O americano Lester Packingham foi preso porque escreveu uma mensagem de agradecimento a Deus no Facebook. Para celebrar a anulação de uma multa de trânsito, ele escreveu: “Deus é bom! Não há custas judiciais, não há multa, nada a pagar... Louvado seja Deus! Uau! Obrigado, Jesus”. Porém, ao usar o Facebook, Packingham violou uma lei da Carolina do Norte.
Na segunda-feira (26/2), a Suprema Corte dos EUA vai fazer a primeira audiência para decidir se a lei estadual é ou não inconstitucional. A corte vai pesar a liberdade de expressão, garantida a todo cidadão pela Primeira Emenda da Constituição do país, contra a lei estadual que proíbe condenados por qualquer tipo de abuso sexual de menores de usar a mídia social.
A lei de Carolina do Norte proíbe “condenados registrados por abuso sexual de menores de entrar em qualquer site da rede social on-line que possa ser frequentado por crianças e adolescentes”. A lei especifica que a expressão “rede social” cobre qualquer site que permite comunicação entre usuários e permite a criação de perfis que incluem fotos ou nome, entre outros requisitos.
Em 2002, aos 21 anos, Packingham foi acusado de estupro de uma menina de 15 anos. Mas a acusação foi retirada e ele foi condenado de 10 a 12 meses de prisão por ato de indecência. Mas a pena foi suspensa condicionalmente por dois anos. No entanto, ele foi registrado como “predador sexual”, um registro do qual nunca se livrou.
Em 2010, quando agradeceu a Deus pelo Facebook por escapar da multa, sua mensagem foi lida por um policial zeloso que o prendeu. Acusado novamente, ele foi condenado em primeiro grau. A condenação foi anulada por um tribunal de recursos. Mas o tribunal superior do estado manteve a condenação inicial. Agora o caso está nas mãos da Suprema Corte dos EUA.
A ação da Carolina do Norte chega à Suprema Corte com o apoio de 13 dos 50 estados americanos, entre os quais Carolina do Sul, Texas e Pensilvânia, que aprovaram leis similares em seus próprios territórios, de acordo com o The Charlotte Observer, o U.S. News e outras publicações.
O procurador-geral do estado Josh Stein divulgou uma declaração na qual afirma que os predadores sexuais vêm se tornando cada vez mais adeptos da mídia social, na qual podem obter informações íntimas sobre menores, tais como sua vida social, família, hobbies, onde se divertem etc. “Então, usam essas informações para atacar suas vítimas”, diz a declaração.
Se a lei é inconstitucional ou não, pelo menos o estado tem motivos para se preocupar. O registro de “predadores sexuais” do estado contém mais de 20 mil nomes. Dentre eles, mais de mil foram condenados por desobedecer a lei que os proíbe de usar sites frequentados por menores — tal como Packingham.
Packingham, por sua vez, recebe o apoio de várias organizações, principalmente daquelas que defendem as liberdades individuais e os direitos humanos. Em uma petição à corte, o Instituto Cato pergunta como uma pessoa pode saber se um site permite ou não a participação de menores. “Um menor pode facilmente contornar sistemas de verificação de idade dos sites”, afirma.
O Comitê de Repórteres pela Liberdade de Imprensa diz, também em uma petição, que a lei inclui, inadvertidamente, a maioria substancial de sites noticiosos, que permitem o registro de pessoas de qualquer idade (incluindo menores, no caso). E que apenas os sites que proíbem o acesso de menores escampam da proibição da lei.
Esses sites são, obviamente, aqueles que publicam fotos de pessoas nuas ou material pornográfico — a não ser pelos sites em que não há qualquer tipo de interação.
A Electronic Frontier Foundation concorda. Em sua petição, diz que, para essas pessoas, incluindo as que já pagaram por seus erros, a lei praticamente limita o acesso a apenas “um canto obscuro” da Internet.
O direito à interação na internet é apreciado por 7 em 10 americanos que usam, regularmente, as redes sociais. “O Facebook apenas tem mais de 1,7 bilhão de usuários ativos por mês”, diz a fundação.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 25 de fevereiro de 2017.
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