quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Improviso nas delegacias da RMC

Infra-estrutura precária, com falta de pessoal e superlotação, incentiva a violência no entorno de Curitiba

A situação precária da maioria das delegacias é um dos motivos da violência que assola a região metropolitana de Curitiba. Celas superlotadas e falta de pessoal são constantes nas cidades vizinhas da capital, onde foram registrados 518 homicídios dolosos de janeiro a setembro deste ano, segundo dados oficiais. Um levantamento feito pela Gazeta do Povo, em 14 delegacias nos últimos 15 dias, demonstra a falta de estrutura. Para tentar cobrir a falta de pessoal, o improviso impera.

A tática do governo é ter delegados que atendem em mais de uma cidade, equipes super-reduzidas e muitos estagiários nas delegacias, cujas cadeias estão entupidas de presos (veja infográfico). Os delegados de cidades maiores acumulam o serviço de cidades vizinhas menores, onde a delegacia normalmente é ocupada por policiais militares ou funcionários de prefeituras. Almirante Tamandaré divide o delegado com Campo Magro e o mesmo ocorre em Fazenda Rio Grande, Mandirituba e Agudos do Sul; Campina Grande do Sul, Piraquara e Quatro Barras; Campo Largo e Balsa Nova; Lapa e Contenda; e Rio Branco do Sul, Itaperuçu, Cerro Azul e Doutor Ulysses.

Piraquara

Em Piraquara, o berço das principais penitenciárias do estado, um delegado não dá expediente diário desde o mês passado e assim será por mais quatro meses. No momento, a responsável é a delegada Margareth Alferes Motta, titular em Campina Grande do Sul e que também trabalha em Quatro Barras. A sua tarefa é quase impossível quando há crimes simultâneos nas três cidades. A delegada não fala sobre o assunto. Piraquara tem cerca de 5 mil presidiários, alguns deles de facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC).

Em Almirante Tamandaré, que ganhou fama nacional há pouco tempo com as mortes em série de mulheres, um policial plantonista e dois presos morreram no início de novembro. A investigação concluiu que o policial foi negligente, permitindo a entrada de mulheres à noite para encontros amorosos com os detentos. Mas a polícia não revelou que a cidade ficou agora com apenas três investigadores – um está de férias.

A delegacia de Quatro Barras só tem um policial no plantão (24 horas), além de um escrivão e o superintendente – o gerente da delegacia – no horário comercial. Um dos plantonistas foi baleado na fuga de seis detentas no mês passado. O assalto à agência dos Correios, ao lado da delegacia da cidade, chamou atenção. A Polícia Civil foi avisada em seguida, mas os assaltantes fugiram e não há pistas deles.

Superlotação

Fugas e rebeliões estão se tornando inevitáveis por causa da superlotação. As últimas aconteceram em Fazenda Rio Grande – fuga de sete detentos – e em São José dos Pinhais – com um detento morto e um ferido. Segundo especialistas, o sucateamento das delegacias é uma das causas da alta criminalidade na região.

Nestor Sampaio Penteado Filho, professor do Complexo Jurídico Damásio de Jesus e delegado da Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo, lembra que essa também é a realidade de outros estados brasileiros. “Desde a democratização do Brasil os governos viraram as costas para a segurança pública. Nos últimos 20 anos vivemos um sucateamento na área. Ela é tarefa dos estados, que deixaram de investir nos aspectos de prisões, delegacias e principalmente no ser humano. O que se assiste é o desmonte da segurança pública.”

Para Sampaio, a solução é criar cargos públicos, fazer concursos e remunerar bem o pessoal. “Não adianta fazer lei e criar novos crimes se não há meios para reprimir a atividade criminosa”, afirma.

Segundo o jurista Maurício Kuehne, professor de Direito Penal da Unicuritiba e ex-diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional, a falta de estrutura das delegacias causa impunidade. “O quadro é caótico. Providências devem ser tomadas pelo governador e pelo secretário de segurança. A situação das delegacias do Paraná é lastimável.”

O estado caótico das delegacias de Curitiba, da região metropolitana e de Paranaguá está no relatório divulgado no mês passado pela comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção Paraná. “A maioria das delegacias está abaixo de zero, numa avaliação de um a dez. Eu só exaltaria o trabalho dos delegados e das suas equipes, que estão sendo sacrificados”, afirma a advogada Isabel Kugler Mendes, secretária da Comissão de Direitos Humanos da OAB Paraná. “A situação mais grave é a da carceragem de Piraquara, que está interditada há mais de dois anos e não poderia mais receber presos.”

Gazeta do Povo.

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