1. Introdução
A Lei 9.099 de 26.09.95 instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e em suas disposições finais tratou do instituto da suspensão do processo e transformou as infrações de lesão corporal leve e culposa em crimes de ação penal pública condicionados à representação.
Examinaremos, de forma sucinta, as inovações trazidas pela Lei 9.099/95 no que tange às Justiças Militar e Eleitoral.
2. Juizados Especiais Criminais
Constitui a Lei 9.099/95, na parte relativa aos Juizados Especiais Criminais, um diploma legal de direito processual penal comum, portanto aplicável à Justiça Comum. Deste modo, está afastada a sua incidência sobre a Justiças Especiais, assim compreendidas a Justiça Eleitoral e a Justiça Militar. Com relação à Justiça do Trabalho, por não tratar de matéria criminal, já estaria antemão excluída.
Retira-se tal interpretação de diversos dispositivos da lei, os quais determinam o encaminhamento das peças ao Juízo Comum, verbi gratia, artigos 66, parágrafo único, 77, § 2º e § 3º. Corroborando, ainda, este entendimento dispõe o artigo 1º da lei:
"Art. 1º - Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência" (grifo nosso).
Como se depreende da leitura próprio texto legal, os Juizados Especiais Criminais são órgãos da Justiça Ordinária, não estando dentro de sua abrangência as Justiças Eleitoral e Militar.
3. Exigência de Representação
Estabeleceu a Lei 9.099/95, no seu artigo 88, que os crimes de lesões corporais leve e culposas passam a ser de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal.
O crime de lesão corporal está previsto no Código Penal Militar no art. 209 e a sua modalidade culposa no art. 210. Indaga-se: é aplicável o art. 88 da Lei 9.099? Ou seja, a ação penal nestes crimes está condicionada à representação da vítima ou de seu representante legal?
Entendemos que não. A ação penal, nos delitos da competência da Justiça Militar, é pública incondicionada, ressalvados os casos dos crimes militares contra a segurança do país, que dependem de requisição. O instituto da representação que se conhece do Direito Processual Penal Comum inexiste na Justiça Castrense, aqui a representação nada mais é do que a notícia do crime. Tais conclusões se deprendem da leitura dos arts. 29, 31 e 33 do Código de Processo Penal Militar:
"Art. 29. A ação penal é pública e somente pode ser promovida por denúncia do Ministério Público Militar."
"Art. 31. Nos crimes previstos nos arts. 136 a 141 do Código Penal Militar, a ação penal, quando o agente for militar ou assemelhado, depende de requisição, que será feita ao Procurador-Geral da Justiça Militar, pelo Ministério a que o agente estiver subordinado; no caso do art. 141 do mesmo Código, quando o agente for civil e não houver co-autor militar, a requisição será do Ministério da Justiça."
"Art. 33. Qualquer pessoa, no exercício do direito de representação, poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, dando-lhe informações sobre o fato que constitua crime militar e sua autoria, e indicando-lhe os elementos de convicção" (grifo nosso).
Daí, porque sustentamos ser o disposto no art. 88 da Lei 9.099 inconciliável com o Direito Processual Penal Militar, e portanto sem aplicação à Justiça Castrense.
Diferentemente, ocorre na Justiça Eleitoral. Lá não há um tipo penal próprio, no qual o bem jurídico tutelado seja a integridade física. Destarte, esta Justiça só será competente para o julgamento da infração prevista no art. 129, caput e § 6º do CP, quando ocorrer conexão com um crime eleitoral.
O instituto da representação neste caso, existe tal qual na Justiça Comum, por forças dos arts. 287 e 364 do Código Eleitoral:
"Art. 287. Aplicam-se aos fatos incriminados nesta Lei as regras gerais do Código Penal."
"Art. 364. No processo e julgamento dos crimes eleitorais e dos comuns que lhe forem conexos, assim como nos recursos e na execução, que lhes digam respeito, aplicar-se-á, como lei subsidiária, o Código de Processo Penal."
Assim, tem inteira aplicação o art. 88 da Lei 9.099, e conseqüentemente a lesão leve e culposa será de ação penal pública condicionada à representação, quando for julgada perante a Justiça Eleitoral.
4. Suspensão do Processo
A suspensão do processo é uma inovação trazida pela Lei 9.099/95. Consiste na paralisação do feito, por proposta do Ministério Público, num período que pode variar entre dois e quatro anos. O instituto da suspensão do processo não se confunde com os Juizados Especiais Criminais, embora ambos estejam disciplinados no Lei 9.099.
Observa-se que o Juizado é competente para julgar infrações cuja pena máxima abstratamente cominada seja igual ou inferior a um ano. Já a suspensão pode ocorrer quando a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano. Daí se conclui, que todas as infrações consideradas de menor potencial ofensivo, e portanto da competência do Juizado Especial estão no âmbito de abrangência da suspensão condicional do processo.
A suspensão condicional do processo poderá ser aplicada tanto na Justiça Militar como na Eleitoral, não se aplicando aqui a restrição prevista no artigo 1º da lei, uma vez que a suspensão constitui, como vimos, um instituto autônomo.
5. Conclusões
a) Os Juizados Especiais Criminais são órgãos da Justiça Ordinária, assim, está afastada sua aplicação nas Justiças Militar e Eleitoral;
b) O artigo 88 da Lei 9.099 não se aplica na Justiça Militar, todavia, tem incidência na Justiça Eleitoral;
c) A suspensão do processo poderá ser utilizada na Justiças Especiais.
Carla Rodrigues de Araujo, Promotora de Justiça, professora da Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e autora do livro Juizados Especiais Criminais
ARAUJO, Carla Rodrigues de. Lei Nº 9.099 e as Justiças Militar e Eleitoral. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.43, p. 04, jul. 1996.
Nenhum comentário:
Postar um comentário