Para a aplicação do princípio da insignificância, é preciso considerar não apenas o valor econômico da coisa subtraída, mas o contexto em que se deu a subtração e a situação econômico-financeira da vítima. Ademais, nos crimes praticados de forma qualificada, não se consagra o princípio da insignificância. Com esse entendimento já pacificado em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso não aceitou a aplicação do princípio da insignificância para crime de furto de quarenta peixes ocorrido em 2006 em Cuiabá (Apelação n°109287/2008).
No entendimento do relator, desembargador Paulo da Cunha, a existência da qualificadora não permite a aplicação do privilégio previsto no parágrafo 2°, do art. 155, do Código Penal (se o criminoso é primário e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa). “Absolver os réus somente porque o objeto furtado tem valor supostamente reduzido é o mesmo que incentivá-los (e a outras pessoas também) a praticar outros delitos da mesma natureza, o que é inaceitável”, afirmou o magistrado.
Consta dos autos que em 10 de março de 2006, os denunciados, juntamente com um menor, furtaram do freezer do quintal da residência da vítima, situada na avenida Filinto Muller, em Cuiabá, cerca de quarenta peixes, que seriam comercializados. Os denunciados e o menor estavam fugindo quando foram surpreendidos pela vítima. Os dois adultos foram presos em flagrante e o menor foi apreendido por uma guarnição da Polícia Militar. Parte do furto foi recuperada.
O primeiro acusado foi condenado à pena de um ano, um mês e dez dias de reclusão e 20 dias-multa, no regime inicial aberto. O outro a dez meses e 20 dias de reclusão e 13 dias-multa, sendo substituída a pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 44, § 2º, primeira parte, do Código Penal, por uma pena restritiva de direito, correspondente à prestação de serviço à comunidade. Irresignada com a decisão, a defesa dos acusados aduziu que no caso deveria ser aplicado o princípio da insignificância.
Contudo, para o relator, o recurso não merece ser provido. “Na verdade, o reconhecimento do princípio da insignificância pode ser utilizado quando o objeto furtado é de ínfimo valor, tal qual, uma folha de papel, um alfinete, um lápis, uma bala etc. Ademais, não se pode considerar a conduta delituosa dos agentes, que adentraram no quintal da residência da vítima, de onde subtraíram do interior de um freezer, para proveito de todos, cerca de 40 peixes, os quais seriam comercializados pela vítima”.
Conforme o magistrado, deve-se também levar em consideração a condição econômica do sujeito passivo, as circunstâncias e o resultado do crime para determinar se houve ou não lesão ao bem jurídico tutelado.
O voto do relator foi seguido na unanimidade pelos desembargadores Gérson Ferreira Paes (revisor) e Manoel Ornellas de Almeida (vogal).
Fonte: TJ/MT
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