terça-feira, 28 de abril de 2015

PNUD promove debate de alto nível sobre drogas e superpopulação carcerária no Brasil

Encarceramento do usuário e indistinção penal entre micro e grande traficante foram destacados pelos debatedores.

População carcerária do Brasil é a quinta maior do mundo
A SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA É UM DOS TEMAS CENTRAIS DA PROBLEMÁTICA DOS DIREITOS HUMANOS E DA JUSTIÇA NO BRASIL. FOTO: FROMBACK/CREATIVE COMMONS


27 Abril 2015


do PNUD

O tráfico de drogas tem se mostrado como fator decisivo no crescimento da população carcerária brasileira na última década. Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), do Ministério da Justiça, existem atualmente cerca de 600 mil pessoas presas no sistema penitenciário, e o crescimento dessa população é exponencial. 

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos (2,2 milhões), da China (1,7 milhão) e da Rússia (676 mil). Se contabilizadas as pessoas em prisão domiciliar, o Brasil passa a terceiro país com maior número de presos. O incremento da repressão e do encarceramento, porém, não têm apresentado os resultados desejados, o que gera a necessidade de se aprofundarem a reflexão e o reconhecimento da necessidade de novos passos.
 
O debate qualificado entre as principais instituições do poder público relacionadas ao tema, a sociedade civil e a academia, sobre a regulamentação dos critérios de distinção entre tráfico e consumo de drogas e sua relação com o tema da superlotação carcerária, motivou o PNUD a realizar o encontro Legislação sobre drogas e superlotação carcerária no país, nesta segunda-feira 27, na Casa da ONU em Brasília.

Durante um painel que antecedeu um debate participaram o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes; o secretário nacional de Políticas sobre Drogas, Vitore Maximiliano; a subprocuradora geral da República do Ministério Público Federal, Raquel Dodge; a procuradora de Justiça, Maria Teresa Uille Gomes; e o assessor sênior para Prevenção ao Crime e Justiça Criminal do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), José Manuel Martinez Morales. O representante do PNUD, Jorge Chediek, coordenou o painel e, em seguida, o debate.

“Como o juiz vai julgar se não há algo objetivo [na lei]?”, questionou Maria Teresa Gomes no início do painel. A ausência dessa objetividade leva à indistinção entre usuários e microtraficantes e, consequentemente, ao encarceramento de usuários que deveriam receber auxílio médico para recuperação. 

A inexistência de critérios objetivos na legislação brasileira para definir a quantidade de droga considerada consumo pessoal e a que constitui tráfico e comercialização dá margem a um julgamento subjetivo do sistema penal sobre quem é usuário e quem é traficante. Nesse contexto, “o direito penal está ignorando o usuário”, afirmou Raquel Dodge.

José Morales, do UNODC, afirmou que as pessoas que usam drogas não devem ser tratadas como criminosas, mas como pessoas que necessitam de ajuda. Para o especialista, a superlotação carcerária é uma violação dos direitos humanos.

“Em fevereiro, o estado de São Paulo começou a institucionalizar a audiência de custódia, e o resultado foi muito exitoso”, disse o ministro Gilmar Mendes, sugerindo que a Audiência de Custódia – que consiste na criação de uma estrutura multidisciplinar nos Tribunais de Justiça que recebem presos em flagrante - seja generalizada a nível nacional.  Assim, deverá haver uma análise sobre o cabimento e a necessidade de manutenção dessa prisão ou então a possibilidade de medidas alternativas ao cárcere.

Outra questão em pauta foi a da indistinção entre pequenos e grandes traficantes na aplicação penal. “Pessoas apreendidas com três gramas de maconha receberam do Tribunal de Justiça a mesma pena, de 3 a 7 anos, que foi dada a quem traficava uma tonelada”, declarou Dodge.

O ministro do STF concordou com a subprocuradora geral da República e afirmou: “É preciso que nós trabalhemos com os operadores do Direito para que tenhamos uma mínima uniformidade, para que não aconteça de alguém com poucos gramas e alguém com toneladas sofram a mesma pena”.
 
Maria Teresa Gomes foi na mesma direção: “O pequeno traficante, que geralmente é preso pela primeira vez, acaba tendo contato com grandes criminosos que controlam o tráfico de dentro da cadeia” . Esse contato é prejudicial para a recuperação do indivíduo e para sua reinserção na sociedade, segundo a procuradora.

Para Raquel Dodge, o Direito Penal acaba sendo muito rigoroso com o microtraficante e nem tanto assim com o grande traficante. “A pena aplicada deve ser sempre proporcional à gravidade do crime”, concluiu.

O debate que se seguiu ao painel deu oportunidade a representantes de várias entidades manifestarem suas posições, e todos foram unânimes quanto à relevância de prosseguir e aprofundar a discussão, de maneira a obter avanços na qualidade da lei no que tange ao comércio e consumo de drogas. Participantes do evento elogiaram a iniciativa e ouviram do representante residente do PNUD declaração de apoio e comprometimento com a questão para que mudanças nesse âmbito beneficiem, o quanto antes, milhares de pessoas no Brasil.

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