Com o aperfeiçoamento dos sistemas de coleta de dados de todas as instâncias do Poder Judiciário, determinado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tem sido possível identificar os principais gargalos das instituições jurídicas e judiciais do País. Anunciada no último encontro de presidentes de tribunais - que discutiram o planejamento estratégico da Justiça e estabeleceram as metas de produtividade dos próximos cinco anos -, a pesquisa mais recente produziu uma radiografia minuciosa do superlotado sistema prisional.
A pesquisa foi realizada a partir de informações obtidas junto às varas de execução criminal e às autoridades carcerárias. Além de registrar um déficit de 156 mil vagas nos estabelecimentos penais, o levantamento do CNJ mostrou que, dos 446.687 homens e mulheres que hoje estão presos, 254.738 já foram condenados e 191.949 são presos provisórios. Entre estes estão os que já cumpriram pena, que continuam trancafiados indevidamente, e os que estão à espera de julgamento, que não tem data para ser realizado por causa do congestionamento da Justiça Criminal.
A situação mais grave está no Nordeste, especialmente nas unidades prisionais de Alagoas, Maranhão, Piauí e Sergipe, onde o número de presos provisórios está entre 65,7% e 77,1% da população carcerária. Como não têm dinheiro para contratar advogados particulares e os serviços de assistência jurídica gratuita estão sobrecarregados, os presos provisórios não têm condições de pedir habeas-corpus ou de impetrar recursos que lhes permitam ganhar liberdade.
Assim, diz o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Ferreira Mendes, os presos provisórios acabam sendo abandonados à própria sorte, uma vez que juízes criminais, promotores de Justiça, defensores públicos e advogados dativos tendem a imputar o problema "ao governo", eximindo-se de suas respectivas responsabilidades. Com isso, "o réu pobre acaba não sendo problema de ninguém", afirma Mendes.
O levantamento do CNJ sobre a situação prisional exibe dois importantes problemas. Um é que muitas pessoas que se encontram em condições degradantes nos estabelecimentos penais poderiam estar vivendo com suas famílias. Além de não terem assistência jurídica, educação e capacitação profissional, os presos provisórios não são separados dos presos condenados. Esse convívio promíscuo entre réus primários e presos de alta periculosidade converte as prisões em verdadeiras escolas do crime.
O outro problema é de ordem gerencial e financeira. Com o aumento da violência e da criminalidade, o número de presos condenados cresceu e os governos estaduais e a União deveriam construir novas penitenciárias para poder abrigá-los. Evidentemente, isso exige investimentos vultosos e eleva as despesas de custeio do sistema prisional.
Somente em São Paulo, onde a população carcerária passou de 67 mil para 153 mil presos, entre 1998 e 2008, a Secretaria da Administração Penitenciária deve inaugurar 45 novas unidades prisionais até 2010, com um total de 34,5 mil vagas. Em todo o País, segundo o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), o déficit de vagas nas penitenciárias passou de 97 mil, em 2000, para 156 mil, em 2008. O CNJ estima que a população excedente de presos corresponde à metade da população de Petrópolis (RJ), o 78º município mais populoso do País.
Para tentar aliviar a superlotação o CNJ tem advertido os juízes contra a proliferação das ordens de prisão temporária e preventiva, estimulando-os a promover mutirões para conceder liberdade a quem já cumpriu pena e aos réus primários que aguardam julgamento. O órgão também vem programando seminários com corregedores, juízes, promotores, defensores públicos e representantes do Executivo, com o objetivo de estimulá-los a desenvolver programas em conjunto. São iniciativas importantes, não há dúvida, que precisam ser complementadas com uma urgente modernização da anacrônica legislação processual penal, que está em flagrante descompasso com a realidade social e econômica.
Estadão. Opinião.
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