sábado, 24 de janeiro de 2009

USP enfatiza a teoria; prática fica para o mercado

“O aluno do Largo São Francisco é preparado para pensar. Essa é a função da Universidade. A prática ele adquire bem justamente porque sabe pensar os problemas. Grande parte dos alunos não se apercebe dessa preparação até se ver imerso no mercado de trabalho.” Isso é o que explica o diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, João Grandino Rodas. Neste sábado (24/1), a Consultor Jurídico publica reportagem sobre a Faculdade de Direito as USP como parte da série Escolas de Direito.

Afiado na teoria. É assim que o estudante de Direito na USP acredita que tem de ser. O aluno Marcelo Chilvarquer concorda com essa ideia “A USP preza a teoria, ensina tudo que está por trás de uma peça. Ensina a ser um bom jurista”. Chilvarquer acredita que a prática, “nos dois primeiros meses de estágio se aprende”. Ele aponta que na grade curricular há espaço voltado para ensino e manuseio de peças, recursos e etc.

A caminho do segundo ano letivo, ele diz que a instituição tem atendido suas expectativas, mas acha que falta rigor no ensino. “A faculdade não exige muito do aluno. A matéria é dada na sala de aula é básica. Quem realmente tem interesse tem que buscar mais informações na biblioteca, correr atrás. Mas acredito que seja assim em todas as faculdades”.

Ele narra que o controle de frequência é feito por uma lista de chamadas, o que dá maior liberdade para o aluno frequentar a aula ou não. Por semestre, é aplicada no mínimo uma prova, onde o professor cobra as matérias dadas nas aulas. As demais atividades ficam a critério de cada docente. Grandino explica que seminários e outros trabalhos têm a finalidade de testar a habilidade de argumentação e o poder de síntese do aluno.

Depois de concorrer a uma vaga com 18 pessoas, os alunos que entram na universidade precisam se adequar ao “mundo do ensino superior”. Todos os anos a USP recebe 460 alunos. O diretor da faculdade aponta que a maior dificuldade dos calouros é adaptação à realidade da doutrina universitária. “O autodidatismo não faz parte da realidade do ensino médio e o aluno muitas vezes chega com a falsa ideia de que o curso é uma continuação da realidade anterior, mas com conteúdo específico. O volume de leitura que é esperada dele é alto e dificultado pela utilização de vocábulos técnicos, próprios do universo jurídico.”

Depois dos cinco anos de curso, Grandino aponta que o aluno é colocado a segunda prova, a ferro e fogo, que é o Exame de Ordem. “Os alunos da USP normalmente se saem muito bem. Mas é claro que aqueles que não se dedicaram com afinco aos anos de Faculdade acabam recorrendo a cursinhos preparatórios, o que deveria significar vergonha pessoal, pois a esmagadora maioria não precisa disso.”

Corpo docente

A faculdade de Direito da USP tem 163 professores, dos quais 85% dão aulas em regime de 24 horas semanais, que compreende preparação e aulas dadas. Outros 18 professores (11%) trabalham em regime exclusivo de dedicação à instituição. As escolhas são feitas por concurso público, aberto conforme as vagas. Apesar de pertencer à universidade, as contratações são feitas de forma independente, a critério de cada faculdade.

Entre os professores, estão os especialistas em Direito Penal Miguel Reale Júnior e Vicente Greco Filho, o desembargador do Tribunal Regional Federal da 3ª Região Newton de Lucca, a professora de Direito Administrativo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, entre outros.

Também integram o corpo docente, mas estão licenciados, o ministro do STF Ricardo Lewandowski e a ministra do STJ Maria Thereza. Como o cargo é público, aos 70 anos o professor deve se aposentar. “É uma pena, pois estão no auge da maturidade científica e são bastante produtivos, em regra. A maioria continua como Colaborador Sênior da USP”, conta Grandino.

Mudanças

Há dois anos a faculdade fez algumas mudanças na grade. Faz parte da cultura o aluno ter como opção, a partir do segundo ano, entrar no sistema e escolher parte das disciplinas a serem cursadas. A carga horária para quem entrou até 2006 era de 3.225 horas aula obrigatórias, mais cerca de 500 horas aula optativas. Os alunos que iniciaram a partir de 2007 cumprem carga obrigatória de 2.200 horas aula.

“[Essa diminuição] não gerou prejuízo, pois havia disciplinas cuja carga horária estava supervalorizada. Outras tinham nítido caráter complementar, mas eram exigidas como obrigatórias dos alunos, por exemplo, uma disciplina sobre organizações internacionais, que normalmente só interessa a número diminuto de alunos era exigida de todos”, defende o diretor.

A especialização poderá ocorrer em qualquer área. “Por outro lado, se o aluno preferir o viés do aprofundamento, poderá escolher disciplinas de formação complementar de quaisquer das áreas, sem qualquer vinculação, optando por aqueles que lhe pareçam as mais adequadas para o seu crescimento como estudante do direito. Por semestre o aluno também pode escolher disciplinas em outras faculdades da USP”.

O aluno do segundo ano Marcelo Chilvarquer diz que desde o primeiro ano teve matérias dogmáticas, como Direito Penal, antes era dado primeiro o ensino básico e depois entravam essas disciplinas mais específicas.

Discentes

É no prédio cedido pelo Convento São Francisco que desde 1828, ano que ingressou a primeira turma, a Faculdade de Direito da USP funciona. Criada por Dom Pedro I, a USP e a Faculdade de Direito de Olinda, hoje Universidade Federal de Pernambuco, foram as primeiras instituições de Direito do país.

Já passaram por suas dependências nomes como Monteiro Lobato, Alvares de Azevedo, Lygia Fagundes Telles, Ulysses Guimarães, Rui Barbosa, João Mendes Júnior.

De acordo com levantamentos feitos pela ConJur, 40% dos desembargadores e juízes de segundo grau do Tribunal de Justiça de São Paulo são formados pela USP; no Supremo Tribunal Federal, o ministro Celso de Mello é formado na USP, no Superior Tribunal de Justiça três ministros : Sidnei Beneti, Maria Thereza de Assis Moura e e Massami Uyeda; no Tribunal Superior do Trabalho, apenas Ives Gandra Filho. Por fim, no Superior Tribunal Militar, o ministro Flávio Bierrenbach.

Atualmente a faculdade de Direito da USP tem 2.300 alunos. Antes da nova grade, cada turma ingressava com 115 alunos. Hoje o limite é 50 por sala. Para comportar os alunos na infra-estrutura, a USP está fazendo algumas reformas, com autorização, pois o prédio é tombado. A Associação dos Antigos Alunos reúne uma série de estudantes para contribuir financeiramente com as obras.

Pontos negativos e positivos

“Por ser antiga e tradicional, a Faculdade de Direito da USP possui boa infra-estrutura; a melhor biblioteca jurídica do país; corpo docente permanente, cobrindo praticamente todas as áreas jurídicas; ampla possibilidade de pesquisa, prática e de estágios. Tudo isso, além de marca de valor incalculável: Faculdade de Direito do Largo de São Francisco!”, aponta Grandino.

Porém ele considera que “um ponto a ser melhorado, e muito, é a busca por avaliação do conhecimento dos alunos mais severa. É uma falácia, nos tempos hodiernos de profunda concorrência, acreditar que a escola não necessita rigidez na sua avaliação, pois quem reprova e a vida” como pensavam muitos dos antigos professores. “ Para isso, segundo ele, é preciso uma avaliação tecnicamente bem feita e com o “prévio conhecimento dos alunos é uma ferramenta pedagógica indispensável, para aumentar a motivação dos alunos para o estudo e por conseqüência incrementar o nível do aprendizado”.

Revista Consultor Jurídico, 24 de janeiro de 2009

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