Um balanço feito pelo Conselho Nacional de Justiça revela que 10% dos presos atendidos durante os mutirões carcerários promovidos até dezembro de 2013 foram postos em liberdade. O estudo analisou todos os mutirões organizados pelo CNJ, que deu início ao modelo em agosto de 2008, e comprovou que dos 451,8 mil processos analisados, ao menos 47 mil detentos estavam presos de forma indevida. As informações são do portal iG.
De acordo com o balanço, cerca de 87,5 mil presos não tinham assessoria jurídica e, depois que o mutirão foi feito, ganharam benefícios que resultaram em liberdade, como a progressão para o regime aberto, trabalho externo ou alvará de soltura nos casos de prisão provisória, o que representa quase 18% de todos os casos analisados. De acordo com o padre Valdir João Silveira, coordenador da Pastoral Carcerária Nacional, muitos destes homens e mulheres são esquecidos pela Justiça, pela sociedade e pela família depois que entram no sistema carcerário.
Ele disse que os mutirões são feitos por amostragem, o que significa que outros presos podem continuar atrás das grades quando poderiam estar na rua. De acordo com o padre, atualmente 40% da massa carcerária é composta por presos provisórios. Ele citou como exemplo a visita a uma unidade em Imperatriz (MA), em que 54 homens haviam sido esquecidos sem julgamento. Ao ser apresentado à situação, o juiz da comarca determinou a soltura após constatar que, caso tivessem sido julgados, eles já estariam em liberdade há anos.
Na visão do juiz Douglas Martins, Coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do CNJ, os mutirões evitam um colapso total do sistema, pois minimizam o crescimento da população carcerária. O CNJ, segundo ele, também conseguiu chamar a atenção para o encarceramento em massa que, apontou, envolve principalmente pessoas de classe baixa envolvidas em crimes contra o patrimônio e tráfico de drogas. Douglas informou que a tendência é oposta ao que é registrado nos países desenvolvidos, em que é dada maior atenção aos presos envolvidos em crimes contra a vida que, no Brasil, respondem por apenas 10% da população carcerária.
A política de mutirões teve início quando presidia o CNJ o ministro Gilmar Mendes. Entre agosto de 2008 e abril de 2010, ele comandou mutirões em 20 estados, sendo que foram analisados mais de 108 mil processos, com quase 34 mil sendo beneficiados com a liberdade, progressão de regime, extinção de pena, alvará de soltura ou liberdade condicional. A iniciativa foi premiada em 2009 pelo Instituto Innovare por garantir justiça de forma eficaz e com rapidez.
Para o promotor André Luís Alves de Melo, que atua em Minas Gerais, a situação poderia ser ainda melhor caso a execução penal fosse informatizada, como previsto em lei desde 2013. De acordo com ele, “nem precisaríamos de mutirão, pois os seus familiares emitiriam o atestado de pena na internet e constatariam a pena cumprida”. Ele afirma que é necessário discutir a obrigatoriedade da Ação Penal nos casos de delitos de bagatela e a possibilidade de o Ministério Público evitar a prisão por meio da proposta de penas alternativas já no início do processo.
O promotor chama a atenção para o fato de a quantidade de presos no país ter subido de 300 mil para 500 mil entre 2002 e 2012, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional, e afirma que a situação poderia ser diferente com a criação do artigo 24-A para o Código de Processo Penal. André Luís Melo sugere o seguinte texto:
Art. 24-A . O Ministério Público, fundamentadamente, poderá promover o arquivamento ou propor, na cota da denúncia, a aplicação de penas alternativas nos casos de delitos cometidos sem violência física com pena máxima prevista de até quatro anos, quando no primeiro caso verificar falta de justa causa ou desnecessidade para a Ação Penal; e no segundo caso quando vislumbrar justa causa para a Ação Penal, mas possibilidade de uma pena não privativa de liberdade, podendo colocar o preso em liberdade provisória nestes casos.
Parágrafo único: Nos crimes de furtos de objetos com valor de mercado inferior a um salário mínimo a vítima deverá apresentar representação formalizada em declaração específica e que poderá ser retratada antes do recebimento da denúncia, após a defesa preliminar. Podendo também o MP intimar a vítima para confirmar a representação antes de oferecer a denúncia.
* Atualizado às 14h00 de 22/2/2014 para acréscimo de informação.
Revista Consultor Jurídico, 22 de fevereiro de 2014
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