A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil manifestou-se contra a proposta de que as penas de prisão impostas sejam cumpridas a partir da condenação em segunda instância. A ideia é encampada pela Associação Nacional dos Juízes Federais (Ajufe) e pelo juiz Sergio Fernando Moro, que julga os processos decorrentes da "lava jato.
“Não podem e não devem os advogados paulistas, de antigas e heroicas lutas em favor dos direitos da pessoa humana, deixar de manifestar o seu repúdio às propostas de eliminação de garantias básicas de quem se acha acusado em juízo”, diz a nota da entidade. Para a OAB-SP, a proposta representa “um regresso civilizatório que se não compatibiliza com o regime de liberdades”.
O presidente da OAB-SP, Marcos da Costa também critica a proposta de poder o juiz decretar prisão preventiva do acusado somente com a finalidade de assegurar a devolução do dinheiro desviado. O presidente classificou a proposta de "draconiana". “A prisão por motivo econômico parece não estar adequada a um sistema digno de ser conceituado como democrático”, afirma.
A seccional da OAB também desaprova a proposta do Ministério Público Federal de aceitar provas ilícitas no processo penal. Segundo a OAB-SP, a proposta é inconstitucional: “Não pode haver em nosso Estado democrático de direito quem quer que seja, cujo voluntarismo e idiossincrasia possam se sobrepor ao comando constitucional”.
Leia a nota oficial da OAB-SP:
A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, cumprindo suas finalidades legais e estatutárias de defender a Constituição da República, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos fundamentais da pessoa humana, o aperfeiçoamento e a rápida administração da justiça, vê-se no indeclinável dever de se manifestar sobre a atual conjuntura vivida no país e sobre as inaceitáveis investidas de setores dos operadores do Direito contra inalienáveis valores positivados no corpo permanente da Charta Magna e no ordenamento jurídico ordinário.
A democrática ordem constitucional instaurada em 1988 com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, assegurou valores que têm a vocação da permanência, posto que, essenciais e indisponíveis, constituem o fundamento nuclear das liberdades de todos os cidadãos. Não são esses princípios transacionáveis ou permutáveis por soluções mágicas de supostas necessidades de ocasião, máxime quando manipuladas pelo influxo da volúvel opinião leiga.
Nessa ordem de ideias, não podem e não devem os advogados paulistas, de antigas e heróicas lutas em favor dos direitos da pessoa humana, deixar de manifestar o seu repúdio às propostas de eliminação de garantias básicas de quem se acha acusado em juízo. Por isso, aponta como manifestamente inconstitucionais as propostas de utilização de provas ilícitas no processo penal, sugestão esta feita por membros da magistratura e do ministério público, quando o artigo 5º, inciso LVI, da Carta Política garante que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Não pode haver em nosso Estado democrático de direito quem quer que seja, cujo voluntarismo e idiossincrasia possam se sobrepor ao comando constitucional.
Inassimiláveis, de outro turno, sugestões de alteração legislativa ordinária para o efeito de se desnutrir ou anular o mandamento constitucional de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, como preceitua o inciso LVII do referido artigo 5º da Lei Maior, pela equivocada concepção de que se deva fazer iniciar o cumprimento de pena imposta em sentença de primeiro grau de que caiba ou penda recurso.
Causa espécie, por igual, a draconiana proposição de poder o juiz decretar prisão preventiva do acusado somente com a finalidade de “assegurar a devolução do dinheiro desviado”, eis que o encarceramento antes de condenação definitiva é uma excepcional violência do Estado que somente se admite em circunstâncias de absoluta necessidade e para resguardar a ordem pública ou a marcha regular da atividade processual. Sobre não se assentar em fundamentos técnicos, a prisão por motivo econômico parece não estar adequada a um sistema digno de ser conceituado como democrático.
Tais propostas, entre outras igualmente inacolhíveis, representam um regresso civilizatório que se não compatibiliza com o regime de liberdades que conquistamos, a duras penas, após uma longa noite de autoritarismo e violência contra os direitos fundamentais.
Os que não participaram dessa resistência contra o regime de força de que nos despedimos definitivamente em 1988, não se sensibilizam com o alto preço que a Nação teve de pagar para a restauração da civilização no corpo normativo brasileiro.
Como em tempos idos, também agora e sempre, os advogados paulistas dizem não a esses ensaios de tirania e arbítrio.
São Paulo, 2 de abril de 2015.
Marcos da Costa
Presidente
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