segunda-feira, 22 de abril de 2013

Tráfico internacional de pessoas: subproduto da globalização





Tráfico de pessoas, uma forma moderna de escravidão, é uma das atividades mais rentáveis do crime organizado no mundo, perdendo em lucratividade apenas para o tráfico de drogas e de armas.


Atualmente, o tráfico de pessoas, considerado como forma moderna de escravidão, é uma das atividades mais rentáveis do crime organizado no mundo, perdendo em lucratividade apenas para o tráfico de drogas e de armas. Estima-se que da totalidade de vítimas, quase a metade seja subjugada para exploração sexual.

As abordagens e compreensões já construídas demonstram que o tráfico de pessoas não tem causa única, mas resulta de uma série de fatores relacionados às oportunidades de trabalho, aos fluxos migratórios, à busca por melhores condições de vida, às desigualdades sociais e à discriminação. Para seu efetivo enfrentamento, são necessárias ações nacionais, internacionais, jurídicas e políticas, articuladas e intersetoriais, estruturadas em três eixos estratégicos, os quais incluem a prevenção, a atenção às vítimas e a repressão. 

A prevenção visa a minimizar a fragilidade de determinados grupos sociais, fomentar políticas públicas de combate e realizar pesquisas para a coleta de informações. Já o eixo de atenção às vítimas, nacionais ou estrangeiras, visa ao seu devido tratamento e reinserção social com adequada assistência consular e acesso à Justiça de forma não discriminatória. 

Quanto à repressão, a intenção está em fiscalizar, controlar, investigar e responsabilizar. Os mais importantes instrumentos internacionais para o enfrentamento do tráfico internacional de pessoas são o Protocolo Adicional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças e o Protocolo Adicional relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea, ambos adotados em 2000 e ratificados pelo Brasil em 2004, que complementam a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. O Código Penal pátrio promoveu a adequação legislativa em 2006 e 2009, por meio do artigo 231 que, todavia, ainda necessita de aprimoramentos. 

O “tráfico de pessoas” é definido na legislação internacional como o recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou outras formas de coação, ao rapto, fraude, engano, abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. Vale ressaltar que, no caso de crianças e adolescentes, mesmo sem o emprego desses meios coercitivos, o simples recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento para fins de exploração será considerado tráfico de pessoas.

Percebe-se que o tráfico de pessoas nutre estreita relação com o trabalho forçado, pois sua principal finalidade é fornecer mão de obra para o trabalho forçado, seja para a exploração sexual comercial, econômica, ou para ambas. Trabalho forçado, na definição da Organização Internacional do Trabalho, significa todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual ela não tiver se oferecido espontaneamente. 

Do ponto de vista nacional, o Brasil só direcionou esforços para o enfrentamento ao tráfico de seres humanos quando pesquisas o incluíram nas rotas internacionais, evidenciando também a existência de rotas nacionais. Em 2006, foi adotada a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas - PNETP, tornando o problema alvo de uma política de Estado. O Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, previsto pela PNETP, foi instituído em 2008 e objetiva dar concretude aos princípios, diretrizes e ações plasmados nesta Política. Dados recentes da ONU apontam a existência de 241 rotas do tráfico no país, sendo 110 de tráfico interno e 131 de tráfico internacional. As regiões Norte e Nordeste têm a maior concentração dessas rotas.

No entanto, a constituição de uma rede de enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil e no mundo continua sendo um desafio, pois se trata de fenômeno complexo e multifacetado. Impulsionadas pela globalização, a pobreza e a conseqüente violação dos direitos humanos contribuem decisivamente para a vulnerabilidade a qualquer tipo de exploração. Além dos mecanismos nacionais de prevenção, assistência às vítimas e repressão, o combate ao tráfico de pessoas exige a reorientação da política internacional para uma “globalização ascendente”, no sentido de progredir para uma melhor distribuição de riquezas em nível global e uma maior proteção dos direitos humanos.


(*) Doutora em Direito Internacional pela USP, Professora de Direito Internacional da UFPR e Professora do Programa de Mestrado em Direitos Fundamentais e Democracia da UniBrasil.


Carta Maior. 19.04.2013.

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