segunda-feira, 2 de julho de 2012

Escola do MP promove curso sobre investigação


A Escola Nacional do Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas promove, desde segunda-feira (25/6), seu primeiro curso, em Fortaleza. As aulas vão até esta sexta-feira (29/6) e reúnem membros do Ministério Público do Ceará, todos atuantes na área criminal.
Dentre os temas abordados estão “Técnicas de Investigação”; “Interceptação telefônica, telemática e ambiental”; “Lavagem de Dinheiro e Blindagem Patrimonial”; “Inteligência como ferramenta à investigação criminal”; “Gestão de Casos – Corrupção e improbidade administrativa e o reflexo no Direito Penal”.
Arthur Pinto de Lemos Junior - 28/06/2012 [MP/SP]
Em entrevista concedida à Consultor Jurídico, o promotor de Justiça Arthur Pinto de Lemos Jr. (foto), coordenador da Escola do GNCOC, contou, por e-mail, que o curso tem como objetivo difundir o conhecimento prático no combate às organizações criminosas obtido durante os dez anos de atuação do grupo.

“Fazemos divulgação de casos reais, com detalhes. Demonstramos as forças-tarefas estabelecidas entre os diferentes órgãos do Ministério Púbico e com outros órgãos parceiros, sem abandono do debate de temas jurídicos controvertidos. Atualmente, muitos casos que são investigados em São Paulo também são encontrados em outros estados da Federação e vice-versa, o que recomenda essa difusão da informação e da técnica de investigação”, conta.
Leia abaixo a entrevista:
ConJur — Quando e como começou a escola?
Arthur Lemos Jr. — A Escola Nacional do GNCOC foi divulgada a todos integrantes dos Ministérios Públicos estaduais na oportunidade da comemoração dos dez anos do GNCOC, em Belo Horizonte. A preparação e o estudo inicial foram feitos pelo promotor de Justiça de Goiás Rodney Silva. Havia um anseio geral dos promotores de Justiça de se implementar a cultura da organização dos dados de casos reais desenvolvidos por cada MP, ou mesmo em força-tarefa, e divulgá-los num ambiente de Escola Nacional. Hoje, a criminalidade organizada, os meios de comunicação, a facilidade do transporte e outros fatores que justificam a expansão do homem e, ao mesmo tempo, do crime, exigem-nos estudos nacionais institucionais. A Escola do GNCOC demorou, mas veio para ficar.

ConJur — Quais foram os responsáveis pelo início do trabalho?
Arthur Lemos Jr. — A ideia da Escola Nacional do GNCOC foi do atual presidente, Oswaldo Trigueiro do Valle Filho, que também é procurador-geral da Paraíba. Indicado pelo presidente e integrantes do Grupo Nacional, assumi a coordenação dos trabalhos, mas toda atividade é feita em conjunto com vários colegas de diferentes estados.

ConJur — Qual o quadro de funcionários da escola? 
Arthur Lemos Jr. — A escola não conta com funcionários. Temos o apoio dos chefes dos Ministérios Públicos e do presidente do Colégio de Diretores de Escola do Ministério Público (Cedemp), além dos diretores de cada escola. Esse apoio viabiliza nosso trabalho. Merece destaque a contribuição decisiva do Conselho Nacional dos Procuradores Gerais (CNPG), tendo hoje como presidente Claudio Soares Lopes, procurador-geral do Rio de Janeiro. Cada procurador-geral de Justiça apoia o Programa Nacional da Escola Nacional do GNCOC por meio da autorização para o afastamento das funções do promotor palestrante e pagamento de seu deslocamento até ao Ministério Público beneficiário do curso. O MP é quem recebe o curso e sua correspondente Escola Superior assume o custo do evento, com sua logística e estrutura para as aulas, bem como as hospedagens dos palestrantes.

ConJur — Onde funciona a escola? 
Arthur Lemos Jr. — A Escola Nacional do GNCOC é itinerante, sem uma sede fixa. Ela se desloca até a sede do Ministério Público interessado pelo nosso PNCOC. Temos também, dentro do ambiente virtual do CEDEMP, uma plataforma Moodle, na qual estabelecemos discussões permanentes e troca de informações. Estamos, portanto, aliados com o Colégio de Diretores de Escolas do MP, o que é fundamental para uma entidade sem recurso. Cada Escola Superior dos MPs já realiza em seu estado uma forte atuação em prol do aperfeiçoamento do trabalho institucional, inclusive para o corpo de funcionários e estagiários.

ConJur — Quantos promotores e procuradores participam dos cursos anualmente? 
Arthur Lemos Jr. — Temos um corpo docente de quase 50 promotores de Justiça que integram o GNCOC, além de representantes de órgãos parceiros. O Programa Nacional do GNCOC tem dez módulos, ministrado em cinco dias, de segunda a sexta-feira.

ConJur — Quais foram os principais eventos?
Arthur Lemos Jr. — O primeiro curso está sendo realizado nesta semana no Ministério Público do Ceará, com apoio da Escola Superior do MPCE e da Associação Cearense do Ministério Público. Temos 70 promotores de Justiça inscritos. Por meio do PNCOC, fazemos uma aproximação do GNCOC com promotores de Justiça criminais, e não são poucos, que anseiam por oportunidade de realizar um trabalho mais investigativo, seja contribuindo com o trabalho da Polícia Judiciária, seja assumindo a sua investigação criminal naqueles casos que nunca chegam ao gabinete do promotor de Justiça. Os dois primeiros dias foram altamente produtivos. As aulas iniciam-se às 8h da manhã, com intervalo de uma hora para o almoço, e terminam às 18h30.

ConJur — Quais são os objetivos?
Arthur Lemos Jr. — Nosso objetivo é difundir a experiência dos Gaecos e dos seus bons resultados. Fazemos divulgação de casos reais, com detalhes. Demonstramos as forças-tarefas estabelecidas entre os diferentes órgãos do Ministério Púbico e com outros órgãos parceiros, sem abandono do debate de temas jurídicos controvertidos. Atualmente, muitos casos que são investigados em São Paulo também são encontrados em outros estados da Federação e vice-versa, o que recomenda essa difusão da informação e da técnica de investigação. Os crimes de lavagem de dinheiro, fraude à licitação, formação de cartel, tráfico de drogas, dentre tantos outros, ultrapassam os limites territoriais de um único estado, e avançam para localidades diferentes muito rapidamente, o que, aliás, é fator de dificuldade na investigação criminal.

ConJur — Quais são os resultados?
Arthur Lemos Jr. — Estamos no começo do nosso trabalho e no nosso primeiro PNCOC. Temos a satisfação desde já de colher bons resultados. Os promotores criminais e da defesa do patrimônio público do MP-CE estão determinados a cobrar maior e melhor estrutura para o desenvolvimento de seus trabalhos. O promotor de Justiça que participa do PNCOC apreende a experiência do integrante do GNCOC e passa copiar e aprimorar o que já deu certo. Há também a difusão do melhor modelo organizacional para o combate ao crime organizado, a utilização de assessores contábeis, assessores jurídicos e diversas ferramentas que auxiliam no trabalho de inteligência e gestão da informação. O colega sai do curso renovado, animado com as novas ideias, sobretudo ciente de que outros promotores de Justiça procuram, discreta e seriamente, alcançar os verdadeiros agentes criminosos, os quais geralmente não aparecem na cena do crime e, por vezes, sequer são conhecidos dos executores materiais. Evidentemente, refiro-me à criminalidade organizada, especialmente a econômica, dominada por criminosos de colarinho branco, influentes no contexto sócio-econômico.

ConJur — Que melhorias a escola vê que precisam ser feitas no trabalho do MP?
Arthur Lemos Jr. — O MP precisa ter consolidado seu poder investigatório, o que é reconhecido no mundo inteiro. Precisamos ainda ter o amparo legal para obter informações cadastrais de órgãos públicos e privados, como empresas de telefonia e bancos. Isso agiliza a formação de nossa convicção e nos permite exercer a propositura da investigação criminal com maior eficiência. Queremos, ainda, estar ao lado das Polícias Judiciárias e aprimorar e fortalecer o seu trabalho. Temos o domínio do que precisa ser investigado e, a Polícia Judiciária, o domínio do como ser investigado. Esses dois dons precisam estar bem afinados. Quando isso acontece e ocorre o entrosamento com outros órgãos, a prova colhida, invariavelmente, torna-se indestrutível. Todo esse trabalho integrado tem sido somado com a atuação da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, na medida em que a corrupção é prioridade em nosso mister.

ConJur — A escola ministra algum curso sobre relação com a imprensa?
Arthur Lemos Jr. — Ainda não temos esse tema como pauta, mas é uma sugestão interessante a médio prazo. A atuação dos GAECOs é profissional. Nosso compromisso é com a Justiça, com a sociedade e a busca da verdade. Com esse espírito, as divulgações dos trabalhos são feitas em momentos conclusivos da investigação criminal, como forma de dar conhecimento público e prestar contas do nosso dever institucional. A divulgação propicia o conhecimento de novos fatos. Não raro, somos procurados por pessoas que querem depor ou narrar novas situações.

ConJur — Algumas operações célebres da Polícia Federal caíram nos tribunais superiores por falhas na investigação e nos apontamentos das denúncias. O MP tem aprendido com essas decisões? No que a escola pode ajudar?
Arthur Lemos Jr. — Claro que sim. E discutimos amplamente tais casos para aprendermos com os erros. Hoje, o promotor de Justiça trabalha com humildade e profissionalismo; evoluímos todos os dias. Temos grande respeito pelo Judiciário brasileiro. Esperamos, no entanto, que a Justiça estadual também se especialize para receber melhor os processos crimes nos quais figuram como réus os casos correspondentes à criminalidade organizada. Um processo desses costuma ter vários volumes e anexos, como quebras de sigilo fiscal e bancário. O cartório Judicial da Vara Criminal, não especializado, não tem funcionários suficientes para viabilizar o cumprimento das medidas administrativas e, tampouco, especialização para atender essa demanda. A Justiça Federal especializou-se com varas exclusivas para crimes financeiros, o que melhorou o trâmite dos processos. O caso Banestado, em Curitiba, é um excelente exemplo.

ConJur — Quais são os principais desafios?
Arthur Lemos Jr. — O grande desafio é enfrentar a criminalidade organizada, em seus diversos aspectos. É quebrar o paradigma de termos os acusados menos favorecidos como alvos dos processos crimes. Temos que colocar a Justiça Penal para trabalhar nos casos de corrupção e inverter o grande índice de cifra negra que permeia entre nós. Ainda, aprimorar a integração entre os MPs e outros órgãos públicos, especialmente as Policias Judiciárias.

ConJur — Quais são os planos para o futuro?
Arthur Lemos Jr. — Temos cursos presenciais agendados até o final do ano e muita discussão em ambiente virtual. Pretendemos atingir aos poucos as Escolas da Magistratura para que essa atualização também seja feita pelos Juízes. Vamos ampliar a difusão do conhecimento adquirido pelos integrantes do GNCOC e mostrar para o promotor de Justiça Francisco José Lins do Rego, assassinado há dez anos durante o exercício de sua função, que seu exemplo valeu e vale a pena.
Alessandro Cristo é editor da revista Consultor Jurídico
Revista Consultor Jurídico, 29 de junho de 2012

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