As prisões brasileiras abrigam mais de 600 mil pessoas, um número 60% maior do que sua capacidade oficial. Os dados são do Relatório Mundial 2016 da organização não governamental Human Rights Watch.
No levantamento anual, a ONG reconhece nas audiências de custódia um esforço do Brasil para combater violações de direitos humanos. A iniciativa tenta garantir ao preso em flagrante o direito de ser ouvido por um juiz em até em 24 horas.
Porém, o relatório destaca que o país precisa garantir que os responsáveis por execuções extrajudiciais e tortura sejam de fato responsabilizados, além de tomar medidas mais efetivas para aliviar as condições desumanas que imperam em suas prisões superlotadas.
"As prisões do Brasil permanecem um verdadeiro desastre do ponto de vista dos direitos humanos", disse Maria Laura Canineu, diretora do escritório Brasil da Human Rights Watch. "E o número de mortes causadas pela polícia continua extremamente alto."
No Rio de Janeiro, em 2015, 644 pessoas foram mortas nas mãos da polícia em serviço — um aumento de 10% em relação ao ano anterior. Em São Paulo, policiais em serviço mataram 494 pessoas nos primeiros nove meses do ano, um aumento de 1% em relação ao ano anterior. Continuamente, inquéritos policiais relatam que essas mortes são resultado de confrontos com a polícia.
Enquanto algumas mortes resultam do uso legítimo da força pela polícia, outras não. Além disso, policiais de vários estados foram acusados de envolvimento em chacinas. Essas estatísticas alarmantes de 2015 seguem um ano no qual, em todo o país, o número de mortes causadas por policiais em serviço e fora de serviço aumentou em quase 40%, chegando a mais de 3 mil, enquanto o número de policiais mortos — quase 400 — caiu em 2%.
Falta de vagas
A superlotação e a falta de pessoal tornam impossível às autoridades manterem o controle em muitas das instalações, deixando os presos vulneráveis à violência e às facções criminosas, como documentado pela organização nos estados de Pernambuco e do Maranhão.
"Um aspecto positivo, no entanto, é que em muitas jurisdições pessoas presas já são levadas rapidamente à presença de um juiz", disse Maria Laura. "As audiências de custódia garantem o cumprimento de um direito fundamental e podem inclusive reduzir os casos de tortura e a superlotação das prisões."
Implantada em 2015 pelo Conselho Nacional de Justiça e pelos tribunais de Justiça em todas as capitais do país, a nova política foi citada no relatório da ONG por se tratar de uma iniciativa do Poder Judiciário que tenta solucionar as violações de direitos humanos que representam a superlotação no sistema carcerário, além da tortura e dos maus-tratos cometidos contra pessoas que são presas.
“Violações crônicas de direitos humanos assolam o Brasil, incluindo execuções extrajudiciais pela polícia, a superlotação das prisões, tortura e maus-tratos a pessoas detidas. Alguns esforços recentes para reformar o sistema de Justiça criminal procuraram solucionar alguns desses problemas, mas outras iniciativas poderiam agravá-los. Em 2015, o Poder Judiciário trabalhou em conjunto com os governos estaduais para garantir que as pessoas detidas sejam conduzidas sem demora à presença de um juiz, conforme exigido pela legislação internacional”, afirma a ONG.
Nessas audiências, o preso (em flagrante ou por mandado de prisão) é apresentado a um juiz, que avalia o crime atribuído à pessoa detida, na presença de um representante do Ministério Público e de um defensor público ou advogado. De acordo com a pena prevista para o crime cometido, o perfil do preso e outras circunstâncias da detenção, o juiz pode decidir por não manter a pessoa em uma unidade prisional enquanto não ocorre o julgamento. O objetivo é também que o preso possa relatar eventuais casos de maus-tratos rapidamente.
Para a Human Rights Watch, o Congresso deve aprovar um projeto de lei que torne as audiências de custódia obrigatórias em todo o país, além de aprovar outro projeto de lei, também em tramitação, que torna mais difícil aos policiais encobrirem evidências de execuções extrajudiciais.
Maioridade penal e terrorismo
Em seu relatório, a ONG afirmou ainda que o Congresso deve rejeitar proposta de emenda constitucional que permite que adolescentes de 16 e 17 anos de idade sejam julgados e condenados como adultos. Também é contrária a um projeto de lei de combate ao terrorismo, por entender que é produzido “com linguagem excessivamente vaga” e poderia ser utilizado para processar e condenar manifestantes e outros críticos como se terroristas fossem.
De acordo com o relatório, no âmbito internacional, o Brasil continuou a liderar os esforços pela defesa do direito à privacidade e, durante os últimos cinco anos, dobrou o número de refugiados reconhecidos vindos da Síria e de outros países.
No entanto, o Brasil teve uma atuação inconsistente como membro do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas em 2015, diz a entidade.
Em março, o país se absteve na votação de uma resolução que condenava as violações dos direitos humanos ocorridas no âmbito do conflito sírio e também em uma outra com o objetivo de renovar o mandato da relatoria especial para o Irã, que critica duramente a permanência de graves violações de direitos humanos naquele país.
Em junho, entretanto, votou a favor de uma resolução sobre a Síria bastante similar à qual absteve-se em março, dizendo que esta última possuía uma linguagem mais dura na condenação de violações cometidas por grupos de oposição armados, incluindo o Estado Islâmico. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ e da ONG Human Rights Watch.
Clique aqui para ler o Relatório Mundial 2016.
Revista Consultor Jurídico, 30 de janeiro de 2016.
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