domingo, 22 de fevereiro de 2009

Morosidade: juízes criticam reformas no processo penal

A reforma no processo penal brasileiro mal entrou em vigor e já é alvo de duras críticas por parte dos operadores do Direito sul-mato-grossenses. As alterações trazidas pelas Leis 11.719 de 20 de Junho e 11.690 de 9 de junho, ambas de 2008, não agradam os magistrados das Varas Criminais de Campo Grande que apontam como consequências imediatas a demora na instrução e a morosidade.

As reformas aprovadas no intuito de trazer agilidade aos processos em trâmite na justiça são um contrassenso e já chegam a causar um retrocesso de mais de 37% nas audiências realizadas na vigência das novas leis.

“Um prejuízo sem precedentes na história”, essa é a avaliação do juiz da 3ª Vara Criminal Residual, Ivo Salgado da Rocha, ao explicar a determinação de interrogar o réu, por último, na audiência de instrução e julgamento. Antes da oitiva do réu, o juiz deve ouvir a vítima, as testemunhas de acusação e defesa.

O procedimento antigo era facilitado porque o réu, ao ser ouvido primeiro, confessava o crime e agilizava o tempo da instrução, tornando necessária a oitiva de mais umas poucas testemunhas para ter a confirmação do crime. Com as novas regras faz-se necessário ouvir todas as testemunhas arroladas e, no final, chegam no mesmo resultado, que na maioria dos casos é a confissão do acusado.

Adotando a mesma postura de crítica às mudanças, o juiz José Paulo Cinotti, da 1ª Vara Criminal Residual, que antigamente marcava 25 pessoas para depoimentos por dia e hoje marca apenas 15, aponta uma sensível redução na produtividade. Para ele, o processo vai acumular nas prateleiras por causa da demora nas instruções.

Cinotti realiza umas três audiências de instrução por dia, ao passo que no mesmo período, pelas regras anteriores realizava oito. Para o juiz, há maior trabalho com o mesmo denominador. “A instrução era abreviada”, afirma o magistrado ao defender as regras anteriores.

Ele salienta ainda que o depoimento de uma testemunha insegura leva o réu, por defesa natural, a negar os fatos dos quais é acusado alongando ainda mais o processo para chegar à verdade dos acontecimentos.

O juiz, já experiente na justiça criminal, afirma que quando o início do inquérito ocorre por prisão em flagrante, a confissão ocorre em cerca de 80% dos casos, percentual que não se repete nos inquéritos iniciados por portaria, quando a maioria nega a participação nos delitos.

Outra alteração com a reforma processual penal prevê a comunicação da vítima dos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos. Se por um lado essas comunicações estimulam o exercício de uma maior fiscalização da sociedade aos poderes públicos envolvidos na persecução penal, com nítida finalidade de proteção dos interesses da vítima, a inovação não pensou na estrutura dos órgãos da justiça, responsáveis diretos por essa comunicação. Na opinião de Ivo Salgado da Rocha, a regra não tem sentido, visto que não há aparato de pessoal para o cumprimento da determinação e por isso ainda não está fazendo as comunicações.

Mas já imaginou receber uma carta do juiz dizendo que o autor do crime está saindo da cadeia? Salgado da Rocha avalia como desnecessária tal norma porque o acusado não vai atrás da vítima depois que cumpre pena, de modo a causar um temor descabido e um constrangimento ao ofendido.

Segundo a nova legislação, tais comunicações deverão ser feitas no endereço da vítima, no entanto admitem o uso de e-mail.

Nesse ponto, a intenção do legislador foi voltar os olhos à vítima, na contramão das legislações atuais, que incontestavelmente levavam em consideração o infrator. Cinotti já está cumprindo a determinação da intimação por carta.


TJMS.

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