As regras estabelecidas nos artigos 50 e 51 do Código Penal e 164 da Lei de Execução penal suscitam dificuldades de interpretação, podendo ensejar conclusões equivocadas, tais como:
a) a conversão da multa em detenção é permitida se o condenado solvente não paga o valor estabelecido na sentença no prazo de dez dias depois do trânsito em julgado, independentemente do processo de execução;
b) É possível a conversão da multa em detenção simultaneamente com a penhora de bens.
Uma análise atenta dos referidos dispositivos legais, entretanto, permite conciliá-los de forma racional, resolvendo o aparente conflito de normas. Para tanto, devemos atentar que a primeira parte do art. 50 do CP não integra o processo de execução da pena de multa. Trata-se de dispositivo intermediário entre o encerramento do processo de conhecimento e o início da execução com o objetivo de permitir o pagamento voluntário da multa pelo condenado.
Assim, efetuando espontaneamente o pagamento , não existirá execução forçada prevista nos arts. 1645e seguintes da LEP . Esta somente será promovida se, findo o decêndio, o condenado deixar de pagar a multa.
O pagamento da multa no prazo o art. 164 da LEP, por outro lado, integra o processo de execução, pois foi extraída certidão da sentença condenatória (título executivo judicial) e requerida a citação do condenado para o pagamento do valor relativo à sanção pecuniária ou nomeação de bens à penhora.
Nesta fase podem ocorrer quatro hipóteses:
3. o condenado paga a multa e encerra-se o processo de execução;
4. o condenado requer ao juiz autorização para pagamento da multa em parcelas (segunda parte do art. 50 do CP e art. 169 da LEP);
5. o juiz determina o pagamento por meio de desconto no venci mento ou salário do condenado (art. 50, § 1º, do CP e art. 168 da LEP0;
6. o condenado nomeia bens à penhora (art. 164 da LEP).
Em conseqüência dessa interpretação, conclui-se que a conversão da multa em detenção (arts. 51 do CP e 182 da LEP) só tem cabimento no processo de execução. Trata-se, aliás, de incidente de execução, como evidencia o Título VII da ´p, que em seu capítulo inicial trata das conversões.
Entendimento contrário resultaria numa situação paradoxal: o condenado estaria preso (ou foragido) antes de ser citado para o pagamento da sanção pecuniária imposta na sentença condenatória.
A conversão, de acordo com os referidos dispositivos legais, só será admitida se o condenado for solvente e não pagar a multa ou frustar sua execução. Na primeira hipótese o condenado, inobstante solvente, não possui bens penhoráveis; na segunda, oculta seus bens ou cria indevidos obstáculos à execução.
Inaceitável, por outro lado, a simultaneidade da execução com a conversão da multa em prisão, situação aceita por Julio Fabbrini Mirabete. A LEP, efetivamente não proíbe tal coexistência de forma explícita. Mas será ilógico executar uma pena de multa que foi convertida em prisão, pois desapareceu o objeto da execução .
A expressão ' pagamento voluntário da multa pelo condenado' foi empregada por Rogério Lauria Tucci em aula do Curso de Pós Graduação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Sérgio Marcos de Moraes Pitombo refere-se a "cumprimento expontâneo' (cf. Artigo "execução Penal", publicado na RT, 623/257-263). No livro "Penas e Medidas de Segurança no Novo Código", de miguel Reale Jr., René Ariel Dotti, Ricardo Antunes Andreucci e Sérgio Marcos de Moraes Pitombo (forense, 1987, pag.151) encontramos a expressão "adimplemento espontâneo da condenação".
Cf. Sérgio M. Moraes Pitombo, in RT, 623/259.
O art. 50 do CP não trata dessa hipótese, em mais uma evidência de que aquela regra não integra o processo de execução.
Damásio E. de Jesus anota que "no caso de o condenado solvente não efetuar o pagamento da multa, não se aplica desde logo o art. 51 do Código Penal, que determina a sua conversão em pena detentiva. Ao invés de requerer a conversão, o órgão do Ministério Público deve proceder à sua cobrança judicial, nos termos dos arts. 164 e s. da Lei de Execução Penal. Se o condenado, citado, não efetuar o seu pagamento, ou frustar a sua execução, cometendo crime de fraude à execução
(CP, art. 179), aí sim é que se operará a conversão" (Código Penal Anotado, Saraiva, 1989, pag/ 135).
Execução Penal, Atlas, 5ª ed., 1993, pag. 440.
Celso e Roberto Delmano consideram "inconciliável e incoerente" proceder-se, num mesmo tempo, à execução e à conversão" (Código Penal Comentado, Renovar, 5º ed., 1991, pg.82).
Sérgio de Oliveira Médici
MÉDICI, SÉRGIO de Oliveira. A multa: execução e conversão. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.13, p. 07, fev. 1994.
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