sábado, 27 de setembro de 2008

Gravidade do crime só pode ser punida uma vez

É ilegal a decisão que impede a progressão de regime porque o sentenciado foi condenado pela prática de crime grave e tem longa pena para cumprir. O entendimento é da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo. A Câmara acolheu o recurso de um condenado por crime hediondo para permitir que ele passe a cumprir a pena em regime semi-aberto. Participaram do julgamento os desembargadores Ivan Marques, relator, Almeida Sampaio e o juiz substituto em segundo grau Roberto Martins de Souza.

Pires Neto, presidente da Câmara, também opinou no caso, mas não votou. Faz parte do perfil dele expor a opinião nos processos julgados, mesmo quando não integra a turma julgadora. Pode ser que o entendimento firmado pela turma julgadora não seja seguido nos demais casos julgados porque é comum a Câmara mudar a orientação.

Segundo o processo, a defesa do condenado entrou com Agravo em Execução contra a decisão que negou a progressão porque o sentenciado foi condenado por crime grave e ainda tinha longa pena para cumprir. O argumento da defesa foi de que estavam preenchidos todos os requisitos para a progressão.

O relator, Ivan Marques, acolheu o argumento. “A prática de crimes graves não é prevista em qualquer dispositivo legal vigente no Brasil como justa causa para indeferir o benefício ao sentenciado”, afirmou. “Se foi condenado por crime grave o réu recebeu pena correspondente a ele e, assim sendo, não pode ser novamente punido por isso. Por outro lado, o fato de ter ainda longa pena por cumprir tampouco é motivo para indeferimento do benefício”, considerou Ivan Marques.

O desembargador ainda afirmou que se o réu pedia a progressão era porque já tinha cumprido boa parte da sua “longa pena”. Por isso, para ele, a decisão do juiz da execução pareceu “pura e simples vontade do magistrado em não conceder a progressão”.

“A surrada afirmativa de que o juiz deve ser homem de seu tempo e atender aos clamores da sociedade não tem qualquer cabimento no sistema constitucional brasileiro, onde legisladores legislam supostamente para atender aos clamores de seus representados e juízes julgam de acordo com as leis postas por eles”, observou o desembargador.

Ivan Marques finalizou o voto afirmando que “qualquer tentativa judicial de descumprir lei ou travestir decisão judicial de lei não votada por quem de direito é inadmissível num Estado de Direito”.

Orientação

A questão da progressão de regime para condenado por crime hediondo ainda não está pacificada no Tribunal de Justiça paulista. O Órgão Especial entende que a proibição continua valendo, embora o Supremo Tribunal Federal tenha declarado a sua inconstitucionalidade. De acordo com os desembargadores que compõem o Órgão Especial, como a decisão do STF foi tomada no julgamento de um pedido de Habeas Corpus, o entendimento vale só para o caso concreto, já que não foi determinada a cassação do dispositivo que proíbe a progressão.

As Câmaras Criminais também divergem sobre o assunto. A 6ª Câmara entende que a proibição continua valendo e fundamenta parte de seu entendimento em decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Francisco Rezek (já aposentado) de junho de 1993. A 11ª Câmara também já negou a progressão com base no mesmo voto de Rezek. O mesmo entendimento teve a 14ª Câmara. Já a 12ª entende que a decisão do Supremo, ainda que em Habeas Corpus, obriga e vincula todas as instâncias inferiores. Para os desembargadores desta Câmara, a chancela do Senado é apenas formalidade, tanto que ele não pode agir de maneira diferente.

Revista Consultor Jurídico, 27 de setembro de 2008

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