de Fé e Alegria, e devido à conjuntura política agitada pela discussão sobre a reforma do currículo bolivariano, os professores não puderam fazer as entrevistas, pois entraram em greve. É importante que se faça também em Caracas, mas por enquanto não temos planos de retomá-lo.


Comunidade Segura.

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