quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Artigo: A nova lei do interrogatório por videoconferência (Parte I)

É por todos sabido que na sessão realizada no dia 14 de agosto de 2007, por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal considerou que interrogatório realizado por meio de videoconferência violava os princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa.

A decisão foi tomada no julgamento do Habeas Corpus n.º 88914. Os Ministros anularam, a partir do interrogatório, um processo-crime aberto na 30.ª Vara Criminal do Foro Central de São Paulo ao julgarem ilegal o ato, realizado por meio de videoconferência. O Ministro Cezar Peluso relatou o caso e afirmou que "a adoção da videoconferência leva à perda de substância do próprio fundamento do processo penal" e tornava a atividade judiciária "mecânica e insensível".

Segundo ele, o interrogatório é o momento em que o acusado exerce seu direito de autodefesa. Ele esclareceu que países como Itália, França e Espanha utilizam a videoconferência, mas com previsão legal e só em circunstâncias limitadas e por meio de decisão devidamente fundamentada. Ao contrário, no Brasil ainda não há lei que regulamente o interrogatório por videoconferência.

"E, suposto a houvesse, a decisão de fazê-lo não poderia deixar de ser suficientemente motivada, com demonstração plena da sua excepcional necessidade no caso concreto", afirmou o Ministro Peluso. Segundo ele, no caso concreto, o acusado sequer foi citado com antecedência para o interrogatório, apenas instado a comparecer, e o juiz em nenhum momento fundamentou o motivo de o interrogatório ser realizado por meio de videoconferência.

Os argumentos em favor da videoconferência, que trariam maior celeridade, redução de custos e segurança aos procedimentos judiciais, foram descartados pelo Ministro. "Não posso deixar de advertir que, quando a política criminal é promovida à custa de redução das garantias individuais, se condena ao fracasso mais retumbante."

O Presidente da Turma, Ministro Celso de Mello, afirmou que a decisão "representa um marco importante na reafirmação de direitos básicos que assistem a qualquer acusado em juízo penal". Para ele, o direito de presença real do acusado durante o interrogatório e em outros atos da instrução processual tem de ser preservado pelo Poder Judiciário.

O Ministro Eros Grau também acompanhou o voto de Cezar Peluso. O Ministro Gilmar Mendes não chegou a acolher os argumentos de violação constitucional apresentados pelo Ministro Peluso. Ele disse que só o fato de não haver lei que autorize a realização de videoconferência, por si só, já revelava a ilegalidade do procedimento. "No momento, basta-me esse fundamento claro e inequívoco." (Fonte: STF, com grifo nosso).

Os efeitos desta decisão passaram, então, a ser sentidos nas instâncias inferiores. Assim, por exemplo, no dia 17 de agosto de 2007, a 3.ª Vara Criminal de São Paulo cancelou seis tele-audiências de supostos envolvidos com a organização criminosa do Primeiro Comando da Capital (PCC). No início da audiência, a Juíza de Direito pediu que os advogados das partes se manifestassem sobre a conveniência do depoimento por vídeo. Os advogados de seis réus sustentaram que o direito de defesa de seus clientes estaria prejudicado, já que não poderiam orientá-los de forma precisa.

A Juíza acolheu o argumento e mandou expedir carta precatória para ouvir os acusados. Na oportunidade, Dr. Luiz Flávio Borges D'Urso, Presidente da OAB paulista afirmou que "a videoconferência, apresentada sob o manto da modernidade e da economia, revela-se perversa e desumana, pois afasta o acusado da única oportunidade que tem para falar ao seu julgador. Pode ser um enorme sucesso tecnológico, mas configura-se um flagrante desastre humanitário"(2).

Pois bem.

Sempre posicionamo-nos contrariamente ao interrogatório on-line, à distância ou por videoconferência. Desde a primeira edição do nosso "Direito Processual Penal", em 2003(3), escrevemos contrariamente a esta prática que então se iniciava no País.

Participamos de vários debates, opondo-nos insistentemente àqueles que apregoavam as vantagens da iniciativa. As razões eram várias, especialmente a falta de previsão legal. Além desta, no entanto, é preciso atentar que o interrogatório é o meio pelo qual o acusado pode dar ao Juiz criminal a sua versão a respeito dos fatos que lhe foram imputados pelo acusador. Por outro lado, é a oportunidade que possui o Magistrado de conhecer pessoalmente aquele que será julgado pela Justiça criminal; representa, ainda, uma das facetas da ampla defesa (a autodefesa) que se completará com a defesa técnica a ser produzida pelo advogado do acusado (art. 261, parágrafo único do Código de Processo Penal).

Como afirma Tourinho Filho, é "pelo interrogatório que o Juiz mantém contato com a pessoa contra quem se pede a aplicação da norma sancionadora. E tal contato é necessário porque propicia ao julgador o conhecimento da personalidade do acusado e lhe permite, também, ouvindo-o, cientificar-se dos motivos e circunstâncias do crime, elementos valiosos para a dosagem da pena".

É, destarte, a oportunidade "para que o Juiz conheça sua personalidade, saiba em que circunstâncias ocorreu a infração porque ninguém melhor que o acusado para sabê-lo e quais os seus motivos determinantes". Por isso é fundamental este "contato entre julgador e imputado, quando aquele ouvirá, de viva voz, a resposta do réu à acusação que se lhe faz"(4). (grifo nosso).

Ainda a respeito, Hélio Tornaghi se manifesta no mesmo sentido: "o interrogatório é a grande oportunidade que tem o juiz para, num contato direto com o acusado, formar juízo a respeito de sua personalidade, da sinceridade de suas desculpas ou de sua confissão, do estado d'alma em que se encontra, da malícia ou da negligência com que agiu, da sua frieza e perversidade ou de sua elevação e nobreza; é o ensejo para estudar-lhe as reações, para ver, numa primeira observação, se ele entende o caráter criminoso do fato e para verificar tudo mais que lhe está ligado ao psiquismo e à formação moral"(5). (também grifamos).

Sabemos, outrossim, poder o Juiz sentenciante, caso não tenha sido quem presidiu o interrogatório do imputado, proceder à nova inquirição do acusado, nos termos do art. 196 do CPP, ainda que o processo esteja em grau de recurso (art. 616, CPP). Note-se, porém, com Dotti que "são raríssimas as hipóteses em que o julgador se utiliza destas cautelares regras que prevêem o reinterrogatório, no interesse da apuração do fato e em obséquio à garantia da ampla defesa."(6)

O mesmo Professor Dotti afirmou que a "tecnologia não poderá substituir o cérebro pelo computador e muito menos o pensamento pela digitação. É necessário usar a reflexão como contraponto da massificação. É preciso ler nos lábios as palavras que estão sendo ditas; ver a alma do acusado através de seus olhos; descobrir a face humana que se escondera por trás da máscara do delinqüente. É preciso, enfim, a aproximação física entre o Senhor da Justiça e o homem do crime, num gesto de alegoria que imita o toque dos dedos, o afresco pintado pelo gênio de Michelangelo na Capela Sistina e representativo da criação de Adão"(7).

Já em outubro do ano de 2002, o Conselho Pleno da OAB/SP, por unanimidade, votou contra o interrogatório virtual. Nesta decisão, seguiu-se o parecer do advogado Tales Castelo Branco, publicado no Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, n.º 124 (março/2003). Da mesma forma, posicionou-se o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em sessão realizada no dia 30 de setembro de 2002.

No Brasil, ao que parece, o Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba foi o primeiro a adotar, oficialmente, o sistema de videoconferência, fato ocorrido no dia 1.º de outubro de 2002(8).

Ora, não podemos esquecer jamais o caráter de meio defensivo que possui o interrogatório, nada obstante entendermos, com Tornaghi, que se trata também, a depender do depoimento prestado, de uma fonte de prova e de um meio de prova. Mas, sendo também, e principalmente, um meio de defesa, todas as precauções devem ser observadas quando de sua realização o que, definitivamente e por mais cuidado que se tome, não ocorre no sistema de videoconferência.

Não olvidemos, tampouco, que a ampla defesa, prevista expressamente no art. 5.º, LV da Constituição Federal, engloba não somente a defesa técnica, a cargo de um profissional do Direito devidamente habilitado (art. 261, parágrafo único, CPP), como também a denominada autodefesa ou defesa pessoal, esta exercida pelo próprio acusado quando, por exemplo, depõe pessoal e livremente no interrogatório. O defensor exerce a chamada defesa técnica, específica, profissional ou processual, que exige a capacidade postulatória e o conhecimento técnico. O acusado, por sua vez, exercita ao longo do processo (quando, por exemplo, é interrogado) a denominada autodefesa ou defesa material ou genérica. Ambas, juntas, compõem a ampla defesa.

A propósito, veja-se a definição de Miguel Fenech:

"Se entiende por defensa genérica aquella que lleva a cabo la propia parte por sí mediante actos constituídos por acciones u omisiones, encaminados a hacer prosperar o a impedir que prospere la actuación de la pretensión. No se halla regulada por el derecho con normas cogentes, sino con la concesión de determinados derechos inspirados en el conocimientode la naturaleza humana, mediante la prohibición del empleo de medios coactivos, tales como el juramento cuando se trata de la parte acusada y cualquier otro género de coacciones destinadas a obtener por fuerza y contra la voluntad del sujeto una declaración de conocimiento que ha de repercutir en contra suya". Para ele, diferencia-se esta autodefesa da defesa técnica, por ele chamada de específica, processual ou profissional, "que se lleva a cabo no ya por la parte misma, sino por personas peritas que tienen como profesión el ejercicio de esta función técnico-jurídica de defensa de las partes que actuán en el processo penal para poner de relieve sus derechos y contribuir con su conocimiento a la orientación y dirección en orden a la consecusión de los fines que cada parte persigue en el proceso y, en definitiva, facilitar los fines del mismo"(9).

Segundo Étienne Vergès, "le défenseur (le plus souvent un avocat), occupe une place primordiale dans l'exercice des droits de la défense, Ainsi, l'article 6 § 3-c Conv. EDH permet à l'accusé (au sens large) de se defender lui-même ou d'avoir l'assistance d´un défenseur de son choix."(10)

Veja-se a respeito a lição de Germano Marques da Silva:

"A lei, com efeito, reserva ao arguido, para por ele serem exercidos pessoalmente, certos actos de defesa. É o que acontece, nomeadamente, com o seu interrogatório, quando detido, quer se trate do primeiro interrogatório judicial, quer de interrogado por parte do MP, do direito de ser interrogado na fase da instrução, das declarações sobre os factos da acusação no decurso da audiência e depois de findas as alegações e antes de encerrada a audiência"(11). (Grifo nosso).

Ressalte-se, ainda, que a Lei n.º 9.099/95 que criou os Juizados Especiais Criminais, no art. 81, disciplinou que o interrogatório deverá ser realizado após a ouvida da vítima e das testemunhas, afastando-o do início do procedimento e levando-o para o seu final, ou seja, após a colheita de todas as provas, o que veio a reforçar, a nosso ver, o seu caráter de meio de defesa(12).

Também a recente reforma do Código de Processo Penal (arts. 400, 411, 474 e 531).

Ferrajoli entende que o interrogatório é o melhor paradigma de distinção entre o sistema inquisitivo e o acusatório, pois naquele o interrogatório representava "el comienzo de la guerra forense", "el primer ataque del fiscal contra el reo para obtener de él, por cualquier medio, la confesión". Contrariamente, continua o filósofo italiano, no processo acusatório/garantista "informado por la presunción de inocencia, el interrogatorio es el principal medio de defensa y tiene la única función de dar materialmente vida al juicio contradictorio y permitir al imputado refutar la acusación o aducir argumentos para justificarse"(13).

Hoje, no entanto, já temos a previsão legal para a realização do interrogatório por videoconferência; trata-se da Lei n.º 11.900/09, que modificou o art. 185 do Código de Processo Penal. O caput não sofreu nenhuma mudança, mas o seu § 1.º uma pequena modificação, passando a estabelecer que "o interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares bem como a presença do defensor e a publicidade do ato." Observa-se, portanto, que tal disposição permite (e mesmo impõe, se atendidas aquelas condições) o deslocamento do Juiz de Direito, do Promotor de Justiça, dos Advogados e dos serventuários da Justiça até o local onde se encontre preso o interrogando, a fim que ali se proceda ao respectivo ato processual. Temos sérias dúvidas se a publicidade do ato processual será atendida em um interrogatório realizado no interior de um estabelecimento prisional. A propósito, atentemos para a seguinte lição doutrinária:

"Nesse plano de análise, um primeiro aspecto a merecer destaque diz respeito à nova regra, prevista no art. 185, § 1.º, do Código de Processo Penal, que impõe a realização do interrogatório do acusado preso no próprio estabelecimento penitenciário. Tal inovação, contudo, se aplicada de forma geral e sem motivação quanto à sua necessidade, tornará vulnerável a garantia da publicidade dos atos processuais, em sua perspectiva de acompanhamento irrestrito, por qualquer do povo, do exercício da atividade jurisdicional. A restrição de maneira geral e indiscriminada da publicidade de ato que, em sua essência, deve ser aberto a acompanhamento pelo povo, além de suprimir do exame judicial a averiguação de sua pertinência no caso concreto, torna inviável o controle difuso do exercício da atividade jurisdicional. Os atos assim praticados, sem justificativa da necessidade de restrição no caso específico, serão, obviamente, nulos. Outra importante novidade é o reconhecimento do direito de comunicação, prévia e reservada, entre acusado e defensor (art. 185, § 2.º). Cuida-se de dever imposto ao Estado-juiz para a hipótese de acusado preso, mas que, por certo, haverá de ser estendido àquele que responde ao processo solto, sempre que a comunicação anterior não tiver sido possível. Assim, impõe-se a nomeação de defensor, antes do ato do interrogatório, ao acusado que, em liberdade, comparecer sem defensor constituído, assegurando-se a prévia comunicação entre ambos pelo tempo necessário à preparação da defesa, mesmo que tal prática possa redundar na necessidade de redesignação do ato. Trata-se, aqui, do cumprimento da garantia constitucional da mais ampla defesa. Lembrando-se de que o pragmatismo e a economia processual não podem sobrepor-se à defesa real e efetiva."(14) (grifo nosso).

Assim, para a validade jurídica deste interrogatório no local da prisão, será de rigor a observância de todas estas exigências, inclusive e principalmente quanto à publicidade do ato processual, devendo as portas do sistema penitenciário estar abertas para que qualquer pessoa possa assistir aos interrogatórios, sob pena de mácula à norma constitucional referente à publicidade dos atos processuais(15).

Notas:

(1) Paul Valéry (apud Modernidade Líquida, de Zygmunt Bauman, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000, p. 7).
(2) Fonte: Revista Consultor Jurídico, 18 de agosto de 2007.
(3) Hoje "Curso Temático de Direito Processual Penal", Salvador: Editora JusPodivm, 2009.
(4) Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, 20.ª ed., São Paulo: Saraiva, vol. 3, 1998, p. 266.
(5) Hélio Tornaghi, Compêndio de Processo Penal, Rio de Janeiro: José Konfino, tomo III, 1967, p. 812.
(6) René Ariel Dotti, "O interrogatório à distância", Brasília: Revista Consulex, n.º 29, p. 23.
(7) Idem.
(8) Sobre ao assunto, leia-se também: "Interrogatório à Distância", do Professor Sérgio Marcos de Moraes Pitombo, publicado no Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, n.º 93 (agosto/2000) e "O Interrogatório no Direito Brasileiro", de Carlos Henrique Borlido Haddad, Belo Horizonte: Del Rey, 2000 pp. 107 e segs. Há, outrossim, outros textos sobre o assunto, a saber: "O Teleinterrogatório no Brasil", de Vladimir Barros Aras, Revista Jurídica Consulex, Brasília, Ano VII, n.º 153, maio/2003; "O Interrogatório ‘On Line' - Uma Desagradável Justiça Virtual", de Luiz Flávio Borges D´Urso, Revista Justilex, Brasília; "A Falácia dos Interrogatórios Virtuais", Paulo Sérgio Leite Fernandes, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, n.º 120 (novembro/2002) e a "Videoconferência na Crise do Constitucionalismo Democrático", Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº. 129 (agosto/2003).
(9) Miguel Fenech, Derecho Procesal Penal, Vol. I, 2.ª ed., Barcelona: Editorial Labor, S. A., 1952, p. 457.
(10) Procédure Pénale, Paris: LexisNexis Litec, 2005, p. 42.
(11) Curso de Processo Penal, 3.ª ed., Lisboa: Verbo, vol. I, p. 288.
(12) Neste sentido, Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes e Luiz Flávio Gomes, Juizados Especiais Criminais, 3.ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 176.
(13) Luigi Ferrajoli, Derecho y Razón, 3.ª ed., Madrid: Trotta, 1998, p. 607.
(14) Artigo do Boletim IBCCRIM n.º 135 Fevereiro/2004: "Publicidade, ampla defesa e contraditórionovo interrogatório judicial", escrito por Cleunice Valentim Bastos Pitombo, Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró, Marcos Alexandre Coelho Zilli e Maria Thereza Rocha de Assis Moura.

(15) Na edição do dia 24 de junho de 2007, foi publicada a seguinte matéria no jornal O Estado do Paraná: "Maior agilidade, segurança, economia de tempo e dinheiro, são consideradas as principais vantagens das audiências dos Juizados Especiais Criminais realizadas dentro das penitenciárias. A iniciativa, que abrange crimes leves cometidos durante o cumprimento da pena, é inédita no país, e começou na tarde da última quinta-feira (21), na Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara, Região Metropolitana de Curitiba.

O trabalho consiste na realização de audiências, com a presença de juiz de Direito, promotor de Justiça, advogado e testemunhas, dentro da própria unidade penal, evitando o deslocamento do preso. "Os detentos que cumprem pena nas penitenciárias de Piraquara, estão subordinados à jurisdição daquela comarca, implicando remoção e infra-estrutura de segurança para levá-los a audiência no fórum.

Compete à Secretaria da Justiça e da Cidadania, por meio do Departamento Penitenciário, a condução do preso da sua unidade até a PCE, assim como seu retorno, de forma rápida e com mais segurança", explicou o secretário da Justiça e da Cidadania, desembargador Jair Ramos Braga .Para o juiz de Piraquara, Ruy Alves Henrique Filho, a iniciativa, que está em fase experimental, representa "economia de tempo e dinheiro para o Estado". Ele ressaltou que as audiências são relativas a casos de porte ou uso de drogas, ameaças e lesões leves, cometidos pelo prisioneiro, enquanto cumpre a pena.

"A finalidade é diminuir o número de escoltas de presos para o Fórum de Piraquara, deslocando juiz e promotor até a unidade penal, para possibilitar o rápido atendimento do processo, e ainda, liberar o maior número de viaturas policiais para o serviço cotidiano", concluiu.Nesta etapa, foram realizadas duas audiências.

A primeira tratou de um caso de ameaça, entretanto o processo foi extinto e arquivado, pelo consenso das partes. O preso processado, cumpre pena em regime semi-aberto na Colônia Penal Agrícola e foi acusado de ameaças por um antigo interno da mesma unidade, que hoje goza de liberdade.

A suposta vítima compareceu a audiência e relevou o caso, se pronunciando favorável ao cancelamento do processo. "Em 10 minutos tudo foi resolvido sem burocracia é disso que o Sistema Penitenciário necessita", resumiu o preso acusado. Em seguida, foi realizada audiência de instrução a respeito de um detento acusado de uso de entorpecentes.

Participaram dessas primeiras audiências, o juiz Ruy Alves Henrique Filho, o promotor de Piraquara, André Merheb Calixto, a advogada da PCE, Sueli Cristina Rohn Bespalhok, e a escrivã Adriana Cristina Grossi. Estiveram presente também a Juíza de Direito Luciana Fraiz Abrahão, o promotor de Justiça Alan Rogério Vendrame de Souza, o coordenador do Depen-PR, Honório Bortolini, o diretor da PCE, José Guilherme Assis.

O programa pretende atender todos os presos do Complexo Penitenciário de Piraquara (PCE, Penitenciária Estadual, Penitenciária Feminina, CPA e Centro de Detenção e Ressocialização), em uma sala especialmente adequada às audiências, na PCE, respeitando as normas de segurança dessa circunstância."

Lei 11.900, de 8 de janeiro de 2009

Altera dispositivos do Decreto-Lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para prever a possibilidade de realização de
interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1.º Os arts. 185 e 222 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passam a vigorar com as seguintes alterações:
"Art. 185...........................................
§ 1.º O interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.
§ 2.º Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades:
I - prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II - viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III - impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV - responder à gravíssima questão de ordem pública.
§ 3.º Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de antecedência.
§ 4.º Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531 deste Código.
§ 5.º Em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso.
§ 6.º A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil.
§ 7.º Será requisitada a apresentação do réu preso em juízo nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na forma prevista nos §§ 1.º e 2.º deste artigo.
§ 8.º Aplica-se o disposto nos §§ 2.º, 3.º, 4.º e 5.º deste artigo, no que couber, à realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido.
§ 9.º Na hipótese do § 8.º deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor." (NR)
"Art. 222. .........................................
§ 1.º (VETADO)
§ 2.º (VETADO)
§ 3.º Na hipótese prevista no caput deste artigo, a oitiva de testemunha poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, permitida a presença do defensor e podendo ser realizada, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento." (NR)
Art. 2.º O Decreto-Lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 222-A:
"Art. 222-A. As cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada previamente a sua imprescindibilidade, arcando a parte requerente com os custos de envio.
Parágrafo único. Aplica-se às cartas rogatórias o disposto nos §§ 1.º e 2.º do art. 222 deste Código."
Art. 3.º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 8 de janeiro de 2009; 188.º da Independência e 121.º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
José Antonio Dias Toffoli

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Rômulo de Andrade Moreira é procurador de Justiça na Bahia. Foi assessor especial do procurador-geral de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex-procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador-Unifacs, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). É coordenador do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal da Unifacs. Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador-Unifacs (Curso coordenado pelo Professor J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais e do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais IBCCrim e ao Movimento Ministério Público Democrático. Autor das obras "Direito Processual Penal", "Comentários à Lei Maria da Penha" (em co-autoria) e "Juizados Especiais Criminais" Editora JusPodivm, 2008, além de organizador e coordenador do livro "Leituras Complementares de Direito Processual Penal", Editora JusPodivm, 2008.


O Estado do Paraná, Direito e Justiça, 19/01/2008.

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