quinta-feira, 2 de abril de 2009

Lei de Imprensa: dois ministros votam pela revogação, mas STF adia decisão

BRASÍLIA - A decisão sobre a revogação da Lei de Imprensa ficou para daqui a duas semanas. No julgamento realizado na tarde desta quarta-feira no Supremo Tribunal Federal (STF), votaram apenas os ministros Carlos Ayres Britto, relator do caso, e Eros Grau. Ambos votaram pela extinção completa da lei, herança da ditadura militar. Os outros nove ministros ainda precisam votar.

O argumento da ação, movida pelo deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) é de que a legislação impõe sanções muito severas e, por isso, é usada como instrumento contra a liberdade de expressão nos meios de comunicação. Ano passado, o tribunal suspendeu 20 dos 77 artigos da lei . Desde então, juízes de todo o país têm usado os códigos Civil e Penal para punir excessos cometidos por jornalistas. ( Os artigos da Lei de Imprensa que foram suspensos ano passado)

Durante o julgamento desta quarta, Ayres Britto argumentou que a Constituição já tem meios de defender as pessoas que sejam eventualmente atingidas por crimes cometidos pela imprensa.

- Se nenhuma lei pode ir além do que foi constitucionalmente aplicado livre e pleno, como ir além do livre e pleno? Que serventia tem a Lei de Imprensa se a Constituição hoje alcança o ponto máximo de proteção? Como ultrapassar o plenamente livre? Impossível. Só teria como serventia restringir, inibir, constranger, reduzir o espaço de movimentação - afirmou o relator.

- Quando a colisão entre a lei menor e a Constituição se dá em quase toda a cadeia redacional, o que se toma corpo não é a autonomia material. O que se tem é a realidade marcada por diplomas normativos ferozmente antagônicos e contrários em suas linhas e entrelinhas - completou.

Como a intenção do presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, era retomar o julgamento na quinta-feira, o ministro Eros Grau, dizendo que não poderia estar presente, antecipou o seu voto defendendo a revogação completa da lei.

Em seguida, o ministro Marco Aurélio argumentou que deveria ser mantida a pauta já agendada para a quinta-feira. Como na próxima quarta-feira não haverá sessão por causa da Semana Santa, ficou acertado que o julgamento será retomado no dia 15 de abril.

Mais cedo, ao defender a revogação da lei, Miro Teixeira disse que a liberdade de expressão "não é um direito do acionista do jornal, mas um direito do povo brasileiro". Ele defende que jornalistas não sejam condenados por manifestar opiniões sobre o exercício da atividade pública de autoridades, mas apenas se forem publicados comentários sobre a vida privada das autoridades. Ele argumentou ainda que autoridades que ocupam cargos públicos, muitas vezes não suportam ser fiscalizados pela imprensa.

- Para exercer vigorosamente, sem temores, o poder em nome do povo nossos políticos e nossas autoridades têm expressivas proteções legais. Todos os servidores do país gozam de imunidade, ou de foro especial - disse Miro, que acredita que uma autoridade não tem o direito de reclamar de críticas divulgadas por meios de comunicação.

- Esse não é um direito do jornalista, um direito de jornal, é um direito do povo. Alguém tem que fiscalizar. Existem os órgãos públicos que o fazem, nem sempre com muita eficiência. A imprensa são os olhos do povo. Requeiro que desapareça a possibilidade de pena a jornalista ou responsável pela publicação sempre que houver causalidade com o direito do povo e que nós possamos ter um país em que o povo possa controlar o estado e não que o estado possa controlar o povo, como temos hoje.

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e os sindicatos compartilham da mesma opinião. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) considera a Lei de Imprensa atual uma forma de podar os meios de comunicação, mas defende que haja punições contra excessos.

Logo depois da defesa de Miro Teixeira, foram feitas as considerações dos advogados Juliana Vieira dos Santos, da ONG Artigo 19 Brasil, e Thiago do Amaral, que representa a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que também defenderam a revogação completa da lei. Já o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, sustentou que seria melhor revogar apenas os 20 artigos já revogados pela liminar do relator.

- Uma democracia amadurecida apresenta padrões elevados de livre fluxo de informações e de proteção à intimidade das pessoas, como corolário da dignidade da pessoa humana - afirmou o procurador.

Gilmar Mendes defende regras para direito de resposta

Gilmar Mendes disse que a revogação total da Lei de Imprensa vai provocar um vácuo sobre alguns temas da legislação. Embora não tenha votado, Gilmar Mendes disse, ao fim da sessão, que é preciso haver legislação para assegurar, por exemplo, o direito de resposta.

- Não subscrevo esse entendimento de que não há lei. Não se pode entregar a qualquer juiz ou tribunal a construção do que é direito de resposta. O mundo não se faz apenas de liberdade de imprensa, ele se faz também de liberdade da pessoa humana - disse Gilmar.

Após a sessão, perguntado sobre o assunto, Ayres Britto explicou que, se o STF concordar em derrubar toda a Lei de Imprensa, o Congresso Nacional de fato poderá legislar sobre pontos específicos - como o direito de resposta e ações com pedidos de indenização.

Diploma de jornalista na pauta do STF

A Corte ainda vai decidir nos próximos dias se jornalistas sem diploma específico da área podem exercer a profissão. Não há consenso, no entanto, sobre o tema. Quatro dos 11 ministros já declararam simpatia pelo jornalismo sem diploma, em julgamento realizado em 2006 . Outros, porém, dizem em caráter reservado que a falta de formação específica preocupa. O ministro Gilmar Mendes é o relator do recurso.


O Globo.

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