domingo, 22 de junho de 2008

Artigo: Basta-lhes a desgraça...

Lá pelos corredores das Varas Criminais de Curitiba, tarde destas, observamos, alertados pela doutora Arlete Ana Belniaki, uma terrível injustiça que o sistema comete contra os pais de pessoas que se envolvem em processos criminais. Há uma praxe forense de publicação de editais onde, ao se descrever ou qualificar a pessoa condenada, após o nome e a profissão, declina-se a filiação, evidenciando-se, em letras garrafais, os nomes do pai e da mãe para que todos possam ver. O mesmo se constata nas narrativas das denúncias criminais.

Reputamos da maior gravidade, pois agride princípios basilares. A Constituição Federal em seu artigo 5.º, incisos X e XLV, preceitua: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas...” ou “...Nenhuma pena passará da pessoa do condenado...”.

Partindo-se da premissa de que os pais dos acusados ou condenados, nenhum crime praticaram, publicar seus nomes em editais, ou mesmo em denúncias criminais, traduz injusto e ilegal constrangimento. Não justifica a ultrapassada prática a desculpa da qualificação do réu em uma época de bancos de dados governamentais cada vez mais completos (título eleitoral, cédula de identidade, etc.).

A notícia do erro do filho, seu envolvimento com a justiça, conseqüente repercussão na sociedade, o “indagar” da mídia e dos nem sempre “amigos da família”, o martírio de acompanhar o processo criminal e o anúncio da sentença, representam incomensurável sofrimento para os pais.

O artigo 226 da mesma Constituição enuncia: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Não se concebendo família sem pai ou mãe (ainda que mortos dever-se-ia respeitar suas memórias) supomos que esta “especial proteção” exclui essa reprovável e inócua prática.

Quase dois mil anos após a leitura da sentença que mencionou o nome dos pais José e Maria, após terem eles acompanhado o suplício do calvário de seu filho, julgado e condenado a pena de morte por crucificação, segundo as leis da época, parece que continuamos a não poupar os pais de inocentes ou culpados...

Observamos, decepcionados, entre incontáveis exemplos, que a sociedade parece até ter esquecido o nome de uma das pessoas, acusadas de envolvimento na morte do índio Pataxó em Brasília, sem contudo esquecer sua filiação...

Reflitamos, pais de acusados padecem com processos contra filhos. Quem teria sofrido mais naquela cruz que relata a bíblia, o apenado ou seus pais? É momento de modificação dessa sistemática insensível, inconstitucional e medievalesca de execração pública dos pais dos acusados. Basta-lhes a desgraça...


Por Elias Mattar Assad é presidente da Abrac - Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas. abrac@abrac.adv.br


O Estado do Paraná, Direito e Justiça.

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