segunda-feira, 6 de março de 2017

Redução de pena por tráfico em patamar inferior ao legal exige fundamentação

Embora o magistrado não seja obrigado a aplicar o patamar máximo de redução de pena quando presentes os requisitos do artigo 33, parágrafo 4º, da Lei de Drogas (Lei 11.343/06) — primariedade, bons antecedentes, não vinculação a organizações criminosas nem a prática delitiva habitual —, a opção por uma fração menor que o limite de dois terços deve ser concretamente fundamentada.
Para Rogério Schietti Cruz, mero fato de o acusado não provar que tinha emprego não permite que se conclua que ele é traficante.
Reprodução
Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça redimensionou a pena de um réu primário condenado pelo porte de cerca de cinco gramas de cocaína, fixando a redução pelo chamado tráfico privilegiado no limite máximo previsto em lei. O relator foi o ministro Rogerio Schietti Cruz.
Em virtude da redução, a turma também determinou o regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.
O juiz de primeira instância havia condenado o réu a 3 anos e 9 meses de prisão pelo crime de tráfico de entorpecentes, com a aplicação do redutor de um quarto da pena. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a sentença por entender que o acusado “fazia da atividade espúria o seu meio de vida”, já que teria declarado usar entorpecentes, sem comprovar o exercício de atividade lícita.
Fato novo
Para o ministro Schietti, ao concluir que o réu não seria um traficante eventual e que teria a atividade ilícita como meio de vida, o tribunal paulista trouxe fato novo aos autos, impossibilitando que a defesa produzisse provas para refutar a alegação e permitir o estabelecimento do maior patamar de redução penal previsto em lei.

De acordo com o relator, “soa quase absurdo” concluir que o réu não seria um traficante eventual, “quando verificado que, ao tempo do delito, era tecnicamente primário e possuidor de bons antecedentes e que foi apreendido com a reduzida quantidade de 5,3 gramas de cocaína, sem nenhum outro apetrecho destinado à traficância”.
Schietti também lembrou que a não comprovação do exercício de atividade lícita não pode levar automaticamente à conclusão contrária, “até porque o desemprego, diante da realidade social brasileira, representa, na verdade, um infortúnio de boa parte da população, e não algo tencionado”.
Gravidade abstrata
Em relação à forma inicial de cumprimento da pena, o ministro ressaltou que o TJ-SP manteve a fixação do regime fechado com base apenas na gravidade abstrata do delito, sem apontar elementos concretos que demonstrassem sua necessidade.

“Embora haja sido apreendida cocaína em poder do acusado (substância entorpecente dotada de alto poder viciante), entendo que a quantidade de droga foi pequena, motivo pelo qual esse elemento não poderia, por si só, ensejar a imposição de regime inicial mais gravoso, notadamente quando verificado que todas as demais circunstâncias são favoráveis ao acusado e que ele foi condenado à reduzida reprimenda de um ano e oito meses de reclusão”, concluiu o ministro, referindo-se à pena definitiva fixada pelo STJ.
Drogas e prisões
A revista eletrônica Consultor Jurídico publicou em fevereiro uma série de reportagens e entrevistas sobre a relação entre a guerra às drogas e a superlotação dos presídios. O especial teve como motivação a onda de rebeliões e massacres em presídios no início de 2017.

Os textos do especial, que podem ser encontrados neste link, apontam que a repressão às drogas não reduziu o uso e comércio delas, apenas gerou encarceramento em massa e mais violência. Nesse combate, os acusados têm seu direito de defesa rebaixado, e o depoimento dos policiais, muitas vezes, é o que embasa as condenações, conforme demonstram estudos. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
HC 387.244
Revista Consultor Jurídico, 3 de março de 2017.

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