Laudo feito e apresentado por policiais civis nomeados pelo delegado responsável pela investigação de crime é nulo, pois compromete a imparcialidade que se exige da perícia. O argumento levou a 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a reformar parcialmente sentençacondenatória proferida na cidade de São Francisco de Paula, interior gaúcho. A perícia, portanto, deveria ter sido feita por órgão próprio — no caso, o Instituto Geral de Perícias do RS, equivalente à polícia técnico-científica do estado.
O réu, condenado por furto de uma motossera, teve a pena aumentada em função da qualificadora de rompimento de obstáculo, atestado pela sua confissão e em documento assinado por dois policiais civis nomeados pelo delegado de polícia responsável pela investigação. Por conta da nulidade do lado, o agravante foi excluído da pena, reduzida de 1 ano e 2 meses para 9 meses de prisão.
O relator da Apelação, desembargador Francesco Conti, escreveu no acórdão que não poderia aplicar ao caso o princípio da insignificância, mas acolheu o pedido de afastamento da qualificadora feito pela defesa. Segundo Conti, o exame pericial direto é indispensável nos crimes que deixam vestígios, como é o caso do furto qualificado pelo rompimento de obstáculo, para o fim de reconhecimento da materialidade qualificadora. É o que diz os artigos 158 e 167 do Código de Processo Penal, com precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
‘‘Acerca do laudo pericial, Francisco Ramos Méndez preleciona que os peritos são nomeados sob a análise de seus conhecimentos específicos, prescindindo-se de sua relação com os fatos. Por isso, deve-se optar por nomear pessoas tituladas, ou seja, com diploma de curso superior. Ademais, acrescenta que a perícia somente é digna de fé quando imparcial e independente’’, arrematou, desclassificando a conduta para furto simples. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 23 de outubro.
A denúncia
Conforme inquérito policial, o fato ocorreu em março de 2012, na cidade de São Francisco de Paula, interior gaúcho. Aproveitando-se da falta de vigilância no local, o réu quebrou dois vidros da residência e tentou furtar uma serra elétrica, avaliada em R$ 500.
O delito não se consumou porque uma testemunha presenciou tudo e chamou a polícia, que prendeu o homem em flagrante. Ele foi denunciado pelo Ministério Público estadual como incurso nas sanções do artigo 155, parágrafo 4º, inciso I (furto qualificado mediante rompimento de obstáculo), combinado com os artigos 61, inciso I (reincidência), e 14, inciso II (crime tentado), ambos do Código Penal. Quando foi preso, o réu já acumulava duas condenações com trânsito em julgado, por crimes contra o patrimônio.
A sentença
Com base nas provas anexadas aos autos, na confissão do denunciado e no relato de testemunhas, o juiz de Direito Carlos Eduardo Lima Pinto ficou convencido da autoria e da materialidade do delito. A qualificadora do rompimento de obstáculo, observou, foi comprovada, não apenas pelo auto de constatação como pela confissão do réu.
Assim, o magistrado julgou procedente a denúncia do MP. Condenou o réu à pena de dois anos de reclusão e ao pagamento de 20 dias-multa — à razão de um décimo do salário-mínimo cada dia-multa. ‘‘Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, em razão da reincidência e a existência de outras duas condenações, atestando que tal substituição se mostraria insuficiente como reprimenda’’, escreveu na sentença.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 10 de dezembro de 2013
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