SÃO PAULO - O número de internações por cem mil mulheres na faixa de 20 a 59 anos devido a agressões aumentou de 113,47 , em 2006, para 123,04, em 2007 - um crescimento de 8,43%. Guaianazes, na zona leste da capital, ocupa o primeiro lugar no ranking de internações de mulheres vítimas de agressão na cidade. Em 2006, foram registradas 256,62 internações para cada cem mil mulheres residentes na região. No ano passado, a taxa foi de 234,48 mil. A região apresenta uma taxa duas vezes maior que a média da capital.
Na capital, segundo pesquisa realizada entre os anos de 2001 e 2002 pela Organização Mundial de Saúde, 27% das mulheres relataram já ter sofrido algum tipo de violência física cometida pelo parceiro ou ex-marido ao longo da vida. Outra pesquisa, realizada em 2001 pela Fundação Perseu Abramo, mostrou que 19% das brasileiras tinham sofrido algum tipo de violência cometida por um homem e 16% relataram que a agressão chegou à violência física. Quando a resposta foi estimulada por uma lista que apontava as diferentes formas de agressão, como xingamentos, por exemplo, o número saltou para 43%.
Para Paula Prattes, assessora da Coordenadoria da Mulher do município, os números refletem diretamente os índices de violência da região. Segundo ela, a notificação também é maior na zona leste. Assim, a região de Parelheiros, na Zona Sul, que apresenta o menor índice de internações por violência - 42,99 por cem mil mulheres - na avaliação de Paula, tem também a maior quantidade de casos não-notificados.
- Além de ser uma região violenta, a oferta de serviços é baixa, o que desestimula as denúncias - diz.
Na semana passada, o governo de São Paulo assinou com a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM) um termo de cooperação para implementação do Pacto Nacional pelo Enfrentamento da Violência contra a Mulher. O acordo estabelece ações contra a violência doméstica, como implantação de defensorias públicas e juizados especiais.
Vítima do pai e do marido
A vendedora Selma, de 32 anos, convive com a violência em casa desde criança. No início, era o pai que bebia, xingava a mulher e agredia os filhos. Depois foi o marido, com quem viveu por 16 anos. Na última briga, há pouco mais de dois anos, ele tentou matá-la com uma faca. Desesperada porque o filho mais velho, na época com 12 anos, investiu contra o pai para salvá-la, Selma enfrentou o marido para desarmá-lo. E teve as duas mãos cortadas. Ela recebeu seis pontos em cada mão.
- Meu marido nem ficou preso. Passou só a noite na delegacia para curar o porre - afirma.
Selma conta que tinha 15 anos quando conheceu o ex. Após 20 dias de namoro, já foram morar juntos. Segundo ela, a mãe a incentivou a casar cedo para sair de casa e se livrar da violência.
Nos primeiros meses, a relação foi boa. Mas, assim que ela engravidou, aos 16 anos, tudo mudou.
- Foi um filho atrás do outro. Tivemos cinco - três meninas e dois meninos. E o primeiro é deficiente.
Segundo Selma, o marido sempre foi bom pai. De segunda a quarta-feira, o relacionamento do casal era harmonioso, mas, perto do fim de semana, ele começava a beber e se transformava. "Cheguei a sair de casa, mas voltei porque não tinha como sobreviver sozinha com as crianças", diz.
Selma só conheceu seus direitos ao freqüentar a Casa Sofia, uma ONG na Zona Sul que dá assistência à mulheres vítimas de violência doméstica. Hoje, já refez sua vida e até mantém bom relacionamento com o ex-marido, que paga regularmente a pensão dos filhos. Mas não quer mais saber de casamento.
Despreparo no atendimento
De acordo com especialistas, o alto índice de internações de mulheres por agressão poderia ser reduzido se o sistema de saúde estive apto a identificar os casos de violência doméstica.
- Há muito despreparo dos profissionais nesse quesito. Eles não estão preparados para fazer a abordagem correta e, sobretudo, ouvir as pacientes - explica Télia Negrão, secretária executiva da Rede Nacional Feminista de Saúde e coordenadora do Observatório Maria da Penha na região Sul.
- Não são raros os casos em que a mulher chega ao consultório com marcas da violência e os médicos não as examinam corretamente. E mais: não perguntam o que houve. Temos pesquisas que indicam que, se o profissional tivesse feito uma única pergunta específica, as mulheres responderiam que sim, sofreram algum tipo de violência - diz Télia.
O Globo.
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