sexta-feira, 18 de julho de 2008

Artigo: Desigualdade de polícia e a fiança criminal, face à pobreza do réu

O recente censo penitenciário divulgado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária veio demonstrar, na prática, aquilo que em teoria há muito se apregoa no Brasil: somente os pobres vão para a cadeia. Os números são de estarrecer para quem é adepto da igualdade de todos perante a lei. Existem 319 penitenciárias e cadeias públicas no Brasil, onde estão recolhidas 126.000 pessoas sendo que delas 40% estão no Estado de São Paulo

Existem 345 mil mandados de prisão sem cumprimento. Cada preso custa ao mês 3,5 salários mínimos (este é um ótimo argumento para os defensores da pena de morte: o custo mensal do preso) e, do total, 95% são pobres e não têm advogado (deve haver um equívoco: ninguém é processado no Brasil sem ter advogado; a ausência deve referir-se ao momento do cumprimento da pena).

Ainda desse total, 85% não têm trabalho, 76% são analfabetos, 66% são negros ou mulatos e 86% são reincidentes, o que vale dizer, quase a totalidade é composta de pessoas que já tiveram uma condenação que não serviu para nada, ou melhor: serviu para incluí-las no sistema punitivo, donde após o ingresso é quase impossível sair.

Vale a pena repetir as palavras de Michel Foucault, quando se refere à prisão no século XIX: "a partir do momento em que alguém entrava na prisão, se acionava um mecanismo que o tornava infame, e quando saía não podia fazer nada senão volta a ser delinqüente" (Sobre a prisão", em "Microfísica do poder"). Nunca a explicação sobre a reincidência foi tão atual. E das 126.000 pessoas que cumprem pena privativa de liberdade, afirma o censo, 48 por cento estão cumprindo-a indevidamente.

E, quanto aos pobres, o filósofo francês, no mesmo ensaio, afirma que as classe pobres sempre foram as vítimas da delinqüência e que os delinqüentes, por paradoxal que seja, eram recrutados entre as classes pobres. Como continua hoje. De outra parte, o uso excessivo das penas privativas de liberdade deve ser repensado, à semelhança do que tem sido feito em países civilizados, pois a prisão, conforme atualmente afirma Evandro Lins e Silva, repetindo antiga lição, "é uma incubadora cara, eficaz e prolífica para a geração e o crescimento de marginais, aperfeiçoados pelo convívio com outros marginais reincidentes".

Silvio Artur Dias da Silva.


SILVA, Silvio Artur Dias da. Desigualdade aprisionada. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.8, p. 02, set. 1993.

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