terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Delegacias: O inferno atrás das grades

A cela de oito metros quadrados guarda oito homens, todos sem camisa e suando em bicas. Como o espaço não tem janelas, o único arremedo de brisa vem de um ventilador mambembe. O calor insuportável é agravado pela superlotação. Para caber no espaço diminuto – projetado para duas pessoas – os presos se espremem: quatro permanecem encolhidos no piso, enquanto outros quatro ficam em redes suspensas a dois metros do chão. No cubículo ao lado, o quadro é o mesmo. O aperto só não é maior porque, durante o dia, detentos são retirados das celas e ficam trancados em uma antessala. O cheiro é forte. Algumas garrafas pet, com a água quente que sai da torneira de fora do cárcere, é o máximo que têm para amenizar o bafo do dia.
“Se ‘tá ruim pra vocês aí fora, imagina pra gente aqui dentro. Isso aqui é um forno. Deve passar fácil de 40 graus. A gente ‘tá a mercê de um sistema falido”, reclamou um dos detentos.
 A cena – observada pela reportagem em uma delegacia da região de Curitiba – está longe de ser exceção. Segundo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) praticamente todas as carceragens de delegacias do estado estão superlotadas. A maioria das celas eram salas, que foram adaptadas para receber os presos. No total, detêm 9,9 mil pessoas, que se amontam em espaços sem ventilação, sem banho de sol e atividades de ressocialização. No verão, proliferam ainda reclamações relacionadas à comida, que azeda rapidamente. “É um verdadeiro inferno”, define um preso.
OAB
Nesta semana, a OAB começará a vistoriar carceragens na região de Curitiba, com o objetivo de garantir a integridade física dos presos diante do calorão. A inspeção será iniciada pela delegacia de Pinhais, onde as celas detêm mais de cem pessoas, em um espaço com capacidade para oito.
“Eles ficam pior que bicho”, disse a advogada Isabel Kügler Mendes, que integra a comissão nacional de direitos humanos da OAB.
Na semana passada, presos da delegacia de Paranaguá se rebelaram. Informações extraoficiais dão conta de que o motim começou depois que um detento desmaiou por não suportar o calor. Em Curitiba, o 1º Distrito Policial (DP), o 12º DP e a carceragem da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos (DFRV) também estão superlotados e preocupam as autoridades pelas condições em que os presos se encontram.
 “Humanidade”
Delegado pede libertação se não houver transferências
A falta de estrutura adequada para cuidar dos presos fez com que o delegado Rubens Recalcatti, do 1º DP, Centro de Curitiba, tomasse uma atitude extrema: ele pediu oficialmente à Vara de Execuções Penais, Ministério Público e OAB que os presos que se encontram encarcerados na delegacia por ele chefiada sejam postos em liberdade, caso não seja possível transferi-los para um presídio. “E, não sendo possível tal solicitação [a transferência de presos], que se expeça o competente alvará de soltura para os presos aqui custodiados, por pura questão de humanidade”, frisa o ofício. O delegado afirma que ainda não obteve resposta do pedido. No 1º DP, estão encarcerados 24 homens, em um espaço para quatro.
Além da falta de condições estruturais, o delegado apresentou o ofício, pensando nas altas temperaturas do verão. “As condições são subumanas e indignas. Amontoam-se num mesmo lugar pessoas que cometeram crimes de gravidade diferente e não temos o que fazer. No calor, tudo piora”, observou o delegado.

Fonte: FELIPPE ANÍBAL - Gazeta do Povo

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