A questão da manutenção ou não da denominada prisão especial no ordenamento jurídico brasileiro recebeu peculiar atenção nas últimas semanas, eis que, em 1º de abril de 2009, o plenário do Senado aprovou projeto de lei - nº 111/08 - pela cessação deste benefício.
De acordo com o mencionado projeto, o artigo 295 do Código de Processo Penal receberia nova redação, passando a viger com o seguinte texto:
“Art. 295. É proibida a concessão de prisão especial, salvo a destinada à preservação da vida e da incolumidade física e psíquica do preso, assim reconhecida por decisão fundamentada da autoridade judicial ou, no caso de prisão em flagrante ou cumprimento de mandado de prisão, da autoridade policial encarregada do cumprimento da medida” [1].
Além da custódia especial, o projeto abordou matérias modificativas do Código de Processo Penal como: prisão processual, fiança, liberdade provisória e o aumento de 70 (setenta) para 80 (oitenta) anos de idade para que um indivíduo possa cumprir pena em prisão domiciliar.
No mês anterior, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – CCJ –, analisando o mencionado projeto, definira, de modo mais amplo, que ainda gozariam da prisão especial ministros de Estado, governadores, senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos, vereadores, membros das Forças Armadas, juízes, delegados, membros do Ministério Público, da Defensoria Pública, membros dos tribunais de Contas e pessoas que já colaboraram com o Estado na função de jurado[2].
Com a votação do Senado, o projeto nº 111/08 segue para a apreciação da Câmara dos Deputados, sendo agora o critério reitor para gozar de prisão especial não mais o nível de escolaridade ou a função exercida pelo indivíduo, mas ficará ao arbítrio do magistrado se, porventura, reconhecer estarem presentes riscos à integridade do custodiado. Na hipótese de prisão em flagrante, a deliberação caberá à autoridade policial.
Provando ser o tema prisão especial assunto em voga, em 08 de abril de 2009, outro projeto de lei, com nº 50/07, foi aprovado pela Comissão de Constitução, Justiça e Cidadania. De autoria do Senador Expedito Júnior (PR- RO), o projeto extingue o instituto para diplomados em nível superior tanto previsto no Código de Processo Penal como no Código de Processo Penal Militar[3].
Explica DEMÓSTENES TORRES (DEM-GO) que como o projeto de lei nº 111/08 ainda está em tramitação na Câmara dos Deputados, não havia óbices para a aprovação do PLS nº 50/07 pela CCJ[4].
Uma questão que sempre se impõe ao discutir a razoabilidade de tal prisão é se devemos considerá-la apenas como um benefício devido ou se consiste em uma regalia para poucos e, portanto, violadora do princípio da igualdade.
Em verdade, a denominação dada a este tipo de prisão acaba criando uma falsa percepção da realidade. O fato de estar o custodiado em cela especial de modo algum deve - pelo menos não deveria - significar que este será tratado como sujeito especial, com mordomias e luxos. Ao revés, este terá o mesmo tratamento dos presos comuns, com direitos e obrigações idênticos.
Poderíamos considerar favoritismo se o Estado conferisse condições seguras e igualitárias a todos encarcerados e, mesmo assim, reservasse uma cela especial a determinados indivíduos por suas qualidades, o que certamente não é o caso.
A separação promovida pelo legislador retrata em verdade uma realidade penitenciária vexatória. Como bem assevera para o PORTAL IBCCRIM o Professor Alamiro Velludo Salvador Netto, da Faculdade de Direito da USP: “O estado, ao assegurar um tratamento diferenciado, admite sua própria falência em não conseguir fornecer condições razoáveis e seguras a todos custodiados”.
O Presidente da Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Luiz Flávio Borges D’Urso, criticou o aprovação pelo Senado do projeto de lei que extingue a prisão especial para quem tem curso superior. Segundo disse[5]: “Os presos hoje, no Brasil, são tratados sem a mínima dignidade, sujeitos à superlotação e condições insalubres na grande maioria das unidades prisionais. Com o fim da prisão especial, vamos condenar todos a viver nessas condições sub-humanas. A prisão especial no Brasil não quer dizer privilégios, como muitos pensam, mas assegura condições mínimas para se preservar o preso”. Ainda, assevera que: “Antes de discutir a concessão do benefício, o Estado deveria se preocupar em garantir uma prisão digna a todos os encarcerados do país, vale dizer, a prisão especial deveria ser para todos”[6].
A questão intrigante é, uma vez convertido o projeto em lei, como deverão atuar o magistrado ou a autoridade policial, já que serão os responsáveis pela concessão ou não de prisão especial: Deverão conceder a cela especial apenas se estiver concretamente evidenciado o risco de vida do indivíduo e, não estando, deixar o sujeito com os demais presos e aguardar que nada ocorra? Deverão ser mais zelosos e prudentes e autorizar a prisão especial ainda que haja poucos índicios de perigo?
Ora, por vezes, a separação entre os presos é imperiosa para evitar um mal maior, como, por exemplo, comprometer a integridade do preso e não há dúvidas que algumas pessoas, por suas funções, estão mais vulneráveis do que as demais.
Segundo TALES CASTELO BRANCO: “Cortem, se quiserem, o privilégio, extirpem a antipatia da regalia, mas, a nenhum título, consagre-se a ingenuidade de, em nome da eqüidade, colocar o bandido ao lado do policial, advogado da acusação ao lado de seu antigo adversário etc”[7].
REGINA CIRINO ALVES FERREIRA
Advogada criminalista em São Paulo. Coordenadora-adjunta do Departamento de Internet do IBCCRIM.
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