A decisão judicial que nega pedido do réu para que seja feita prova documental sobre alegação em que a condenação se baseou constitui cerceamento do direito de defesa. O entendimento é do ministro Sebastião Reis Júnior, da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao declarar nulo um processo penal. Com a decisão, deverá ser reaberta a fase instrutória, com a produção da prova requerida pela defesa.
“Extrair a prova da materialidade do delito por meio de depoimento de testemunha da acusação e negar, por considerar irrelevante, a prova documental requerida pela defesa, cujo objetivo consistia justamente em contrapor tal depoimento, configura mais do que a mera apreciação livre da prova, ocorrendo, em verdade, cerceamento do direito de defesa”, afirmou o ministro.
O caso trata do processo de um acusado pela prática de receptação qualificada (artigo 180, parágrafo 1º do Código Penal). Ele foi preso em flagrante em 2006 na posse de 40 secadores de cabelo. Segundo a acusação, ele não conseguiu provar a origem da mercadoria, que seria a mesma que havia sido furtada de uma empresa.
De acordo com a a sentença, o representante comercial da empresa afirmou que detinha a exclusividade de comercialização da marca dos secadores. Assim, com base nesse depoimento, o juízo de primeiro grau concluiu que os secadores apreendidos com o réu são os mesmos que foram furtados.
Defendido pelo advogado Filipe Fialdini, do Fialdini, Guillon Advogados, o réu apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Entre outras alegações, afirmou que houve cerceamento de defesa, por entender que a comprovação da exclusividade de comercialização dependeria de prova requerida pelos advogados, e pediu a nulidade do processo.
Ao decidir o caso, o TJ-SP entendeu que a prova era irrelevante. Para os desembargadores, o importante seria a chegada dos secadores ao apelante. Afirmaram ainda que o furto da mercadoria ficou comprovado, conforme o Boletim de Ocorrência e que o depoimento do representante da empresa atestaria a exclusividade de comercialização dos produtos.
O entendimento da corte, porém, foi criticado pelo ministro Reis Júnior. “Ora, o tribunal local afastou a nulidade arguida pela defesa, por entender que a prova da exclusividade de representação comercial não influiria na solução dada ao caso; contudo, extraiu a comprovação da origem ilícita dos bens apreendidos justamente a partir de tal exclusividade, que se entendeu comprovada por meio do depoimento do representante da empresa. Entendo, assim, que realmente houve cerceamento do direito de defesa”, afirmou o ministro.
Em sua decisão, ele fez questão de afirmar que não discutia se estaria ou não provada a exclusividade da representação comercial, mas a inadequação do procedimento adotado pelo TJ-SP. Assim, ele conheceu parcialmente do Recurso Especial, deu provimento para anular o processo e determinou a reabertura da fase de instrução e a produção da prova pedida pela defesa.
Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 27 de fevereiro de 2014
Nenhum comentário:
Postar um comentário