quarta-feira, 16 de abril de 2014

Para debatedores, pesquisa sobre estupro mostra Brasil machista

Os papéis acabam invertidos e a culpa passa a ser da vítima, afirma representante do Ipea em audiência conjunta de três comissões
Andrei Soares, Nana Queiroz, senadoras Vanessa e Ana Rita, Daniel Cerqueira e Beatriz Cruz discutem resultados da pesquisa Foto: José Cruz
A recente pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre o estupro mostra que a sociedade brasileira reproduz ideal machista que torna a mulher objeto de desejo e de propriedade, permitindo que a vítima de violência seja responsabilizada pela agressão, por sua forma de se vestir ou de se portar.
Essa foi a conclusão dos participantes de debate promovido ontem pelas Comissões de Direitos Humanos (CDH) e de Assuntos Sociais (CAS) para analisar a pesquisa, divulgada no fim de março.
— Há uma inversão de papéis entre vítimas e culpados. A culpa passa a ser da vítima — disse Daniel Cerqueira, representante do Ipea.
Para Cerqueira, o erro na divulgação da pesquisa não afetou o resultado geral. O instituto informou que 65% concordavam com a afirmação de que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”, mas depois corrigiu o percentual para 26%.
As conclusões do estudo, frisou Cerqueira, evidenciam que há tolerância com a violência sexual contra mulheres.
As senadoras Ana Rita (PT-ES) e Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), que sugeriram o debate, concordaram.
— Nós carregamos uma grande dose de machismo, não apenas os homens, mas também as mulheres. Todo ser humano é fruto do ambiente em que foi criado e, apesar da legislação criminalizar a discriminação, as práticas sociais precisam ser modificadas para garantir igualdade entre homens e mulheres — disse Vanessa.
Na avaliação de Andrei Soares, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a pesquisa mostra que o estupro não é percebido como violência sexual, mas como desculpa sexual para praticar a violência.
Educação
Para a jornalista Nana Queiroz, que criou a campanha Eu Não Mereço Ser Estuprada, a mudança deve começar nas escolas, desde as séries iniciais, com orientação às crianças para que saibam identificar o abuso sexual.
— Muitas crianças e adolescentes não têm ideia de que estão sofrendo abuso e que têm o direito de denunciar. É preciso falar de estupro desde a pré-escola, em linguagem adequada — disse.
Ana Rita destacou a importância de mudar a percepção da sociedade sobre o problema.
— Precisamos fazer um trabalho preventivo e adotar políticas públicas eficientes, que sejam de fato implementadas pelo poder público — disse a senadora.
Para Beatriz Cruz, do Ministério da Justiça, o desafio do país é “desconstruir” a cultura de violência contra a mulher, que se mantém na sociedade.
— Isso é algo difícil de fazer, pois temos no Brasil a falsa percepção de que não somos um país violento, machista, racista. Nós, brasileiros, não nos enxergamos nessa ­cultura — disse.
Também o senador Waldemir Moka (PMDB-MS) se disse “horrorizado” com os resultados da pesquisa e lembrou que o tema ganhou nova dimensão com o pedido de perdão do papa Francisco às vítimas de padres pedófilos.
— Mas não basta o pedido de perdão, também é preciso punir os padres pedófilos — opinou.
Jornal do Senado

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