A polícia de Birmingham, Alabama (EUA), denunciou um menino de oito anos por homicídio de primeiro grau (correspondente a homicídio qualificado no Brasil). A acusação é a de que o menino matou “de forma brutal e temerária” uma menina de um ano e sete meses, porque ela não parava de chorar. A “testemunha ocular do crime”, ouvida pela polícia, é um menino de seis anos.
A mãe da menina, Katerra Lewis, 26, e uma amiga foram a um clube noturno e deixaram seus filhos sozinhos em casa. O menino de oito anos, filho da amiga, foi encarregado de cuidar de seus quatro irmãos, de dois, quatro, seis e sete anos, e da vítima, Kelci Lewis.
Elas chegaram em casa às 2h30 da madrugada e Katerra foi dormir, sem checar se a filha estava bem ou não. Só descobriu às 10h45 da manhã que a filha parecia morta. Levada ao hospital, a morte foi confirmada — segundo a polícia, por “trauma sério na cabeça e danos graves a órgãos internos”.
A mãe da vítima foi denunciada por homicídio com grau atenuado de culpa (manslaughter). Ela foi presa por um hora e meia e solta depois de pagar uma fiança de US$ 15 mil. O menino de oito anos está detido no Centro de Recursos Humanos de Alabama, e todos os demais filhos da amiga estão sob os cuidados do estado agora.
Autoridades anunciaram que vão processar o menino, segundo os jornaisThe New York Times, The Washington Post e outras publicações. No estado do Alabama, como em outros estados americanos, não há idade mínima para ação penal, segundo o advogado da Sociedade de Assistência Jurídica Tobie Smith, que também é um dos diretores do Centro de Detenção de Juvenis do estado.
Processar crianças não é comum, mas é notícia vez ou outra. No mês passado, as autoridades de Tennessee moveram uma ação penal contra um menino de 11 anos, também por homicídio de primeiro grau. O menino foi acusado de matar, com arma de fogo, uma menina de oito anos, que se recusou a lhe mostrar seus filhotes de cachorro.
Questões fundamentais
No julgamento anunciado no Alabama, dizem os advogados ouvidos pelas publicações, serão examinados pelo menos dois aspectos fundamentais do caso. O primeiro é se uma criança de oito anos tem capacidade de entender as acusações e os procedimentos contra ela.
A lei requer que qualquer réu (não apenas crianças) tenha capacidade de entender a natureza e o propósito dos procedimentos jurídicos contra ele e ser capaz de, efetivamente, cooperar com seu advogado de defesa, explica o site Psycholegal Assessments.
Isso significa que tem de ser capaz de entender as acusações contra ele e as penas que serão aplicadas, se for condenado. Também deve ser capaz de ter um certo nível de entendimento dos procedimentos na sala de julgamento e as funções dos participantes de um tribunal do júri.
No se refere à cooperação com o advogado, o réu tem de ser capaz de participar do planejamento de sua estratégia de defesa, de recordar fatos e eventos relevantes, explicar os motivos e ações da prática do crime do qual é acusado, bem como de testemunhar em seu benefício e contestar testemunhas da acusação.
Um outro aspecto que certamente será discutido, segundo os advogados, é a atribuição de culpabilidade pelo crime — isto é, se a matéria é mais de culpabilidade da mãe, que foi para um clube noturno em vez de cuidar da criança, ou se a culpabilidade é do menino de oito anos, que perdeu a paciência e bateu na menina até ela se calar.
A “culpabilidade dos país” (parental culpability), em referência a crimes cometidos por seus filhos, é uma proposição jurídica que ainda está engatinhando nos EUA, diz a Wikipédia (em inglês). Defensores de uma legislação vislumbram a possibilidade de responsabilizar os pais criminalmente e civilmente, em casos de negligência. Opositores argumentam que haverá muita injustiça, porque, hoje em dia, o pai e a mãe passam o dia trabalhando e não podem supervisionar seus filhos o tempo todo.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 12 de fevereiro de 2016.
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