segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Audiência no Amapá dá nova chance a infrator agredido por populares

Para garantir o respeito aos direitos humanos e apurar supostos casos de tortura policial, a Audiência de Custódia desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determina a apresentação do preso em flagrante a um juiz no prazo de 24 horas. No entanto, essa metodologia acabou se deparando com outro fenômeno social: o justiçamento cometido pela população contra os infratores. Foi o caso da audiência inaugural no Amapá, ocorrida nesta sexta-feira (25/9), com a presença do presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski.
Os hematomas e curativos espalhados pelo corpo do jovem de 22 anos, dividiam espaço com tatuagens com os nomes do casal de filhos de três e um ano. Casado e trabalhador com carteira assinada, ele disse ter decidido roubar o celular de uma pedestre porque estava com o salário atrasado há dois meses. Afirmou não ter passagem pela polícia e que nunca teve exemplos negativos na família, e sim de amigos.
O jovem contou que logo foi cercado por populares que passavam na rua no momento do crime e que não esboçou reação ao receber pauladas, nem negou a culpa ao depor na delegacia. Ele deixou a audiência na companhia da irmã e do cunhado, com o alvará de liberdade provisória expedido sob condições de se apresentar mensalmente a um juiz, não deixar a comarca por mais de cinco dias sem comunicar, não frequentar bares, boates e lugares similares e recolher-se em casa até as 22h, salvo quando estiver em horário de trabalho.
Nova chance - O jovem também concordou em participar do Círculo Restaurativo, método de acolhimento desenvolvido pelo Ministério Público local. "É um meio de propor mudança de comportamento. No Circulo Restaurativo, as pessoas vão ajudar a resgatar o controle e a autoestima, mostrando que é possível prover o sustento sem necessidade de tomar o bem alheio", explicou a promotora Socorro Paes. A iniciativa foi elogiada pelo presidente do CNJ. "A promotora de Justiça mostrou que não é só função do Ministério Público acusar. Ela estava preocupada em recuperar o custodiado para reinseri-lo na sociedade", observou o ministro durante coletiva de imprensa.
De acordo com a presidente do Tribunal de Justiça do Amapá, Sueli Pini, o caso observado na audiência inaugural reforçou a necessidade da presença do Poder Público nas ruas e de eficiência do aparato policial e judicial. "As pessoas não podem voltar na barbárie e fazer justiça com as próprias mãos. Esse é um assunto grave, não basta que termine aqui e não levemos reflexão para nossa casa. A ideia é que consigamos debelar esse ciclo vicioso de violência" disse.
Funcionamento - Inicialmente, o projeto funcionará na estrutura da Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas de Macapá, de segunda a sexta-feira, a partir das 11 horas. A expectativa é atender cerca de oito flagrantes por dia, a maioria por crimes contra o patrimônio e tráfico de drogas. Nos fins de semana, as audiências de custódia serão realizadas durante no plantão criminal a partir das 16 horas.
O ministro Lewandowski destacou que, mesmo privilegiando o respeito ao preso e à legislação brasileira que classifica o cárcere como última alternativa, o programa Audiência de Custódia colabora para a redução da criminalidade ao tentar reintegrar o cidadão de baixa periculosidade na comunidade. O presidente adiantou os próximos projetos do CNJ voltados à pacificação do sistema prisional, como o que levará atendimento médico aos encarcerados e o Cidadania nos Presídios. "Serão mutirões carcerários reiterados e sistemáticos, com acompanhamento também do preso que passa ao regime aberto, para reinseri-lo na sociedade como um cidadão prestante", explicou.
Oiapoque - Além de Macapá, a Audiência de Custódia chegará ao extremo norte do país, na comarca de Oiapoque. “Esta primeira audiência será simbólica, um pontapé inicial para registrar que o projeto chegou a todo o Brasil”, explica o titular da Vara de Execuções Penais de Macapá e juiz auxiliar da Presidência do TJ do Amapá, João Matos. De acordo com ele, o Judiciário local está concluindo os últimos ajustes logísticos para funcionamento integral do projeto. O lançamento em Oiapoque ocorrerá na manhã deste sábado (26/9), e também terá a presença do ministro Ricardo Lewandowski.

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