quinta-feira, 27 de março de 2008

Curso ensina a prevenir tortura nas prisões

Oficina dada pelo governo e por uma entidade internacional a ONGs aborda legislação e técnicas para fazer visitas surpresas nos presídios

Um curso sobre técnicas de prevenção e combate à tortura, dado pelo governo federal e por uma entidade internacional com 30 anos de atuação na área, já formou cerca de 80 representantes de organizações não-governamentais, promotores e defensores públicos brasileiros, e prevê formar mais 80 até 2009. O conteúdo inclui legislação e técnicas de visitas surpresas a presídios.

Ao todo, a APT (Associação para Prevenção da Tortura), com sede na Suíça, planeja ministrar quatro oficinas no país, abrangendo diferentes regiões. Em 2006, houve capacitação em Brasília. Esta semana, em Salvador. As próximas devem ocorrer no Sudeste e no Norte.

“Estamos ensinando técnicas para prevenção, como fazer visitas constantemente, para garantir que a tortura não vai continuar ocorrendo”, afirma a consultora da APT no Brasil, Sylvia Dias. Fazem parte do programa dinâmicas de grupo, apresentações de casos concretos e demonstrações de como usar métodos em inspeções às unidades prisionais.

As instruções incluem planejamento prévio das visitas, verificação de todas as celas, monitoramento freqüente dos presídios em que já houve denúncias de maus-tratos, e divulgação dos casos de tortura junto aos meios de comunicação e a órgãos como a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e a Secretaria Especial de Direitos Humanos. “Discutimos como devem ser as entrevistas com os detentos, os agentes penitenciários e até com os diretores de presídios”, afirma Sylvia. As visitas, salienta, não devem ser realizadas apenas após as denúncias de tortura já terem sido feitas.

O público-alvo da oficina são principalmente organizações de defesa aos direitos humanos, como a Pastoral Carcerária, mas órgãos públicos de investigação também participam. No curso desta semana, em Salvador, duas promotoras e dois defensores públicos acompanharam as atividades. Em Brasília, um juiz participou da capacitação. As pessoas formadas nas oficinas são consideradas “multiplicadoras”, porque levam a experiência para suas organizações na forma de seminários e palestras.

“Queremos tornar as visitas mais profissionais, porque muitas vezes elas são feitas sem um foco claro”, diz Sylvia. “Às vezes encontramos relatórios que mostram dezenas de problemas nos presídios, como a má qualidade da comida e a falta de higiene, com pouca ênfase nas suspeitas de tortura. Os visitantes têm que ir mais a fundo nesses relatos”, diz.

A presidente do Conselho dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo, Rose Nogueira, afirma que é comum organizações menos conhecidas encontrarem dificuldades em entrar nos presídios para fazer visitas. “Geralmente quem dificulta o trabalho são os agentes penitenciários e os próprios policiais, que não querem expor o que há lá dentro”. O Conselho, segundo ela, é um dos únicos órgãos em São Paulo que conseguem visitar qualquer unidade prisional.

Nesta sexta-feira, último dia da capacitação em Salvador, a Associação para Prevenção da Tortura assinou um acordo de cooperação com o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos. A meta é realizar as novas oficinas e fornecer apoio técnico na execução do Plano de Ações para Prevenção e Combate à Tortura do governo federal.

Pelo menos 19 Estados brasileiros assinaram o plano, inclusive os nove do Nordeste. Diversas organizações da ONU, como o PNUD e a UNODC (Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime), apóiam a iniciativa.

Outro passo importante dado pelo Brasil nessa área foi a aprovação pelo Congresso Nacional, em dezembro de 2006, do Protocolo Facultativo à Convenção da ONU Contra a Tortura. O documento prevê mecanismos para dar transparência aos presídios. “Em breve não poderão mais existir celas isoladas e penitenciárias que não aceitam visitas de entidades que lutam pelos direitos humanos”, afirma Sylvia.

O protocolo prevê ainda a criação de um mecanismo nacional de combate à tortura, que pode vir a ser um órgão público para fiscalização dos presídios. “Ainda não há consenso com relação ao modelo do mecanismo, porque ele tem que ser independente do governo federal”, diz Sylvia.


Fonte: PNUD


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