O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) reformou sentença condenatória do Juízo da 7ª Vara Criminal de Vitória e absolveu da acusação de dano ao patrimônio público (artigo 163 do Código Penal) o cidadão Diego Braga Nascimento, que, após passar 21 dias preso dentro do “cofre” de uma viatura no pátio da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), perdeu a paciência e destruiu a grade do veículo para chamar a atenção das autoridades e ser transferido para um dos presídios da Grande Vitória.
O fato ocorreu no dia 8 de dezembro de 2009 e, por esse crime, Diego foi condenado, em primeiro grau, a nove meses de detenção e 12 dias-multa, inicialmente, em regime semiaberto. Na denúncia, o Ministério Público relata que, no interior da viatura policial 588, conhecida na época como “Mosespinho”, Diego Braga danificou a tela de proteção do veículo com um pedaço de metal, o que configuraria conduta delituosa tipificada no artigo 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal.
No recurso ao Tribunal de Justiça, o réu alega ter agido acobertado pela “excludente de ilicitude do estado de necessidade , porque permaneceu custodiado no cofre da viatura, cuja grade fora danificada, durante 21 dias, tudo isso em condições subumanas e extremamente desconfortáveis”.
Ao julgar a apelação criminal 0037697-72.2009.8.08.0024 (024090376971), em decisão monocrática que deu provimento ao recurso e reformou a sentença, para absolver Diego Braga Nascimento, a desembargadora Catharina Maria Novaes Barcelos registrou que a destruição do bem público não era o único meio de manifestação do recorrente, porém, valeu-se do recurso para focalizar “um aspecto que passou despercebido por todos, referente ao elemento subjetivo específico exigido no crime de dano”.
“A partir da redação do próprio auto de prisão em flagrante delito, verifica-se que a viatura nº 588, infelizmente, vinha servindo para abrigar os autuados pela prática de crimes contra a vida na Grande Vitória, numa situação no mínimo anômala reconhecida pelo próprio delegado”, Germano Henrique Pedrosa.
E acrescenta: “Embora um erro não justifique o outro, é fato estreme de dúvida que o móvel da contuta do recorrente não foi propriamente a vontade de causar prejuízo ao Estado (animus nocendi), mas, sim, o firme propósito de chamar a atenção das autoridades a fim de conseguir sua transferência para um presídio da Grande Vitória dotado de estrutura mínima para a custódia de seres humanos. Essa versão, diga-se de passagem, é enunciada pelo delegado na APFD (…), calhando ressaltar que, segundo o relato do recorrente, ficou confinado no compartimento minúsculo e extremamente quente da viatura estacionada no pátio da DHPP por 21 dias”.
A decisão monocrática da desembargadora Catharina Novaes foi publicada no Diário da Justiça do Espírito Santo nesta quinta-feira (18).
“Masmorras capixabas” |
O “Mosespinho” era um ônibus onde os presos ficavam confinados, estacionado no Barro Vermelho, um bairro de classe méida em Vitória e seu apelido remetia ao Mosesp, a Penitenciária de Segurança Máxima de Viana, na região metropolitana da Grande Vitória, a 20km do centro da Capital.
A história da Viatura nº 588 é um capítulo da história de maus tratos a presos no Espírito Santo, quando os presídios foram chamados de “masmorras capixabas”, o que levou o Brasil a ser denunciado no Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra.
As “masmorras” não se limitavam ao “Mosespinho”, mas a todo o sistema prisional do Espírito Santo, que ganharam notoriedade por conta de esquartejamento de presos em celas superlotadas e as celas “micro-ondas”, apelido dado aos containers instalados para “abrigar” presos junto à Delegacia de Novo Horizonte, no município de Serra.
Em agosto de 2009, o presidente do Conselho Nacional de Política Criminal (CNPCP), Sérgio Salomão Shecaira, pediu demissão, depois de haver solicitado, sem êxito, intervenção federal nas prisões capixabas.
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